Jurisprudência Selecionada
1 - TJRJ APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS E PORTE DE MUNIÇÃO DE USO RESTRITO. COMPROVAÇÃO DELITIVA. ILICITUDE PROBATÓRIA. INOCORRÊNCIA. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS. AUSÊNCIA DE PROVA DE VÍNCULO DE ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA. DOSIMETRIA. REDUTOR. INAPLICABILIDADE. 1)
Ao depor em juízo, sob o crivo do contraditório, os policiais civis narraram que já conheciam o réu, vulgo ¿Cocão¿, pois ele era o principal alvo de uma investigação deflagrada visando o combate de atividades ilícitas no Morro dos Prazeres, como tráfico de drogas, organização criminosa, roubo e clonagem de veículo, das quais detinha liderança. Segundo o relato, no dia dos fatos, a equipe policial composta por membros do Departamento Geral de Combate ao Crime Organizado e à Lavagem de Dinheiro (DEGCOR) recebeu informações do Setor de Inteligência sobre o local onde o réu estaria escondido, em determinado prédio num conjunto de edifícios de cinco andares no interior da comunidade. Destarte, rumou para o endereço indicado e, enquanto uma parte da equipe cercou perímetro do imóvel, outra adentrou no prédio e passou a bater à porta dos apartamentos. No último andar, os policiais perceberam barulho e movimentação suspeitos num dos apartamentos e viram o réu se evadir pela janela. A equipe que permanecera do lado de fora do edifício, por sua vez, viu o réu alcançar a laje da cobertura do edifício e tentar pular para o prédio vizinho, ficando, porém, perigosamente suspenso no quinto andar, correndo risco de queda. Com isso, os policiais o acudiram. Na mochila que o réu trazia consigo foi encontrado material ilícito ¿ 1,2hg de maconha, subdivididos em três tabletes, cem munições de fuzil calibre 5.56, estojo de munição de fuzil ¿ além de um caderno com anotações e uma balança de precisão. Ao ser abordado, o réu confirmou sua identidade, admitiu fazer parte do tráfico da região, mas negou ser o chefe da comunidade local. Ao ser interrogado em juízo, o réu, a seu passo, optou por exercer o direito ao silêncio. 2) Inexiste qualquer contradição ou vagueza nos testemunhos, de sorte a lhes retirar a credibilidade. Os depoimentos, mostraram-se seguros e congruentes, afinando-se inclusive com as declarações anteriores prestadas em delegacia. Portanto, merecem, à míngua de prova em contrário, total prestígio, a teor da Súmula 70 da Corte. Seria incoerente permitir aos agentes, afetos aos princípios da moralidade e impessoalidade administrativas, atuar em nome do Estado na repressão criminal e, por outro lado, desmerecer suas declarações quando chamados para contribuir com a reconstrução do fato probandum. Ao amparo do princípio da persuasão racional, somente se mostra razoável desacreditar tal prova quando contraditória, inverossímil, dissonante com os demais elementos dos autos ou quando pairarem dúvidas concretas acerca da idoneidade e imparcialidade dos depoentes ¿ o que não se vislumbra no caso em apreço. Os policiais nada teriam a angariar com eventual ludíbrio, escolhendo o réu para falsamente incriminar, atribuindo-lhe a posse do material entorpecente e das munições arrecadados. 3) O relato afasta a alegação da prática denominada de ¿fishing expedition¿, pois os policiais já tinham por missão prévia a captura do réu no âmbito de outra investigação em curso. De todo modo, ainda que assim não fosse, o fato de haver o réu se apressado em arrojada fuga ante a simples batida à porta do apartamento ¿ colocando-se, inclusive, em risco de vida na tentativa de pular do alto de um prédio ¿ já configura fundada suspeita a permitir sua abordagem que, no caso em específico, se confunde até mesmo com o ato de seu salvamento. Outrossim, a dinâmica não traz qualquer equívoco a permitir a inferência de que tivesse ocorrido invasão de domicílio por parte dos policiais, que asseveraram haver capturado o réu, em fuga, do lado de fora da residência, em local de acesso público. No ponto, ao alegar que a namorada ou esposa do réu estava no apartamento e, em tese, seria capaz de infirmar a versão dos policiais, olvida a defesa técnica que ela mesma poderia ter arrolado a moradora como testemunha, operando-se, a rigor, em seu desfavor a perda da chance probatória, acorde regra de repartição do ônus da prova. 4) Nada há nos autos a comprovar o vínculo de estabilidade e permanência ¿ pressuposto que se extrai do próprio núcleo verbal ¿associarem-se¿, contido no tipo penal ¿ necessário à configuração do delito associativo. O conjunto probatório exposto nos autos é sugestivo, mas não demonstra com firmeza que o réu aderira consciente, voluntária e, principalmente, de forma estável à associação criminosa da localidade. Não se descura, decerto, a notícia trazida pelos testemunhos de que o réu, criminoso conhecido, já era investigado por diversos delitos, como associação criminosa, tráfico de drogas, roubo e adulteração de veículos. Porém, é justamente no âmbito desses respectivos inquéritos que cabe a apuração do crime associativo, não bastando a mera notícia nos autos de investigações em curso para amparar a condenação, inclusive sob risco de múltipla persecução penal (bis in idem). No presente feito, assoma-se a carência probatória, que não pode ser suprida com a inferência de impossibilidade de tráfico autônomo em local dominado por facção criminosa, fundada em mero juízo de probabilidade, confissões não confirmadas em juízo ou notícia de investigações não documentadas nos autos. 5) Impossível a absorção do crime autônomo da Lei 10.826/03, art. 16 pela causa de aumento da Lei 11.343/06, art. 40, IV. Não houve apreensão de arma de fogo, mas de munições, dessumindo-se que o réu guardava o material, de modo que não se pode concluir sua utilização como meio de intimidação difusa ou coletiva. 6) O juízo a quo exasperou a pena-base exclusivamente em função da avaliação negativa da personalidade, uma vez que o réu possui onze anotações em sua folha de antecedentes criminais. Nenhuma anotação, contudo, registra trânsito em julgado, ferindo o aumento efetuado o princípio da não culpabilidade cristalizado na Súmula 444/STJ e no Tema 1.077 daquele Sodalício, firmado sob a sistemática dos Recursos Repetitivos. 7) Inviável a aplicação do redutor do Lei 11.343/2006, art. 33, §4º, pois a arrecadação dentro de uma mochila em poder do réu, de mais de um quilo de maconha, uma balança de precisão, um caderno de anotações e expressiva quantidade de munição de arma de fogo de grosso calibre (100 cartuchos de fuzil, de uso restrito), permitem a conclusão de que não se trata de um pequeno traficante, neófito na atividade criminosa, mas de criminoso que já se dedicava à traficância. Provimento parcial do recurso.... ()
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