Jurisprudência Selecionada
1 - TJRJ APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO SIMPLES. RECURSOS RECÍPROCOS. RECURSO DEFENSIVO. MATERIALIDADE E AUTORIA INCONTROVERSAS. DEFESA QUE BUSCA A ABSOLVIÇÃO PELO RECONHECIMENTO DO CRIME IMPOSSÍVEL. INVIABILIDADE. RECONHECIMENTO DA TENTATIVA. IMPOSSIBILIDADE. DOSIMETRIA QUE DESAFIA AJUSTE. RECURSO MINISTERIAL. MAJORAÇÃO DA PENA-BASE. REJEIÇÃO. RECRUDESCIMENTO DO REGIME PRISIONAL. ACOLHIMENTO. 1)
Emerge firme da prova judicial que o acusado subtraiu um aparelho celular da marca Samsung, modelo Galaxy Gran Prime Duos TV, além de um carregador compatível com o aparelho, ambos de propriedade da vítima Maria Selma. Consta que a vítima foi ao Hospital Plantadores de Cana acompanhando seu marido em busca de atendimento médico e deixou o celular na posse dele, posicionando-se em uma cadeira mais próxima à recepção para monitorar o atendimento. Assim, o marido da vítima colocou o aparelho para carregar em uma das tomadas do hospital e acabou por pegar no sono, momento em que o acusado se aproximou, subtraiu o aparelho e o carregador, evadindo-se do local. Não obstante, imediatamente após a subtração, a vítima, que viu toda a ação criminosa, se pôs a gritar pega ladrão, pega ladrão e a correr atrás do acusado. Em seguida, os agentes da Guarda Municipal que estavam em patrulha pelo local iniciaram uma perseguição, logrando alcançá-lo na posse dos bens. 2) A materialidade e a autoria do delito não foram objeto de irresignação defensiva, até porque restam inequívocas a autoria da subtração imputada ao acusado, diante das circunstâncias da prisão em flagrante do apelante na posse da res furtivae, tudo a corroborar as declarações da vítima e dos guardas municipais, ouvidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, sendo tais testemunhos prova judicial suficiente para embasar um decreto condenatório. 3) A existência de sistema de monitoramento eletrônico ou a observação do praticante do furto pela vítima, como ocorreu na espécie, não rende ensejo, por si só, ao automático reconhecimento da existência de crime impossível, porquanto, mesmo assim, há possibilidade de o delito ocorrer. Incidência da Súmula 567/STJ. Tese firmada pelo STJ em recurso representativo da controvérsia no julgamento do Resp 1.385.621/MG, DJe 02/06/2015. 4) De igual modo, impossível o reconhecimento da modalidade tentada, encontrando-se consolidada nos Tribunais Superiores a adoção da teoria da apprehensio (ou amotio), no sentido de que a mera inversão da posse caracteriza a consumação do delito patrimonial, não se preocupando se ela se fez mansa, pacífica e desvigiada, conforme enuncia o verbete 582 do STJ. 5) Dosimetria. 5.1) Inexistem pesos distintos e predeterminados entre as circunstâncias judiciais elencadas no CP, art. 59, cujos conceitos, sob muitos aspectos, se sobrepõem e se interpolam. O julgador possui discricionariedade vinculada para fixar a pena-base, devendo proceder ao respectivo aumento, de maneira fundamenta, à luz do caso concreto, em função do maior juízo de censura atrelado às particularidades fáticas do caso concreto e subjetivas do agente, vedado apenas o bis in idem. 5.2.1) Na primeira fase do processo dosimétrico, a pena-base do acusado foi estabelecida acima do mínimo legal, em 1 (um) ano e 11 (onze) meses de reclusão, mais 13 (treze) dias-multa. Nesse contexto, devidamente fundamentada a elevação da pena acima do mínimo legal, em razão das circunstâncias em que o delito foi cometido extrapolou as normais ao tipo, eis que foi praticado dentro de unidade hospitalar, contra vítimas em estado de saúde vulnerável, o que indica maior reprovabilidade da conduta. 