Jurisprudência Selecionada

Doc. LEGJUR 502.0929.4412.5178

1 - TJRJ APELAÇÃO CRIMINAL. art. 155, §1º E §4º, I E IV, DO CÓDIGO PENAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO QUE ALMEJA PRELIMINARMENTE O RECONHECIMENTO DA NULIDADE DO PROCESSO POR AUSÊNCIA DO LAUDO DE EXAME DA RES FURTIVAE. NO MÉRITO, PLEITEIA A ABSOLVIÇÃO PELO RECONHECIMENTO DA AUSÊNCIA DE TIPICIDADE MATERIAL EM RAZÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. SUBSIDIARIAMENTE, REQUER O RECONHECIMENTO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTA NO ART. 155, § 2º, DO CÓDIGO PENAL (RAUL), E A FIXAÇÃO DO REGIME SEMIABERTO (MATHEUS).

A preliminar será analisada juntamente com o mérito. Extrai-se dos autos que policiais militares em patrulhamento de rotina no dia 11/02/2020, por volta das 03:00h no açougue São João, localizado na Avenida 28 de Março, Campos dos Goytacazes avistaram os apelantes caminhando rápido na mencionada avenida, carregando um saco pesado nas costas, em atitude suspeita, razão pela qual realizaram a abordagem. Em revista pessoal, nada de ilícito foi encontrado com os recorrentes, contudo no saco que portavam encontraram 06 latões de cerveja, 02 sacos de pernil e 06 frangos à passarinho. Ao serem indagados sobre os produtos, os apelantes disseram que subtraíram do açougue São João e, em seguida, levaram os agentes até o local, onde verificaram que havia sinais de arrombamento. Um dos policiais ficou no local realizando o acautelamento até a chegada do proprietário do estabelecimento comercial, que foi orientado a comparecer à delegacia, e, configurado o estado flagrancial, os acusados foram encaminhados à sede policial para adoção das providências cabíveis. Integram o caderno probatório o registro de ocorrência 134-00902/2020 (e-doc. 06), o auto de prisão em flagrante (e-doc. 20), os termos de declaração (e-docs. 08, 10, 11, 13), o auto de apreensão (e-doc. 14), o laudo de exame de local de constatação de crime contra o patrimônio (e-doc. 242), e a prova oral produzida em juízo, sob o crivo do contraditório. Em audiência, os depoimentos das testemunhas foram harmônicos e coesos ao vertido em sede policial. Inteligência da súmula 70 deste E. TJRJ. Ao acusado Raul, por não ter comparecido à audiência, fora-lhe decretada a revelia. Por sua vez, o acusado Matheus em seu interrogatório optou por permanecer em silêncio sobre os fatos. Posto isso, deve ser rechaçada a preliminar de nulidade em razão da ausência do laudo de exame da res furtivae. Isto porque o juízo de censura foi correto diante da prova acima mencionada, tendo sido constada a autoria e materialidade do delito sobretudo pelo auto de apreensão, os termos de declaração e o laudo de exame do local no qual se indicou que houve dano por arrombamento, além dos depoimentos dos policiais em juízo. Frise-se que os acusados confessaram o furto em sede extrajudicial e levaram os agentes até o local, onde verificou-se sinais de arrombamento, e, em delegacia, o responsável pelo estabelecimento reconheceu que as mercadorias furtadas eram da loja. Restou claro que o ocorrido se deu no período noturno, quase na madrugada do dia seguinte, conforme os depoimentos das testemunhas e as palavras da vítima em sede policial. Diante do caderno probatório acima mencionado, estão presentes as qualificadoras do rompimento do obstáculo e do concurso de pessoas, nos termos do art. 155, §4º, I e IV, do CP, em razão do arrombamento da porta do estabelecimento comercial e da ação em comunhão de desígnios pelos dois acusados, o que resta corroborado laudo pericial e pelos depoimentos das testemunhas. A tese de atipicidade da conduta, com base no princípio da insignificância não deve prosperar. O diminuto valor do bem subtraído não é o único ponto que se deve levar em conta para que se afaste a tipicidade material da conduta delituosa, já que não se deve observar apenas a lesão que a conduta causa ao proprietário do bem subtraído, mas sim o dano que tal conduta causa à sociedade como um todo. Assim, o Supremo Tribunal Federal, excepcionalmente reconhece o princípio da insignificância desde que presentes determinados requisitos, como a mínima ofensividade da conduta, nenhuma periculosidade social, da ação, o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada. Nesta linha, há que se registrar que o crime foi perpetrado em concurso de agentes e por rompimento de obstáculo, o que afasta a aplicação do princípio da insignificância, conforme reiterada jurisprudência do STJ, em razão de revelar maior