Jurisprudência em Destaque

TJRJ. 5ª Ccrim. Trânsito. Teste de alcoolemia. Bafômetro. Lei Seca. Constrangimento ilegal ao argumento de inépcia da denúncia, por não ter descrito uma conduta que importasse na produção de um efetivo perigo à segurança viária. Considerações do Des. Cairo Italo França David sobre o tema. CTB, art. 306. Dec. 6.488 de 19/06/2008.

Postado por Emilio Sabatovski em 21/12/2011
«... Cuida-se de remédio heróico impetrado em favor da paciente contra ato do Juízo da Quarta Vara Criminal da Comarca de Niterói, que recebeu a denúncia proposta pelo Ministério Público, por infringência ao art. 306, da Lei 9.503/97.

Na hipótese, verifica-se da leitura da peça exordial de fls. 11/12 da peça 00002, que em momento algum a Promotora de Justiça descreve algum comportamento efetivo da paciente que importasse na produção de um risco não permitido, não narrando assim qualquer violação à segurança viária.

É de curial conhecimento que o Código de Trânsito optou por transformar a contravenção da condução de veículo automotor sem habilitação, em crime. Em contrapartida, passou a exigir que tal conduta produzisse perigo.

Desse modo, no que concerne à condução de veículo com concentração de álcool superior ao limite mínimo permitido, não se pode dar tratamento diverso, consagrando-se a punição, mesmo nos casos em que o condutor esteja agindo de modo normal, sem produzir quaisquer riscos à segurança viária. Isto acabaria por ferir o princípio da lesividade, sendo criada uma infração penal onde não se atingiria, em tese, o bem jurídico tutelado pela norma penal.

Também devem ser tecidas considerações ao modo como tem sido realizada a chamada operação lei seca. Alguns agentes do DETRAN acompanhados de Policiais Militares cercam uma via e param, de modo aleatório, alguns motoristas, até suprirem, segundo nos informado, a cota de cento e oitenta (180) veículos por operação.

Quem é parado, independentemente de estar dirigindo de modo anormal, ou de exalar odor de bebida alcoólica, ou mesmo que esteja com os filhos em sua companhia, ou vindo, por exemplo, de um velório ou de uma visita hospitalar, é obrigado a realizar o exame etílico.

Todos sabemos que só se pode compelir alguém a submeter-se a uma verificação pessoal, se houver fundada suspeita de que esteja cometendo alguma infração penal. Também é de todos conhecido o princípio de que ninguém está obrigado a fazer prova contra si. Isto se extrai da nossa Constituição, que preserva o princípio da não culpabilidade, propiciando aos acusados o direito de permanecer em silêncio ou até de faltar com a verdade, quando interrogados.

O Decreto 6.488 de 19/06/2008, não prevê como isto será feito, mas os coordenadores da operação Lei Seca, optam por uma atuação que fere a nossa Lei Maior.

Também são violadas as normas de vários poderes e instituições, de modo que um inferior hierárquico pode obrigar um superior a submeter-se a uma busca pessoal e a realizar um exame pericial destinado a apurar um crime contra esse superior, que só pode ser investigado por outras categorias.

Um Desembargador do Tribunal de Justiça que só pode ser processado e julgado perante o Superior Tribunal de Justiça, vê-se compelido por autoridades administrativas e por policiais militares a fazer o teste do bafômetro, e pode ser conduzido à Delegacia Policial, por agentes sem autoridade para isto, o que é um absurdo.

A esse respeito, o Professor PAULO RANGEL, tece com propriedade o comentário seguinte:


«Perceba que quem irá atestar a possível embriaguez ao volante «é o guarda da esquina»., ou seja, uma pessoa despreparada, sem qualificação profissional para tal mister. Trata-se do desespero do legislador em querer diminuir a violência do trânsito, através da violência persecutória da lei.».(1)


▪ (1) RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 16ª edição, revista, ampliada e atualizada. Editora Lúmen Júris, Rio de Janeiro, 2009, p. 29.

Mais à frente, ele faz referência à palavra do Professor ANTÔNIO MAGALHÃES GOMES FILHO, no que tange à exclusão das provas obtidas com desrespeito aos direitos da dignidade da pessoa humana, da não auto-incriminação e da liberdade pessoal.


«O que se deve contestar em relação a essas intervenções, ainda que mínimas, é a violação do direito à não incriminação e à liberdade pessoal, pois, se ninguém pode ser obrigado a declarar-se culpado, também deve ter assegurado o seu direito a não fornecer provas incriminadoras contra si mesmo. O direito à prova não vai ao ponto de conferir a uma das partes no processo prerrogativas sobre o próprio corpo e a liberdade de escolha da outra no âmbito criminal; diante da presunção de inocência, não se pode constranger o acusado ao fornecimento dessas provas, nem de sua negativa inferir a veracidade do fato. (Direito à Prova no Processo Penal. São Paulo: RT, 1997, p. 119).».(2)


▪ (2) Idem, p. 30.

