Jurisprudência Selecionada

Doc. LEGJUR 484.4510.8442.3159

1 - TJRJ APELAÇÃO CRIMINAL. LEI 9.605/1998, art. 29, §1º, III, POR 21 VEZES, NA FORMA DO CODIGO PENAL, art. 70. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO REQUERENDO A NULIDADE DO PROCESSO PELA ALEGADA VIOLAÇÃO AO DOMICÍLIO. SUBSIDIARIAMENTE, REQUER A CONCESSÃO DO PERDÃO JUDICIAL, NOS TERMOS DO art. 29, § 2º DA LEI 9.605/98. EM CASO DE MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO, PUGNA PELO RECONHECIMENTO DA ATENUANTE DO CP, art. 65, III, «D, COM A SUPERAÇÃO DA SÚMULA 231/STJ E O RECONHECIMENTO DO CRIME ÚNICO.

A preliminar de nulidade requerida será analisada em conjunto com o mérito, e, neste passo, analisando o conteúdo dos autos, o pleito defensivo absolutório não merece prosperar. As provas produzidas ao longo da instrução processual comprovaram a prática do crime pelo qual condenado o apelante. A materialidade e autoria delitivas caracterizam-se pelo termo circunstanciado (e-doc. 05), auto de apreensão que especificou 16 coleiros, 2 trinca ferros, 2 tico ticos e 1 patativa, acondicionados em 23 gaiolas (e-doc. 11), auto de entrega (e-doc. 14), laudo de exame de material que atestou se tratar de 21 pássaros, sendo 16 coleirinhos, 2 trinca ferros, 2 tico ticos e 1 patativa, presos em 20 gaiolas, e três gaiolas vazias (e-doc. 18), pelo documento do IBAMA que atestou que os pássaros apreendidos são nativos do Brasil (e-doc. 81), e a prova oral produzida em juízo sob o crivo do contraditório. Extrai-se dos autos que no dia 04/12/2018, por volta das 20h, na residência localizada na Rua F, 94, bairro Jardim Alegria, no município de Resende, policiais militares receberam informações de que no endereço mencionado havia vários pássaros silvestres em cativeiro, razão pela qual foram ao local averiguar a veracidade. Ao chegarem, foi possível visualizar a existência de várias gaiolas, e o portão que se encontrava entreaberto, permitiu que os agentes observassem a existência de vários pássaros silvestres em diferentes gaiolas, todos sem água, sem alimentação e com sinais de maus-tratos. A mãe do acusado, Carmencita Beatriz Motta, que estava perto da residência, foi em direção aos agentes e perguntou se estava acontecendo algo, e os policiais disseram que na residência dela havia muita ave silvestre, tendo ela respondido que pertencia a seu filho, ora apelante. Os agentes então perguntaram se o filho dela tinha registro no IBAMA, e mãe do recorrente disse que não, tendo ainda autorizado a entrada dos policiais em sua residência. Em juízo, os policiais narraram o ocorrido, ratificando suas declarações em sede inquisitorial, havendo pequena discordância em relação à denúncia anônima ser sobre tráfico de drogas ou sobre a existência de animais silvestres no local. O acusado em seu interrogatório disse que a acusação é verdadeira, e que manteve 21 passarinhos de forma irregular em sua casa e que no dia estava trabalhando, cortando grama e chegou em casa por volta das 17:30 h, foi à padaria e deixou o portão aberto e, ao voltar, encontrou quatro policiais em sua casa tirando as gaiolas para fora, que lhe disseram sobre ser uma denúncia de drogas. Narrou o acusado em sede judicial que os policiais lhe perguntaram se podiam soltar os passarinhos para sobreviverem, e o acusado disse que não, porque já tinha muito tempo e que conseguiu os pássaros por troca em vídeo game, que não tinham anilha do IBAMA, e que a família toda tinha o costume de criar passarinho, que sabia que não podia andar na rua com passarinho, mas achava que podia ter em casa passarinho, mas hoje sabe que não pode ter passarinho em casa. Posto isto, a questão dos autos referente à nulidade aventada pela Defesa nos remete ao exame quanto à validade do material