Jurisprudência Selecionada

Doc. LEGJUR 478.1476.7914.8879

1 - TJRJ RECURSO DE APELAÇÃO. ATRASO INJUSTIFICADO NA ENTREGA DO IMÓVEL. CULPA DO VENDEDOR. CLÁUSULA PENAL FIXADA EXCLUSIVAMENTE EM DESFAVOR DO CONSUMIDOR. INVERSÃO. POSSIBILIDADE. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. QUANTUM MANTIDO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA RECONHECIDA. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA.

Cogente a incidência do CDC, porquanto autor e réu inserem-se respectivamente no conceito de consumidor e de fornecedor, consagrados nos arts. 2º e 3º, caput, do CDC. No caso em apreço, os autores ingressam com ação indenizatória alegando a ocorrência de inadimplemento por parte dos réus, quanto ao prazo de entrega do imóvel adquirido por instrumento de promessa de compra e venda. Segundo os autores, as rés se comprometeram a entregar o imóvel até março de 2013 (data prevista no contrato), o que foi cumprido apenas em 10/07/2024. Relataram, ainda, que mesmo após a entrega do imóvel, as rés não entregaram as áreas comuns do edifício, bem como outros apartamentos, cuja obra perdurou por meses, causando diversos transtornos aos adquirentes que já se encontravam na posse do imóvel. A sentença julgou procedente em parte os pedidos, condenando as rés ao pagamento de multa penal de 0,5% ao mês sobre o valor do imóvel, e indenização por danos morais de R$ 10.000,00. Em seu recurso, a parte ré refuta a existência de inadimplemento contratual de sua parte, alegando que os autores restaram inadimplentes no pagamento das parcelas acordadas sobre o imóvel. Defende a impossibilidade de aplicação da multa penal, e inexistência de danos morais. Pleiteia, ainda, o reconhecimento de sucumbência recíproca. Inicialmente, não há como ser afastada a responsabilidade da ré quanto ao atraso na entrega do imóvel. Consta da avença que o imóvel deveria ter sido entregue em março de 2013, havendo previsão de prazo de tolerância de 90 dias. Ocorre que a entrega só ocorreu em julho de 2017, mais de um ano depois. Eventual inadimplemento por parte dos autos quanto ao pagamento das parcelas não é suficiente para afastar a responsabilidade, visto que, primeiramente, foi a parte ré quem não cumpriu com as obrigações que lhe incumbiam. Os documentos constantes dos autos revelam que os autores estavam adimplentes com os pagamentos até o momento do atraso, e, portanto, eventual atraso no financiamento, em momento posterior ao «habite-se (este já atrasado) não exime a ré de responsabilidade pelos prejuízos enfrentados pelos autores. Ora, incumbia à ré construir, vender e entregar as chaves no prazo avençado no contrato. Aos autores, por sua vez, incumbia o pagamento do preço para a aquisição do imóvel. Com efeito, para pagamento do preço considerável ajustado, é imprescindível o cumprimento da obrigação da parte ré no cumprimento do cronograma de obras da construção. O cumprimento pela ré do cronograma de obras é imprescindível para que se possa exigir dos autores o pagamento da contraprestação. Além disso, consta no contrato (fls. 80/81) que a ré tinha a obrigação de averbar o «habite-se, e, como cediço, a averbação do «habite-se constitui pressuposto para obtenção do financiamento. Considerando que o «habite-se só foi averbado meses após o prazo de entrega, não há que se falar em inadimplemento dos autores. Demonstrado o inadimplemento contratual por parte da ré, deve ela responder pelos prejuízos enfrentados pelos autores. Quanto à possibilidade de fixação de cláusula penal em desfavor da construtora, o STJ, em sede dos recursos repetitivos 1.614.721/DF e 1.631.485/DF, ambos de relatoria do Ministro Luís Felipe Salomão, sedimentou o entendimento segundo o qual «prevendo o contrato a incidência de multa para o caso de inadimplemento por parte do consumidor, a mesma multa deverá ser considerada para o arbitramento da indenização devida pelo fornecedor, caso seja deste a mora ou o inadimplemento absoluto. Com efeito, havendo previsão de cláusula penal apenas para o inadimplemento do adquirente, como no caso questão, é possível aplicar à parte ré, a multa imposta ao consumidor para o caso de atraso do pagamento das parcelas, conforme corretamente fez a sentença. Não há que se falar em redução da multa imposta, visto que deve ser aplicado o mesmo parâmetro previsto no contrato, para o caso de inadimplemento do comprador, não podendo a ré se beneficiar por sua própria torpeza, afirmando, agora, que o valor da multa não tem razoabilidade com a obrigação assumida. Quanto à configuração de danos morais, muito embora existam precedentes dessa Corte de Justiça reconhecendo a existência de dano moral in re ipsa na hipótese de atraso na entrega de imóvel, em recentíssimos julgados o C. STJ, a quem compete conferir última interpretação a nossa legislação infraconstitucional, decidira reiteradamente que a chancela da pretensão compensatória em situações análogas há de ser excepcional. Senão, vejamos. Isso porque, o dano moral no caso de atraso na entrega de unidade imobiliária, não se presume pelo simples descumprimento do prazo contratual, ou seja, não exsurge in re ipsa. A despeito disso, considerando o atraso de mais de um ano na entrega do imóvel, entendo que se mostra configurado o dano moral, sendo patente a ofensa aos direitos da personalidade, não só diante contumaz desídia dos empreendimentos imobiliários, mas principalmente ante a frustrada aquisição do imóvel por tanto tempo. No que tange ao valor a ser arbitrado, deve ser este fixado de acordo com o bom senso e o prudente arbítrio do julgador, sob pena de se tornar injusto e insuportável para o causador do dano. Nesse contexto, considerando a frustração da aquisição do bem, bem como o tempo de atraso na entrega, mostra-se razoável a fixação do quantum reparatório para de R$ 10.000,00, sendo este o valor usualmente adotado em outros julgados. Por fim, urge analisar o pedido de fixação de sucumbência recíproca. De fato, os autores fizeram cinco pedidos, saindo-se vencedores, apenas, quanto a dois deles. Conforme entendimento jurisprudencial firmado pelo E. STJ, «a distribuição dos ônus sucumbenciais está relacionada com a quantidade de pedidos requeridos na demanda e o decaimento proporcional das partes em relação a cada pleito. O acolhimento de apenas um dos pedidos dentre dois realizados implica sucumbência recíproca". (REsp. 1646192, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/03/2017, DJe 24/03/2017). Destarte, e considerando que os pedidos não acolhidos eram de significativa monta, não há como ser fixada apenas a sucumbência da parte ré. Portanto, deve ser reconhecida sucumbência recíproca, na forma do CPC, art. 86, cabendo à parte ré pagar aos autores o total de 10% do valor da condenação, e aos autores, pagar à parte ré o total de 10% do valor da causa atualizado. Provimento parcial do recurso.... ()

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