União Estável e Regime de Bens: Implicações Sucessórias e Reflexões Contemporâneas

União Estável e Regime de Bens: Implicações Sucessórias e Reflexões Contemporâneas

Artigo jurídico que aborda a evolução da união estável no direito brasileiro, sua relação com os regimes de bens e as consequentes implicações no campo da sucessão patrimonial. A análise inclui considerações sobre a legislação, jurisprudência e perspectivas futuras.

Publicado em: 11/08/2023 Familia

1. Introdução

Em meio às diversas formas de relacionamentos familiares consagradas pelo ordenamento jurídico brasileiro, destaca-se a figura da união estável. Este instrumento legal representa não somente uma alternativa ao casamento tradicional, mas também, em diversas situações, uma resposta do direito às mudanças e necessidades da sociedade contemporânea.

Definição e importância da união estável no ordenamento jurídico brasileiro

A união estável, conforme estipulado pelo Código Civil Brasileiro em seu artigo 1.723, é reconhecida quando um casal mantém uma convivência pública, contínua e duradoura com o objetivo de constituição de família. Assim, não exige formalidades específicas, como a celebração de um casamento civil, mas requer, essencialmente, que as partes envolvidas tenham a intenção de construir uma vida em comum.

Este instituto jurídico adquire significativa relevância, pois, além de refletir uma realidade cada vez mais presente na sociedade brasileira, confere direitos e obrigações análogas aos do casamento. A união estável, portanto, torna-se uma ferramenta para garantir direitos patrimoniais, sucessórios, previdenciários, entre outros, para aqueles que optam por não formalizar a relação por meio do matrimônio.

Breve contextualização histórica da união estável

Historicamente, a união estável foi, por muito tempo, marginalizada no cenário jurídico brasileiro. As relações que não passavam pelo crivo da cerimônia matrimonial eram frequentemente desconsideradas, relegando seus integrantes a uma situação de insegurança jurídica e vulnerabilidade social.

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, contudo, houve uma mudança paradigmática. O artigo 226, §3º da Carta Magna elevou a união estável ao patamar de entidade familiar, equiparando-a, em diversos aspectos, ao casamento. Essa mudança refletiu uma evolução social e reconheceu uma realidade que, até então, estava à margem do direito. Desde então, legislações subsequentes e a jurisprudência passaram a consolidar e a expandir os direitos e deveres decorrentes das uniões estáveis, buscando garantir maior proteção e equidade a seus integrantes.

Em suma, a união estável não é apenas um reflexo da evolução das relações afetivas na sociedade, mas também uma resposta do sistema jurídico às demandas e transformações sociais. A análise de seu regime de bens e suas implicações na sucessão patrimonial é fundamental para compreender a amplitude e profundidade deste instituto no cenário jurídico brasileiro atual.

2. Regime de Bens na União Estável

Ao abordar o tema da união estável, um dos pontos de destaque é, sem dúvida, a questão do regime de bens que rege essa relação. Em um país de tradição civilista como o Brasil, o patrimônio familiar e sua gestão representam uma preocupação central, sendo assim, entender as nuances do regime de bens na união estável é fundamental para qualquer casal e para profissionais do direito.

Conceituação e diferenciação dos regimes de bens existentes

No ordenamento jurídico brasileiro, há quatro regimes de bens principais que podem regular as relações patrimoniais entre os cônjuges ou companheiros: comunhão parcial de bens, comunhão universal de bens, separação total de bens e participação final nos aquestos.

  1. Comunhão parcial de bens: é o regime legalmente adotado quando não há escolha ou pacto prévio entre os cônjuges. Nele, todos os bens adquiridos após o início da relação serão considerados comuns ao casal, salvo exceções como bens adquiridos por doação ou herança.

  2. Comunhão universal de bens: neste regime, todos os bens, adquiridos antes ou durante a união, pertencem igualmente a ambos, exceto os excluídos expressamente por lei, como, por exemplo, os bens de uso pessoal.

  3. Separação total de bens: não há comunicação de patrimônios, ou seja, cada um mantém individualmente os bens que adquire, seja antes ou durante a relação.

  4. Participação final nos aquestos: funciona como a separação de bens no decorrer da união, mas, no seu término, os bens adquiridos serão partilhados, similar à comunhão parcial.

O papel do contrato escrito na determinação do regime de bens

O contrato escrito, ou melhor, o contrato de convivência, tem suma importância na determinação do regime de bens na união estável. Assim como no casamento o pacto antenupcial define questões patrimoniais, na união estável esse papel é desempenhado pelo contrato de convivência. Por meio dele, os companheiros podem estipular o regime que mais lhes convém, afastando-se da regra geral da comunhão parcial.

É relevante observar que, na ausência deste contrato, prevalecerá o entendimento legal, o que pode não refletir a vontade real do casal. Daí a importância de sua elaboração e registro, para conferir maior segurança jurídica aos envolvidos.

A questão da comunhão parcial de bens como regime legalmente presumido na união estável

Conforme o Código Civil, na falta de contrato escrito entre os companheiros, aplica-se, por presunção, o regime da comunhão parcial de bens. Isso significa que todos os bens adquiridos onerosamente durante a convivência serão considerados comuns, salvo os que cada um possuía antes de iniciar a união e os adquiridos por doação, herança ou razões semelhantes.

Esse entendimento, embora proteja a ideia de esforço conjunto e construção patrimonial compartilhada durante a relação, pode, em certos casos, gerar situações indesejadas. Daí, novamente, ressalta-se a importância do contrato de convivência para que os companheiros possam estabelecer o regime de bens que melhor reflita suas intenções e expectativas.

3. Implicações na Sucessão Patrimonial

A questão sucessória, intrinsecamente ligada ao destino dos bens após o falecimento de um indivíduo, é um dos temas mais sensíveis e complexos do direito de família. Em meio a essa complexidade, a união estável insere-se trazendo peculiaridades e desafios específicos, os quais demandam reflexão.

Noções gerais de sucessão e sua aplicabilidade na união estável

A sucessão tem como principal objetivo determinar a destinação do patrimônio de uma pessoa após seu falecimento. No Brasil, o Código Civil determina que essa transmissão pode ocorrer de duas formas: legítima (ou necessária), onde o patrimônio é transmitido para os herdeiros necessários (descendentes, ascendentes e cônjuge ou companheiro), e testamentária, na qual o indivíduo, por meio de testamento, designa quem deverá receber seus bens, respeitando a legítima.

No contexto da união estável, o companheiro, desde o advento do Código Civil de 2002, é considerado herdeiro, concorrendo com outros herdeiros necessários. Contudo, a porção que lhe cabe pode variar conforme a existência e a classe de outros herdeiros.

União estável e casamento: comparativo em relação à sucessão

Embora a Constituição Federal de 1988 tenha elevado a união estável ao patamar de entidade familiar, assim como o casamento, na prática, esses dois institutos possuem diferenças substanciais quanto à sucessão.

No casamento, independentemente do regime de bens adotado, o cônjuge sobrevivente tem direito à meação e, em algumas situações, à herança, concorrendo com descendentes, ascendentes e, na ausência destes, herdando a totalidade da herança.

Já na união estável, a situação é um pouco diferente. O companheiro sobrevivente terá direito à meação dos bens adquiridos onerosamente durante a convivência. Quanto à herança, o direito varia de acordo com a presença de descendentes e/ou ascendentes, podendo, em certos casos, o companheiro ter um direito menor em relação ao cônjuge sobrevivente do casamento.

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