Jurisprudência Selecionada
1 - TJRJ APELAÇÃO. ART. 129, § 2º, III, C/C § 10 E § 13 E ART. 147, AMBOS OS ARTIGOS C/C O ART. 61, II, «F, N/F DO ART. 69, TODOS DO CP, N/F DA LEI 11.340/06. SENTENÇA CONDENATÓRIA. PENA DE 05 ANOS E 06 MESES DE RECLUSÃO, EM REGIME SEMIABERTO, MANTIDA A CUSTÓDIA CAUTELAR. A SENTENÇA AINDA FIXOU O VALOR DE R$ 1.000,00 A TÍTULO DE REPARAÇÃO À OFENDIDA E CONDENOU O RECORRENTE O PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO AO SUS PELO QUE DESPENDEU NO ATENDIMENTO À OFENDIDA. RECURSO DA DEFESA. PEDE A ABSOLVIÇÃO. CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA, REQUER A DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA DO APELANTE QUE MELHOR SE ADEQUARIA AO DELITO TIPIFICADO NO CP, art. 129, CAPUT. PEDE, TAMBÉM, QUE SE AFASTE A OBRIGATORIEDADE DE SE INDENIZAR O SUS. PEDE POR FIM, QUE SE CONCEDA AO CONDENADO O DIREITO DE APELAR EM LIBERDADE.
O recurso preenche os requisitos de admissibilidade e deve ser conhecido. A peça acusatória narra que o denunciado com vontade livre e consciente de causar temor, prevalecendo-se das relações domésticas e familiares, ameaçou sua companheira, dizendo-lhe: «Você quer ver eu acabar com você? Quer ver?". Nas mesmas circunstâncias, o recorrente de forma livre, consciente e voluntária, com intenção de lesionar, em contexto de violência doméstica, ofendeu a integridade corporal da sua companheira, puxando-a pelos cabelos e desferindo socos no seu rosto. As lesões causaram na ofendida deformidade permanente, porque em função delas, perdeu um dente. Em Juízo foram ouvidas a vítima, e duas testemunhas. O réu foi interrogado. O Boletim de atendimento médico da vítima informa que esta tinha uma lesão na boca, que houve a perda de um dente e que a hipótese diagnóstica seria de trauma direto - soco (e-doc. 230). Vale ainda observar as declarações prestadas pela vítima em sede policial, logo após os fatos. A condenação acerca do crime de lesão corporal deve ser mantida, não existindo a possibilidade de desclassificação, como almeja a Defesa. Em sede policial, prestou declarações firmes e concatenadas, que se coadunam com o BAM e o laudo de corpo de delito e que são corroboradas pelas declarações da testemunha M. E aqui, considera-se importante destacar que M. confirmou que J. deu socos na ofendida, haviam ingerido bebida alcoólica, mas que estavam alterados. Considera-se importante destacar também que J. em seu interrogatório disse que cuspiu sangue contra si. Sangue proveniente da boca da ofendida, o que revela que não teria apenas tentado afastá-la, ou tentado se proteger, ou ter encostado no rosto dela. A agressão contra foi de tal monta que esta acumulou sangue em sua boca, a ponto de conseguir cuspir e encher o réu de sangue, como ele mesmo relatou. Considera-se importante destacar, por fim, que submetido a exame de corpo de delito, a perícia médica não conseguiu encontrar qualquer lesão no corpo do recorrente (e-doc. 46). Em Juízo, por outro giro, a ofendida apresentou versão distante do que disse em sede policial, do que constataram os documentos técnicos e do que narrou M. começa seu depoimento ressaltando as agressões que teria perpetrado contra o réu, ressaltando o seu descontrole emocional e seu ânimo exaltado, dando pouca importância ao que o recorrente teria feito contra ela, num claro intuito de querer livrar o apelante das acusações, colocando-se como única culpada pela prisão de J.. E não é raro que a vítima, em audiência, manifeste o seu desejo de não falar sobre os fatos narrados na denúncia, fale sobre eles, se colocando como culpada, ou ainda, como merecedora das agressões que sofreu. Diversas razões são encontradas para este comportamento, dentre elas, o sofrimento causado pelos fatos, o temor de desintegração familiar, o medo do agressor e a dependência afetiva ou econômica dele. Assim, não se pode permitir que a postura de N. plenamente justificada, possa levar o réu a uma sentença absolutória, por falta de provas. De acordo com a decisão vinculante proferida pelo STF, na ADI 4424, nos crimes de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher, a ação penal é pública incondicionada, em