Destaco jurisprudência deste E. Tribunal:


«TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO SÉTIMA CÂMARA CRIMINAL. HABEAS CORPUS Nº 0028691-73.2010.8.19.0000. IMPETRANTE: DRA. TEREZA MARIA DE SOUZA OLIVEIRA – DEFENSORA PÚBLICA. PACIENTE: PAULA PRADA FONSECA ROTHIER. AUT. COATORA: 25ª VARA CRIMINAL DA CAPITAL. RELATORA: DES. ELIZABETH GREGORY. HABEAS CORPUS – ARTIGO 306 DO CTB – DENÚNCIA – INEPTA – ATIPICIDADE – TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL – CONSTRANGIMENTO ILEGAL – CONCESSÃO DA ORDEM – UNÂNIME. Paciente denunciada por infração comportamental ao artigo 306 do CTB, por isso que parada por uma blitz da denominada «Lei Seca». foi submetida ao teste com o etilômetro, ficando comprovado que conduzia veículo automotor na via pública estando com concentração de álcool por litro de sangue de 0,35 mg/L. Objetiva o presente «writ». seja deferida a ordem para extinguir o processo nº 010478- 97.2010.8.19.0001, nos termos do artigo 648, inciso I do CPP. A denúncia lavrada nestes termos, com a devida vênia do seu subscritor, é absolutamente inepta por não descrever o comportamento fático caracterizador da denominada direção anormal, sendo tal descrição elemento indispensável para que se possa falar em ofensa ao bem jurídico penalmente tutelado, qual seja, a segurança viária. Assim, é evidente que para a existência da conduta típica não é apenas necessário o encontro de 6 decigramas de álcool por litro de sangue do motorista, havendo necessidade, que o motorista esteja ao conduzir o veículo expondo a dano potencial a incolumidade de outrem. O recebimento da inicial, tal qual concebida na presente hipótese, constitui flagrante constrangimento ilegal. Ordem que se concede para trancar a ação penal.».


«TRIBUNAL DE JUSTIÇA. QUINTA CÂMARA CRIMINAL. HABEAS CORPUS: 0001544-72.2010.8.19.0000. IMPETRANTE 1: DRA. MARIA DE LOURDES FLINTZ MARQUES. IMPETRANTE 2: DR. LUIZ ALBERTO CAMARGO PEDROSO. PACIENTE: HUMBERTO FELIPE BARROS DE FIGUEIREDO. AUT. COATORA: MM. JUIZ DE DIREITO DA 11ª VARA CRIMINAL DA CAPITAL. RELATOR: DES. ADILSON VIEIRA MACABU. Embriaguez ao Volante. Código de Trânsito Brasileiro. Paciente encaminhado para blitz da «Lei Seca». e submetido ao teste de alcoolemia, onde se comprovou que ele conduzia veículo automotor em via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue superior a 6 decigramas. Denúncia inepta, porquanto não expôs de forma clara e objetiva o comportamento fático caracterizador de direção anormal, em ofensa à segurança viária, o que permitiria ao acusado o exercício pleno do direito de defesa constitucionalmente assegurado. Não basta, para a caracterização do delito de embriaguez ao volante, estar o agente apenas dirigindo sob influência de álcool, o que constitui, na forma como se encontra a imputação, tão-só, uma infração administrativa. Trancamento da ação penal. Cabimento. Medida excepcional que somente se viabiliza quando, de plano, fica evidenciada a falta de justa causa para seu prosseguimento, em razão da ausência de fato típico imputado ao acusado ou de elementos que emprestem alguma base à investigação. Configurado o constrangimento ilegal de que tratam os arts. 5º, LXVIII, da CF/88 e 647, do diploma processual penal. Concessão do writ.».

Examinando as informações da petição inicial em confronto com a documentação acostada aos presentes autos, conclui-se que assiste razão à impetrante.

Estamos vivendo um momento crucial, pós 11 de setembro, onde se defende até de forma veemente a possibilidade de desrespeitar determinados direitos do cidadão em prol da apuração de algum crime e aplicação da lei punitiva.

Muitos passaram a sustentar o que se denomina direito penal do inimigo, que considera que aquele que comete um delito, deixando de obedecer às regras da vida em sociedade, não merece ser tratado de modo igual aos demais cidadãos.

Isto contraria os princípios básicos consagrados nas Constituições de vários países e na Declaração de Direitos do Homem. A lei penal há que ser aplicada seguindo regras que garantam ao acusado exercer de forma plena a sua defesa.

A forma como vem sendo executada a operação lei seca, vai contra tudo isto e obriga a quem é parado, a submeter-se à produção de uma prova contra si, prova esta que pode incriminá-lo e decidir, previamente, a sua condenação.

Penso que seja possível assegurar-se a segurança viária sem estes exageros e é necessário que todos os cidadãos tenham isto em mente e que não se submetam a determinadas imposições que ferem de modo agudo a Constituição da República.

Na hipótese vertente, como já afirmado supra, não se demonstrou que a condutora do veículo estivesse realizando um comportamento que colocasse em risco a segurança do trânsito, e, pior que isto, a única «prova». apresentada contra ela e que permitiu o oferecimento da denúncia, foi uma «prova». obtida por meio arbitrário e atentatório aos postulados constitucionais.

Por tais motivos, posiciono-me no sentido da concessão da ordem, com o trancamento definitivo da presente ação penal.

Prequestionamento rejeitado, tendo em vista que não reputo violado qualquer dispositivo constitucional ou infraconstitucional

É como voto. ...» (Des. Cairo Italo França David).»

Doc. LegJur (118.5303.4000.1100) - Íntegra: Click aqui


Referências:
Trânsito (Jurisprudência)
Teste de alcoolemia (v. Trânsito ) (Jurisprudência)
Bafômetro (v. Trânsito ) (Jurisprudência)
Lei Seca (v. Trânsito ) (Jurisprudência)
Inépcia (v. Denúncia ) (Jurisprudência)
Denúncia (Jurisprudência)
CTB, art. 306
(Legislação)
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