5.2.2) Da mesma forma, os maus antecedentes importam na exasperação da pena-base, constando de dicção legal expressa (CP, art. 59). Consultando as 02ª, 03ª, 05ª e 10ª anotações (FAC - doc. 35), verifica-se que correspondem a processos cujo trânsito em julgado ocorreu em 17/07/1991, 12/05/2003, 10/01/1995 e 13/10/2010, respectivamente. A defesa questiona a utilização de tais anotações, pois são extremamente antigas. Contudo, não merece acolhimento a insurgência defensiva. Diversamente da reincidência, o CP adotou para os maus antecedentes o sistema da perpetuidade, não havendo limite temporal para o reconhecimento dessa circunstância judicial desfavorável. Ademais, o Supremo Tribunal Federal, em sessão virtual encerrada em 17/08/2020, por maioria de votos, no julgamento Recurso Extraordinário (RE) 593818, com repercussão geral reconhecida (Tema 150), decidiu que a pena extinta há mais de cinco anos pode caracterizar maus antecedentes. Nesse cenário, ainda que se sustente a impossibilidade de transformar os antecedentes em estigma perpétuo, o que as várias e sucessivas condenações in casu revelam, quase todas por delitos patrimoniais, não são situações de vida já superadas, de sorte a merecer esquecimento, mas sim o histórico de um criminoso renitente. 5.2.3) Todavia, não assiste razão ao Ministério Público quando pretende a exasperação da pena na primeira fase da dosimetria, sob o argumento de que as consequências do crime aumentam a reprovabilidade da conduta, vez que o celular da vítima foi danificado, resultando no prejuízo financeiro desta. Nesse contexto, o prejuízo suportado pela vítima é inerente ao tipo penal do furto, não devendo, com fundamento na circunstância judicial relativa às consequências do crime, servir para a exasperação da pena-base, exceto quando o valor for expressivo e extrapolar a normalidade do tipo, o que, entretanto, não é o caso dos autos. Precedentes do Eg. STJ. 5.2.4) Assim, uma vez reconhecida duas circunstâncias judiciais, e embora o aumento em 11 (onze) meses tenha se mostrado desproporcional, não há obrigatoriedade na aplicação do patamar de 1/8 para cada fator desfavorável, como pretende a defesa, motivo pelo qual se aplica a fração usual de aumento de 1/6, nos termos jurisprudenciais (STJ, 607497, AgRg no HC, Rel. Min. ROGERIO SCHIETTI CRUZ, julgamento 22/09/2020) com o que fica a pena-base redimensionada para 01 (um) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, mais 13 (treze) dias-multa. 5.3) Na segunda fase, na consulta à FAC do acusado no doc. 160 consta condenação definitiva em data anterior ao crime em análise, o que caracteriza reincidência (anotação 13: processo 0002085-87.2015.8.19.0014, furto qualificado, transitado em julgado em 27/02/2018), conforme operado na sentença. Não obstante, a FAC do acusado (doc. 160 - fls. 175) revela que ele possui uma anotação por crime de furto que não é capaz de levar ao reconhecimento de reincidência, sendo tal condenação por crime anterior à prática delitiva, com trânsito em julgado posterior à data do crime sob apuração, ensejando a valoração negativa dos antecedentes do agente (anotação 14: processo 0077522-08.2017.8.19.0001, transitado em julgado em 17/12/2021). Nesse sentido, tendo em vista o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea esta deve ser compensada com a reincidência, na medida em que encontra-se consolidado na jurisprudência do STJ que a confissão espontânea, seja informal, extrajudicial ou judicial, parcial ou total, qualificada ou retratada em juízo, deve ser reconhecida quando utilizada como fundamento para a condenação (Súmula 545/STJ). 5.4) Na terceira fase do processo dosimétrico, afastada a causa de diminuição da tentativa e diante da ausência de outros vetores a serem considerados, acomoda-se a pena final do acusado em 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão, mais 13 (treze) dias-multa. 6) Regime prisional. A valoração de circunstância judicial negativa, que foi causa suficiente do afastamento da pena-base de seu mínimo legal, aliada à reincidência específica, justificam a fixação do regime inicial fechado. Precedentes. 7) A condição de reincidente impede a suspensão condicional da pena (art. 77, I do CP) e, sendo específica a reincidência, fica igualmente obstada a substituição da pena corporal por restritivas de direitos (art. 44, §3º, do CP). 8) As custas processuais são consectário legal da condenação, conforme previsão expressa do CPP, art. 804, não infirmando sua imposição o benefício da Gratuidade de Justiça. A análise de eventual impossibilidade de pagamento compete ao Juízo da Execução Penal (Súmula 74/TJERJ; precedentes do STJ). Recursos parcialmente providos.... ()
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