obtido como meio de prova, em especial sob o viés das teses paradigmáticas firmadas pelo STJ e STF, que propuseram novas balizas para o ingresso no domicílio de suspeitos de infrações. Com efeito, o ordenamento jurídico pátrio determina que a regra é a inviolabilidade do domicílio e que a busca, seja ela pessoal ou domiciliar, exige fundada suspeita autorizando-a, ex vi dos arts. 5º, XI, da CF/88 e 240, § 1º do CPP. Sob tal prisma, o Supremo Tribunal Federal já havia adotado, no julgamento com repercussão geral do RE Acórdão/STF (Tema 280 - Tribunal Pleno, Rel. Ministro Gilmar Mendes, em 5/11/2015), o entendimento de que: «A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito (...)". Em 02/03/2021, a Sexta Turma do STJ, no emblemático julgamento do HC 598051/SP, adotou criterioso posicionamento, disciplinando que o flagrante delito somente poderia excetuar a garantia de inviolabilidade do domicílio quando se traduzir em verdadeira urgência, salientando que «o mandado é o caminho mais acertado a tomar". Não se desconhece que, no dia-dia das diligências policiais, muitas vezes os agentes da lei se veem diante de situações que reclamam uma atuação rápida, para coibir a prática de crimes ou colher provas. Em tais hipóteses, a Constituição autoriza o ingresso em um domicílio mesmo sem a mencionada autorização judicial. In casu, os policiais partiram de uma denúncia anônima informando sobre a existência de aves silvestres mantidas em cativeiro e, ao chegarem ao local, foi possível visualizar os pássaros em gaiolas, em condições precárias a corroborar a existência de motivos robustos para a entrada. Outrossim, ao chegar ao local, a mãe do apelante, após ser questionada pelos policiais e dizer que os pássaros eram do seu filho, autorizou a entrada dos agentes no local. Diante do contexto, o apelante, que chegou em seguida, confessou em sede extrajudicial os fatos e, é crível, que a entrada dos policiais foi franqueada pela mãe do recorrente em sua residência. Portanto, deve ser rejeitada a preliminar de nulidade. No mais, não merece acolhimento o pleito absolutório, diante dos elementos mencionados acima. Desta forma, presentes os elementos necessários à configuração para o tipo penal previsto no Lei 9.605/1998, art. 29, §1º, III, por 21 vezes, na forma do CP, art. 70. Exame da dosimetria. Na primeira fase, a pena base foi mantida no patamar mínimo legal diante da ausência de circunstâncias judiciais negativas e, na segunda fase, apesar da confissão do acusado, nos termos da Súmula 231/STJ esta não tem o poder de conduzir a pena aquém do mínimo legal, e, diante da ausência de causas de aumento e diminuição de pena na terceira fase, a reprimenda se estabelece em 06 meses de detenção e 10 dias-multa. Neste ponto, escorreitamente, o juízo de piso entendeu ser «(...) incabível o benefício contido no § 2º do art. 29 da Lei 9.60511998, tendo em vista a elevada reprovabilidade da conduta em virtude do considerável número de pássaros e do histórico criminal do réu". De fato, o acusado, em que pese seu depoimento em juízo, tinha plena ciência da conduta delituosa, eis que tinha sido detido antes, pelo mesmo crime nos autos do processo 0011731-62.2014.8.19.0045. Outrossim, correta a incidência do CP, art. 70, visto que, mediante uma só ação, o acusado praticou no crime previsto no Lei 9.6051/998, art. 29, §1º, III, por 21 vezes. Assim, aplicada a fração de 1/2, a resposta estatal repousa em 09 meses de detenção e 15 dias-multa, no valor mínimo legal. Portanto, diante do expressivo número de aves silvestres nativas apreendidas, inviável o reconhecimento de crime único, como requer a defesa. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.... ()

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