Jurisprudência em Destaque

STJ. 4ª T. Execução. Penhora. Bem de família. Imóvel valioso situado em bairro nobre. Impenhorabilidade reconhecida na hipótese. Considerações do Min. Luis Felipe Salomão sobre o tema. Precedentes do STJ. Lei 8.009/1990, art. 1º.

Postado por Emilio Sabatovski em 17/11/2011
«... 4. O cerne da questão de mérito é saber se o imóvel levado a constrição, situado em bairro nobre da capital paulista e com valor elevado, pode ser considerado bem de família, para efeito da proteção legal de impenhorabilidade.

(...).

5. Dispõe o art. 1º da Lei 8.009/90:


Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.


Parágrafo único - A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.

A norma, como se percebe, é de ordem pública, de cunho eminentemente social e que tem por escopo resguardar o direito à residência ao devedor e a sua família, assegurando-lhes condições dignas de moradia, indispensáveis à manutenção e à sobrevivência da célula familiar.

A propósito, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do Recurso Especial 831.811/SP, relatora para acórdão a eminente Ministra Nancy Andrighi, pela colenda Terceira Turma, estando o acórdão assim sintetizado:


DIREITO CIVIL. BEM DE FAMÍLIA. EXISTÊNCIA DE OUTROS IMÓVEIS RESIDENCIAIS GRAVADOS COM CLÁUSULA DE IMPENHORABILIDADE. INAPLICABILIDADE DA Lei 8.009/90.


- O propósito da Lei 8.009/90 é a defesa da célula familiar. O escopo da norma não é proteger o devedor, mas sim o bem estar da família, cuja estrutura, por coincidência, pode estar organizada em torno de bens pertencentes ao devedor. Nessa hipótese, sopesadas a satisfação do credor e a preservação da família, o fiel da balança pende para o bem estar desta última.


- Contudo, os excessos devem ser coibidos, justamente para não levar o instituto ao descrédito. Assim, a legitimidade da escolha do bem destinado à proteção da Lei 8.009/90, feita com preferência pela família, deve ser confrontada com o restante do patrimônio existente, sobretudo quando este, de um lado se mostra incapaz de satisfazer eventual dívida do devedor, mas de outro atende perfeitamente às necessidades de manutenção e sobrevivência do organismo familiar.


- Nesse contexto, fere de morte qualquer senso de justiça e equidade, além de distorcer por completo os benefícios vislumbrados pela Lei 8.009/90, a pretensão do devedor que a despeito de já possuir dois imóveis residenciais gravados com cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade, optar por não morar em nenhum deles, adquirindo um outro bem, sem sequer registrá-lo em seu nome, onde reside com sua família e querer que também este seja alcançado pela impenhorabilidade.


Recurso especial não conhecido.


(REsp 831.811/SP, Rel. Min. ARI PARGENDLER, Rel. p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJe 5/8/2008)

Naquela oportunidade, asseverou a ilustre Relatora para acórdão:


(...) Conforme anota Álvaro Villaça Azevedo, o instituidor é o próprio Estado, «que impõe o bem de família, por norma de ordem pública, em defesa da célula familial. Nessa lei emergencial, não fica a família à mercê de proteção, por seus integrantes, mas é defendida pelo próprio Estado, de que é fundamento». (Bem de Família. São Paulo: RT, 2002, 5ª ed., p. 167).


Com efeito, uma das prioridades do Estado deve ser a preservação do organismo familiar. Cada família que se desconjunta, cada família que se vê esbulhada a ponto de temer sua própria conservação, causa, ou pelo menos deveria causar, um sentimento de responsabilidade ao Estado, cujo dever é de proteção geral aos indivíduos, intervindo, sempre, para coibir os excessos, para impedir a colisão de interesses, acentuando a salvaguarda dos coletivos mais do que dos particulares.


Assim, deve ficar claro que a finalidade da Lei 8.009/90 não é proteger o devedor contra suas dívidas, tornando seus bens impenhoráveis, mas sim abrigar a família, evitando a sua desarticulação.


O alerta é de suma importância porque, não raro, deparamo-nos com devedores que manipulam as garantias da lei em proveito próprio e não da família, utilizando o instituto com o propósito único e premeditado de não pagarem suas dívidas.


Essa preocupação, aliás, foi manifestada já na própria exposição de motivos da Lei 8.009/90, tendo o então Min. da Justiça, Saulo Ramos, ressalvado que «a proteção assim estabelecida é ampla e reclama cuidados especiais da norma que a institui».