razão da posição de vulnerabilidade em que a vítima se encontra não podendo se deixar nas mãos dela a decisão de seguimento ou não da ação penal contra o seu agressor. No mesmo passo, a postura de narrando com mais detalhes o seu atuar e deixando em segundo plano a conduta do réu, revelam de forma clara a mencionada vulnerabilidade e temor, mesmo que a ofendida diga que não foi pressionada para se portar desta forma e que tudo que tenha dito, foi baseado no seu senso de justiça ou por ser J. uma pessoa boa. A acusação, por outro giro, não logrou êxito em demonstrar que a lesão corporal sofrida pela ofendida lhe causou debilidade permanente. Não se discute que perdeu um dente quando golpeada pelo recorrente e isto restou comprovado pelas declarações da vítima, do próprio réu e pelo boletim de atendimento médico. Mas há dúvidas sobre a existência ou não de debilidade permanente que possa implicar na aplicação da qualificadora do art. 129, § 2º, III do CP. O laudo de Exame de Lesão Corporal respondeu negativamente ao quesito que se refere à debilidade permanente ou perda ou inutilização de membro, sentido ou função (e-doc. 26). A vítima disse que o dente que perdeu, na verdade, era uma prótese provisória, que usava para funções estéticas, até que realizasse o implante definitivo e para sustentar sua alegação juntou os documentos que se encontram nos e-docs. 289 e 292. E diante deste cenário afasta-se a qualificadora do art. 129, § 2, III do CP. No que tange ao crime de ameaça, a fragilidade probatória também está posta. Em que pese a indiscutível relevância da palavra da vítima nos crimes de violência doméstica, e em que pese ainda a justificável postura de em sede judicial, o conjunto probatório não é seguro para sustentar a condenação do réu pelo crime em questão. Vale dizer que a mencionada ameaça foi relatada apenas por e apenas em sede policial. D. e M. testemunhas oculares de toda dinâmica delitiva, nada disseram sobre a mencionada ameaça, em sede policial. Em Juízo, questionada especificamente sobre tal crime, a testemunha M. disse que não ouviu o réu ameaçar a vítima, dentro do carro, e que apenas o ouviu pedir para que ela saísse da vida dele. Depois que todos desembarcaram do veículo, M. se manteve longe de J. e Pontua-se, que segundo a narrativa de N. em sede policial, a ameaça teria se dado dentro do carro. Assim, não se pode negar peremptoriamente a ocorrência da ameaça, mas também não se pode afirmá-la com certeza, de modo que, diante da dúvida invencível, de rigor a absolvição, por insuficiência de provas. Passando ao processo dosimétrico tem-se que a pena-base deve ser majorada em 1/6 apenas em razão de uma condenação com trânsito em julgado, sofrida pelo recorrente, que será levada em conta neste momento da dosimetria. A pena atinge o patamar de 01 ano e 02 meses de reclusão. Na segunda fase, correto o recrudescimento da reprimenda, porém em 1/5, em razão de duas circunstâncias agravantes previstas no art. 61, I e II «f, do CP. Assim, a pena fica em 01 ano, 04 meses e 24 dias de reclusão e, diante da ausência de causas de aumento ou de diminuição de pena, se petrifica nesses termos. Mantido o regime prisional semiaberto, diante dos maus antecedentes e da reincidência do recorrente, nos termos do CP, art. 33. Mantida a obrigação do réu em ressarcir ao SUS os valores por ele despendidos no atendimento à vítima, nos exatos termos do art. 9º, § 4º da Lei Maria da Penha. Mantida ainda a fixação de indenização por danos morais causados à vítima no valor de R$ 1.000,00, já que, corretamente requeridos pela Acusação, na denúncia, e fixados pelo juiz na sentença, não tendo tal ponto sido alvo de impugnação objetiva por parte do recurso. Por fim, o pedido para que J. possa recorrer em liberdade não merece acolhida. O apelante respondeu a toda a ação penal preso preventivamente, permanecendo hígido o quadro que autorizou o decreto de constrição cautelar. Ademais, não há sentido em conceder-lhe tal direito com um juízo de reprovabilidade, ainda que provisório, já formado (precedente). RECURSO CONHECIDO. PROVIMENTO PARCIAL.... ()
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