gravidade das circunstâncias do caso concreto, e, não caracterizar o reduzido grau de reprovabilidade da conduta. Precedentes. Ademais, cabe destacar que não se vislumbra, nos autos, laudo de avaliação, ou mesmo, nota das mercadorias subtraídas, constando apenas a descrição dos objetos do auto de apreensão. Ressalte-se que a jurisprudência do Eg. STJ alinha-se no sentido de que a ausência de laudo de avalição da res furtivae revela também impeditivo ao reconhecimento do princípio da insignificância. Precedentes. Portanto, escorreito o juízo de censura em relação a ambos os apelantes, estando presentes as qualificadoras do rompimento de obstáculo e do concurso de pessoas, conforme §4º, I e IV do CP, art. 155. Merece reparo a dosimetria realizada pelo juízo de piso. Em relação ao apelante Raul, na primeira fase, o sentenciante considerou o rompimento de obstáculo para formar o tipo qualificado, e utilizou o período noturno como circunstância negativa, o que está de acordo com o entendimento do Eg. STJ (AgRg no HC 801.570/SP, Quinta Turma, julgado em 18/9/2023). Desta forma, com a aplicação da fração de exaspero em 1/6, a pena base atinge o patamar de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa, no menor valor unitário. Na segunda fase, presente a atenuante da confissão extrajudicial, volve a pena ao patamar mínimo de 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, no valor mínimo legal. Na terceira fase, considerando a primariedade do apelante e que os bens subtraídos foram de pequeno valor, deve ser reconhecida a figura do furto privilegiado, consoante §2º do CP, art. 155. In casu, o apelante preenche os requisitos da benesse. A orientação jurisprudencial do Eg. STJ é no sentido de que, para o reconhecimento do crime de furto privilegiado, a norma penal exige a conjugação de dois requisitos objetivos, consubstanciados na primariedade e no pequeno valor da coisa furtada, a qual não deve ultrapassar o valor do salário-mínimo vigente à época dos fatos. (AgRg no REsp. Acórdão/STJ, Relator(a) Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 03/09/2019, DJe 09/09/2019; AgRg no HC 320660/SP, Relator(a) Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 30/03/2017, Dje 07/04/2017. Em tal contexto, e ressaltando-se que a Corte Superior também entende que a aplicação do privilégio a que alude o § 2º, do CP, art. 155 não é um ato discricionário do julgador, tem-se que, sendo o apelante primário, possui o direito subjetivo ao amealho da aludida benesse, devendo incidir, dentre as alternativas legais, a fração de 2/3 pela benesse. Desta forma, a resposta se aquieta em 08 meses de reclusão e 03 dias-multa. Nos termos do art. 33, §2º, «c, deve ser mantido o regime aberto para cumprimento da pena. Em relação ao apelante Matheus, na primeira fase, o sentenciante considerou o rompimento de obstáculo para formar o tipo qualificado, e utilizou o período noturno como circunstância negativa, utilizando escorreitamente a fração de 1/6 a ensejar o patamar de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa, no menor valor unitário. Contudo, consoante se verifica na FAC do apelante Matheus, e-doc. 45, inexistem anotações esclarecidas aptas a caracterizar a reincidência, razão pela qual deve ser afastada tal circunstância negativa e, diante da confissão extrajudicial do acusado, volve a pena ao patamar de 2 (dois) anos e 10 (dez) dias-multa no valor mínimo legal. Na terceira fase, preenchidos os requisitos legais, deve ser reconhecida a figura do furto privilegiado, consoante §2º do CP, art. 155, resultando no patamar de 8 (oito) meses e 3 (três) dias-multa, no valor mínimo legal. Todavia, à luz da nova apenação, é de rigor o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva, na modalidade retroativa. A denúncia foi recebida em 02/03/2020 (e-doc. 163), e a sentença, exarada em 11/12/2023 (e-doc. 411), publicada em 11/12/2023 (e-doc. 419), e diante da adequação da resposta estatal em 08 meses de reclusão a ambos os apelantes, impõe-se a extinção da punibilidade, pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, modalidade retroativa, que se deu em 02/03/2021, nos termos do art. 110, §1º e art. 109, VI, ambos do CP. RECURSO DEFENSIVO CONHECIDO, PRELIMINAR REJEITADA, E, NO MÉRITO, PARCIALMENTE PROVIDO, DECLARANDO, DE OFÍCIO, EXTINTA A PUNIBILIDADE DE AMBOS OS APELANTES, PELA PRESCRIÇÃO RETROATIVA DA PRETENSÃO PUNITIVA, COM FULCRO NO ART. 110, §1º E 109, VI, AMBOS DO CÓDIGO PENAL.... ()

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