Como se vê, a interpretação da Lei 8.009/90 deve sempre ser feita com foco na preservação da célula familiar, coibindo toda sorte de artifícios empregados na tentativa de alargar a proteção almejada pelo legislador, em especial quando evidenciado o intento de blindar o patrimônio do devedor, impedindo ou dificultando a satisfação dos credores.

6. No caso dos autos, o acórdão recorrido assevera que o valor do imóvel é de R$ 805.091,00 (oitocentos e cinco mil e noventa e um reais), frente a uma dívida de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais).

Por outro lado, é incontroverso que o executado não dispõe de outros bens capazes de garantir a execução, e que reside no imóvel, em companhia de seu filho, caracterizando ente familiar (fls. 161).

A tese do acórdão é a de que o «espírito do legislador ...por certo não foi o de estabelecer forma legal de calote de dívidas regularmente constituídas...».

Todavia, essa não é a melhor solução para o caso.

De fato, a lei não distingue entre imóvel valioso ou não, para efeito da proteção legal da moradia.

Além do mais, o conceito de imóvel valioso, evidentemente, é bastante subjetivo, sujeito a inúmeras circunstâncias.

O preço de um imóvel, como se sabe, varia ao sabor de sua localização, estado de habitação, oferta/procura, situação jurídica, dentre outros tantos fatores que certamente influenciam a cotação de mercado.

Outrossim, ainda que valioso o imóvel, esse fato não retira sua condição de serviente a habitação da família.

Releva notar que houve veto presidencial à proposta de parágrafo único do art. 650 do CPC, que, na redação original do PL 4497, posteriormente convertido na Lei 11.382/06, permitia a penhora do imóvel residencial de valor superior a 1.000 salários mínimos.

Vale dizer, portanto, que o sistema legal repele a inserção de limites à impenhorabilidade de imóvel residencial, maneira «hobin hood». de satisfação do credor.

Nesse sentido, a lição do prof. Araken de Assis, in Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e Impenhorabilidade da Residência Familiar, Revista Jurídica 384:


(...) Importa realçar que à Lei 8.009/1990 não interessa a qualidade e o valor da moradia. É o que rezava, na redação da Lei 6.742/1979, o art. 19 do Dec.-Lei 3.200/1941. O art. 1.711, «caput», do Código Civil de 2002, porém, limitou o valor dos bens subtraídos voluntariamente à execução, incluindo o imóvel, a um terço de patrimônio líquido existente por ocasião do ato. Nada obstante, a impenhorabilidade da residência familiar, de acordo com a Lei 8.009/1990, alcança tanto o casebre quanto o palácio. Não faltaram sugestões para distinguir a qualidade dos imóveis, penhorando o palácio e protegendo o prédio comum, empregando o juiz o princípio da proporcionalidade. Nenhum eco logrou esse entendimento na jurisprudência dos tribunais superiores. Aliás, o art. 4º, «caput», da Lei 8.009/1990 confirma, indiretamente, a proteção às construções suntuosas, reprimindo tão só a aquisição de «imóvel mais valioso» pelo executado insolvente, relativamente ao preexistente, com o fito de transferir para ele a residência familiar, e, assim, usufruir a proteção da impenhorabilidade. O veto oposto ao parágrafo único do art. 650, constante do projeto de que resultou a Lei 11.382/2006, manteve a situação inalterada. (fls. 23)

A esse respeito, impende destacar excerto do voto proferido pelo eminente Ministro Cesar Peluso, quando do julgamento do RE 407.688-8/SP, em 8.2.2006, no tocante à constitucionalidade do art. 3º, inc. VII, da Lei 8.009/90, com a redação dada pela Lei 8.245/91, verbis:


(...) Não me parece sólida a alegação de que a penhora do bem de família do recorrente violaria o disposto no art. 6º da Constituição da República, que, por força da redação introduzida pela EC nº 26, de 15 de fevereiro de 2000, não teria recebida a norma do art. 3º, inc. VII, da Lei 8.009, de 29.03.1990, a qual, com a redação da Lei 8.245, de 18 de outubro de 1991, abriu exceção à impenhorabilidade do bem de família.


A regra constitucional enuncia direito social, que, não obstante suscetível de qualificar-se como direito subjetivo, enquanto compõe o espaço existencial da pessoa humana, «independentemente da sua justiciabilidade e exeqüibilidade imediatas», sua dimensão objetiva supõe provisão legal de prestações aos cidadãos, donde entrar na classe dos chamados «direitos a prestações, dependentes da actividade mediadora dos poderes públicos».


