Jurisprudência Selecionada

Doc. LEGJUR 915.0984.8257.8145

1 - TJRJ Apelação criminal defensiva. Condenação pelos crimes de lesão corporal e ameaça, em concurso material, praticados no contexto de violência doméstica. Recurso defensivo que almeja a absolvição, por alegada insuficiência probatória ou por excludente de ilicitude da legítima defesa. Subsidiariamente, requer a desclassificação para o crime de lesão corporal culposa, a exclusão da participação de grupo reflexivo, além da cassação da condenação do Réu ao pagamento de indenização por danos morais ou, ao menos, a redução do quantum arbitrado. Mérito que se resolve pontualmente em favor do Recorrente. Positivação da materialidade e autoria. Prova inequívoca de que no dia 13.06.2021, o Recorrente, após desentendimento com a vítima, sua esposa, ofendeu a sua integridade, com socos chutes e tentativa de esganadura, e, no dia 22.06.2021, ameaçou agredir a vítima. Instrução revelando que os envolvidos discutiram na frente de um amigo e, ao chegarem à casa, o réu agrediu a vítima porque não gostou que a ofendida relatou para eles que estava faltando alimento dentro de casa. No dia 22.06.2021, após discussão acalorada, o réu ameaçou agredi-la novamente. Recorrente que exerceu o direito ao silêncio em juízo, mas, na DP, disse que, no dia 13.06.2021, ambos «se agrediram mutuamente, em virtude de infidelidade conjugal por parte da mesma e admitiu ter ameaçado a vítima no dia 22.06.2021, ao dizer «que daria um soco na mesma, pois havia acabado de presenciar a mesma saindo do carro de outro homem". Palavra da mulher-ofendida que, em crimes praticados em âmbito doméstico, tende a assumir caráter probatório destacado, sobretudo quando «a narrativa da Vítima é coerente, com estrutura de tempo e espaço, compatível com as lesões apontadas no laudo técnico (TJRJ). Laudo técnico-pericial que ratifica as lesões imputadas, causadas por ação contundente, compatíveis com o episódio narrado pela Vítima. Tipo penal do CP, art. 129 que encerra conduta voltada à mácula da integridade corporal de outrem, desde que destituída de animus necandi, sendo definido pela doutrina como «toda e qualquer ofensa ocasionada à normalidade funcional do corpo ou organismo humano, seja do ponto de vista anatômico, seja do ponto de vista fisiológico ou psíquico. Tese de legítima defesa que se mostra incabível. Firme orientação da jurisprudência no sentido de atribuir à Defesa o ônus de comprovar a incidência de qualquer hipótese que exclua a tipicidade ou a concreção de eventual tipo permissivo ou de exculpação (CPP, art. 156), o que não ocorreu. Crime de ameaça igualmente configurado. Tipo legal que encerra a definição de «crime formal e instantâneo, que se consuma independentemente do resultado lesivo objetivado pelo agente, pelo que «basta para a sua caracterização que a ameaça seja idônea e séria, com vontade livre e consciência de incutir temor na vítima, sendo irrelevante o estado emocional desequilibrado no momento dos fatos". Injusto frente ao qual «não se exige qualquer elemento subjetivo específico (Nucci). Presença inquestionável do dolo da conduta do Réu, a qual, em tema de tipo penal congruente, se interliga com a manifestação volitiva natural, com o desejo final do agir, traduzindo-se pela simples consciência e vontade de realizar os elementos objetivos previstos, em abstrato, no modelo legal incriminador, ciente de que o mesmo «não fica excluído quando o sujeito ativo procede sem ânimo calmo e refletido, «porquanto a exaltação de ânimo não impede o reconhecimento do crime de ameaça, nos termos do CP, art. 28, I, o qual assevera que a emoção não é causa de exclusão do crime (TJERJ). Concreção dos injustos imputados, mediante reunião de todos os seus elementos constitutivos, unidos sob o signo do CP, art. 69. Juízos de condenação e tipicidade irreparáveis. Dosimetria sem impugnação específica por parte do recurso, com prestígio do quantitativo estabilizado na sentença, em patamar mínimo e em regime aberto. Sursis penal, pelo prazo de 02 (dois) anos (CP, art. 77), que se mantém, nos exatos termos declinados pela instância de base. Imposição de frequência a grupo reflexivo que, exibindo pertinência temática concreta, pode ser estabelecido como condição judicial do sursis (CP, art. 79). Hipótese dos autos que viabiliza a reparação por danos morais, na linha da orientação firmada pelo STJ, submetido à sistemática do recurso repetitivo, com a edição da tese 983: «nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia, e independentemente de instrução probatória". Inexistência de parâmetros rígidos e apriorísticos para se arbitrar a indenização por dano moral, devendo ser levados em conta critérios de proporcionalidade e razoabilidade, sem perder de vista as condições econômicas do réu e a extensão do dano suportado pela vítima, a fim de se calibrar um valor que não chegue a caracteriza um sacrifício da própria subsistência do acusado e tampouco a insuficiência de seu caráter punitivo. Vítima que, na condição de mulher, suportou relevante transtorno e sofrimento derivados da própria conduta praticada pelo réu, em grau suficiente para extrapolar o mero aborrecimento e causar lesão à sua dignidade, configurando danos morais. Quantum arbitrado (cinco salários-mínimos) que se mostrou excessivo. Ausência de informação sobre a renda mensal auferida pelo réu (cuja comprovação fica a cargo da Acusação), o qual, em sede policial, declarou exercer a função de cozinheiro. Indenização que se reduz para o quantum de R$ 1.000,00 (mil reais), o qual caracteriza valor mínimo para atender ao seu caráter reparador, sem olvidar a capacidade econômica do acusado. Pleito de isenção das custas processuais que se mostra inviável, por se tratar de questão a ser resolvida no processo de execução (Súmula 74/TJERJ). Parcial provimento do recurso defensivo, a fim de reduzir o quantum fixado a título de indenização por danos morais em favor da Vítima para o valor de R$ 1.000,00 (mil reais).

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