Jurisprudência Selecionada
1 - TJRJ Apelações criminais interpostas pelo Ministério Público e pela Defesa. Condenação dos réus Alef e Raul pelos crime de tráfico e associação. Recurso ministerial que requer o aumento das penas-bases aplicadas aos réus. Irresignação defensiva que argui a nulidade das provas por alegada violação do direito ao silêncio e ilicitude da busca domiciliar, e, no mérito, persegue a solução absolutória, e, subsidiariamente, o reconhecimento do privilégio, a revisão da dosimetria, a substituição por restritivas, o abrandamento do regime e a isenção do pagamento das despesas processuais. Preliminares que não reúnem condições de acolhimento. Delação recepcionada que, excepcionalmente, no contexto dos fatos, tende a expressar justa causa, a legitimar a abordagem policial. Instrução revelando que policiais militares receberam informação de que, em determinado endereço, situado em área dominada pelo Comando Vermelho, havia dois elementos realizando endolação de drogas, fornecendo as características dos suspeitos. Procederam ao local indicado e avistaram os dois Réus juntos na calçada (ambos já conhecidos pelo envolvimento com o tráfico), um deles (Alef) com uma mochila nas costas, os quais correram em fuga para dentro de um quintal que dava acesso a diversos imóveis e foram capturados, sendo apurado que Alef morava em uma dessas casas. Revista pessoal revelando que a mochila portada por Alef continha 2.300g de cocaína (dividida em dois tabletes) e material para endolação (balança de precisão, tesoura, faca e rolo de durex). Orientação recente do STF, em situação análoga e data recente, considerando válida até mesmo o ingresso policial em residência (quanto mais a abordagem num quintal que dava acesso a vários imóveis), «quando o agente, ao visualizar a viatura policial, sai correndo em atitude suspeita para o interior de sua casa". Situação apresentada que, diante desse quadro, não tende a expor qualquer nulidade ou eventual ilicitude das provas por inviolabilidade domiciliar, pois se trata de crime de natureza permanente, com justa causa a legitimar a atuação oficial, «prescindindo de mandado judicial, qualquer que seja sua natureza (STF). Segunda preliminar que, versando sobre eventual falta de comunicação sobre o direito ao silêncio, não exibe ressonância prática em relação ao acusado Raul, considerando que o mesmo externou negativa de autoria na DP e em juízo, pelo que não se cogita de qualquer prejuízo decorrente (STJ). Igual ausência de irregularidade na atuação policial em relação ao réu Alef, sendo a apreensão das drogas fruto de estridente situação de flagrante, e não de uma suposta confissão informal. Réu que foi licitamente abordado após ser visto em antro da traficância fugindo com uma mochila nas costas, em companhia de outro indivíduo, apurando-se, de imediato, que ele carregava grande quantidade de entorpecente e material destinado à preparação da droga. Preliminares rejeitadas. Mérito que se resolve em desfavor da Acusação e parcialmente em favor da Defesa. Materialidade e autoria inquestionáveis. Conjunto probatório apto a suportar a versão restritiva em face do acusado Alef, no que se refere à imputação de tráfico. Testemunho policial ratificando a versão restritiva, suficiente a atrair a primazia da Súmula 70/TJERJ c/c CPP, art. 155. Acusado Alef que, em sede policial, admitiu a propriedade de todo o material arrecadado, aduzindo que o entorpecente era destinado ao uso próprio. Réu que, em juízo, alterou parcialmente sua versão, aduzindo que havia chamado o acusado Raul para fumar maconha, mas este disse que iria em casa e depois retornava, sendo que, nesse ínterim, os Policiais ingressaram na sua residência e encontraram a mochila com drogas embaixo de sua cama, cuja propriedade atribuiu a terceira pessoa não identificada. Versão que culminou isolada, sem o respaldo de qualquer contraprova defensiva, cedendo espaço diante do contexto apresentado. Apelante Raul que, tanto na DP quanto em juízo, negou os fatos que lhe foram imputados, aduzindo que chegou na casa de Alef para fumar maconha, sem portar nada de ilícito, e foi preso pelos Policiais. Circunstâncias do evento imputado que tendem a indicar, no conjunto, a posse de material espúrio pelo acusado Alef e a respectiva finalidade difusora, destacando-se o local do evento (conhecido antro da traficância dominado pelo Comando Vermelho), a arrecadação conjunta de petrechos comumente utilizados para fracionamento da droga (balança de precisão, faca, tesoura e rolo de durex), bem como a elevada quantidade do material apreendido (2.300g de cocaína). Absolvição que, no entanto, se impõe em relação ao acusado Raul. Instrução reveladora de dúvida sobre a autoria em face do Réu, o qual não foi encontrado com material entorpecente ou outros elementos diretamente ligados ao exercício da traficância, e tampouco foi visto exercendo qualquer atividade inerente ao comércio espúrio. Impossibilidade de se afirmar a autoria com base exclusivamente em delação anônima e confissão informal. Inexistência de mínima observação prévia pelos policiais, a fim de confirmar o conteúdo da delação recepcionada, não havendo lastro probatório seguro para se afirmar o porte da droga como compartilhado, ciente de que todo o material estava dentro de uma mochila, nas costas de Alef, sendo a