(...) Daí se vê logo que não repugna à ordem constitucional que o direito social de moradia - o qual, é bom observar, se não confunde, necessariamente, com o direito à propriedade imobiliária ou direito de ser proprietário de imóvel - pode, sem prejuízo de doutras alternativas conformadoras, reputar-se, em certo sentido, implementado por norma jurídica que estimule ou favoreça o incremento da oferta de imóveis para fins de locação habitacional, mediante previsão de reforço das garantias contratuais dos locadores.


(...) Daí, só poder conceber-se acertada, em certo limite, a postura de quem vê, na penhorabilidade de imóvel do fiador, regra hostil ao art. 6º da Constituição da República, em «havendo outros meios de assegurar o pagamento do débito», porque essa constitui a única hipótese em que, perdendo, diante de particular circunstância do caso, a função prática de servir à prestação de garantia exclusiva das obrigações do locatário e, como tal, de condição necessária da locação, a aplicação da regra contradiria o propósito e o alcance normativo. Aí, não incidiria, não porque, na sua generalidade e eficácia, seja desconforme com a Constituição, senão porque o fato (fattispecie concreta) é que se lhe não aperfeiçoaria ao modelo normativo (fattispecie abstrata).

7. A jurisprudência da casa segue a mesma linha, embora não haja precedente específico sobre o tema:


AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. RENÚNCIA. PRECEDENTES


Não perde o benefício da impenhorabilidade quem indica bem de família à penhora, pois a proteção da Lei 8.009/90 não tem por alvo o devedor, mas a entidade familiar, que goza de amparo especial da Carta Magna.


Agravo regimental a que se nega provimento.


(AgRg no Ag 426.422/PR, Rel. Min. PAULO FURTADO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/BA), TERCEIRA TURMA, DJe 12/11/2009)


PROCESSUAL CIVIL. CAUTELAR DE ARRESTO. EXECUÇÃO. PENHORA. BEM DE FAMÍLIA. CONSTRUÇÃO ANTERIOR SOBRE TERRENO. ART. 5º DA LEI 8.009/1990. VENCIMENTO DA DÍVIDA. IMPENHORABILIDADE RECONHECIDA.


I. O vencimento da dívida exequenda durante a construção de imóvel sobre terreno de propriedade da devedora, não afasta a incidência da Lei 8.009/1990, de modo que o imóvel fica a salvo da penhora, por constituir bem de família.


II. Recurso especial conhecido e provido.


(REsp 1087727/GO, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, DJe 16/11/2009)


PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PENHORA DE IMÓVEL. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE ABSOLUTA. ALEGAÇÃO A QUALQUER TEMPO. PRECEDENTES DA CORTE.


I - A impenhorabilidade do bem de família pode ser alegada a qualquer tempo, até mesmo por petição nos autos da execução.


Recurso Especial provido.


(REsp 1114719/SP, Rel. Min. SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, DJe 29/6/2009)


PROCESSUAL CIVIL – EXECUÇÃO FISCAL – PENHORA – BEM DE FAMÍLIA – IMPENHORABILIDADE – IMÓVEL DE PROPRIEDADE DE SOCIEDADE COMERCIAL RESIDÊNCIA DOS DOIS ÚNICOS SÓCIOS – EMPRESA FAMILIAR – PRECEDENTES.


1. A Lei 8.009/90 estabeleceu a impenhorabilidade do bem de família, incluindo na série o imóvel destinado à moradia do casal ou da entidade familiar, a teor do disposto em seu art. 1º.


2. Sendo a finalidade da Lei 8.009/90 a proteção da habitação familiar, na hipótese dos autos, demonstra-se o acerto da decisão de primeiro grau, corroborada pela Corte de origem, que reconheceu a impenhorabilidade do único imóvel onde reside a família do sócio, apesar de ser da propriedade da empresa executada, tendo em vista que a empresa é eminentemente familiar.


Recurso especial improvido.


(REsp 1024394/RS, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe 14/3/2008)

8. Diante do exposto, conheço em parte do recurso e, na extensão, dou-lhe provimento para restabelecer a decisão da MMª Juíza de piso (fls. 43/45), mediante a qual foi declarada a nulidade da penhora realizada nos autos da execução. ...» (Min. Luis Felipe Salomão).»

Doc. LegJur (117.7174.0000.4100) - Íntegra: Click aqui


Referências:
Execução (Jurisprudência)
Penhora (Jurisprudência)
Bem de família (v. Penhora ) (Jurisprudência)
Imóvel valioso (v. Impenhorabilidade ) (Jurisprudência)
Bairro nobre (v. Impenhorabilidade ) (Jurisprudência)
Lei 8.009/1990, art. 1º (Legislação)
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