posse do material assumida por este. Princípio da íntima convicção que há de ceder espaço em favor do postulado da livre persuasão racional (CPP, art. 155), devendo a conclusão estar lastreada em evidências inequívocas, ao largo de convicções pessoais extraídas a partir de deduções inteiramente possíveis, porém não integralmente comprovadas, estreme de dúvidas (STJ). Crime de associação ao tráfico não configurado. Fragilidade probatória relacionada à efetiva comprovação dos atributos da estabilidade e permanência inerentes ao respectivo vínculo associativo, não sendo suficiente eventual situação de coautoria. Princípio da íntima convicção que há de ceder espaço ao da livre persuasão racional (CPP, art. 155), devendo a decisão estar lastreada em evidências inequívocas, ao largo de convicções pessoais extraídas a partir de deduções inteiramente possíveis, porém não integralmente comprovadas, estreme de dúvidas. Inviabilidade de concessão do privilégio em favor de Alef, pela ausência dos seus requisitos legais cumulativos. Benesse que, em linhas gerais, se destina a favorecer apenas o traficante comprovadamente episódico, neófito e sem nenhuma expressão de periculosidade social. Firme orientação do STF enfatizando, como no caso, que «a expressiva quantidade e variedade de drogas apreendidas, acondicionadas em porções passíveis de imediata disseminação, denotam o intenso envolvimento do paciente com o tráfico, a justificar a recusa da aplicação do redutor da Lei 11.343/2006, art. 33, § 4º". Hipótese na qual o apelante Alef, além de ter sido flagrado, em via pública, na posse de expressiva quantidade de cocaína, outras circunstâncias concorrem para a negativa do benefício, certo de que a sua prisão se deu em conhecido antro da traficância (STJ), oportunidade em que também houve a arrecadação de petrechos comumente utilizados para a comercialização (STJ), sendo o Réu já conhecido de outras abordagens. Todas essas situações denotam, no seu conjunto, suficiente noção de reiteração e profissionalismo, a manifestar dedicação à atividade criminosa, a despeito de não ter sido possível provar estritamente a estabilidade e a permanência inerentes aa Lei 11.343/2006, art. 35, valendo realçar que «a dedicação do agente a atividade criminosa é óbice à aplicação da causa de redução da pena, independentemente do grau de comprometimento do agente com o crime ou da complexidade da estrutura da organização (STJ). Juízos de condenação e tipicidade que, nesses termos, se restringem ao injusto de tráfico (Alef). Dosimetria de Alef que tende a comportar parcial ajuste. Culpabilidade que extrapola os limites do tipo penal imputado, considerando a elevada quantidade do material apreendido, de destacado grau de nocividade (2.300g de cocaína), negativando o exame dos arts. 42 da LD e 59 do CP. Improcedência do pleito ministerial que persegue a aplicação do aumento de 1/6 sobre o intervalo entre as penas mínima e máxima previstas nos preceitos secundários dos tipos penais. Firme orientação do STJ enfatizando que, «para elevação da pena-base, podem ser utilizadas as frações de 1/6 sobre a pena-mínima ou de 1/8 sobre o intervalo entre as penas mínima e máxima, exigindo-se fundamentação concreta e objetiva para o uso de percentual de aumento diverso de um desses". Caso presente que se situa em quantitativo diferenciado e expressivo, face ao que comparativamente costuma ocorrer no cotidiano forense, viabilizando o aumento diferenciado sobre a pena-base (1/5), com incidência sobre a pena mínima cominada, tal como operado pela instância de base. Confissão, mesmo que parcial, justificante ou retratada em juízo, que se reconhece, em relação ao injusto de tráfico, na forma da Súmula 545/STJ. Réu que, ao admitir em juízo que guardava a mochila para terceira pessoa, reconhecendo, na mesma linha, que sabia da existência de material entorpecente em seu interior, acabou por confessar o exercício da traficância, razão pela qual faz jus à aplicação da atenuante, afastando-se a incidência da Súmula 630/STJ. Quantitativo de pena aplicado (superior a quatro anos) que inviabiliza a concessão de restritivas (CP, art. 44). Regime prisional que, mesmo em sede de crime hediondo ou equiparado, há de ser depurado segundo as regras do CP, art. 33 (STF). Firme jurisprudência do STF, enaltecendo que, «no tráfico de drogas, é admissível a imposição de regime inicial fechado, com base, exclusivamente, na quantidade ou natureza das drogas apreendida". Observância adicional da Súmula 440/STJ, já que positivada a negativação dos arts. 59 do CP e 42 da Lei 11343/2006 (cf. art. 33, § 2º, «b, e § 3º, do CP). Questão das custas e despesas processuais que, no processo penal, há de ser tratada no bojo do processo de execução (TJERJ, Súmula 74). Rejeição das preliminares defensivas, desprovimento do recurso ministerial e parcial provimento do defensivo, para: (a) absolver o réu Raul de todas as imputações, na forma do CPP, art. 386, VII, com expedição de alvará de soltura em seu favor; (b) e absolver o réu Alef da imputação de associação e redimensionar as suas sanções finais para 05 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa, à razão unitária mínima, mantido o regime fechado.
(Íntegra e dados do acórdão exclusivo para clientes)
Plano mensal por R$ 19,90 veja outros planos
Cadastre-se e adquira seu pacote