Jurisprudência em Destaque

STF. Pleno. Recurso extraordinário. Repercussão geral reconhecida. Tributário. Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS. Inclusão do montante do imposto em sua própria base de cálculo. Princípio da vedação ao bis in idem. Repercussão geral reconhecida. Considerações do Min. Gilmar Mendes sobre o tema. Precedentes do STF. Lei Compl. 87/1996, art. 13, § 5º. Dec.-lei 406/1968, art. 2º, § 7º. CF/88, arts. 102, III, «a», 146, III, «a», 150, I, III e IV e 155, II. CPC, art. 543-A. Emenda Const. 33/2001.

Postado por Emilio Sabatovski em 09/11/2012
«... II - DO MÉTODO DE CÁLCULO «POR DENTRO» DO ICMS

Discute-se, no presente recurso extraordinário, a possibilidade de o valor destacado do ICMS integrar a base de cálculo do referido imposto.

Em suma, o recorrente sustenta que deve figurar na base de cálculo do ICMS somente o «valor da mercadoria», argumentando que a incidência da alíquota sobre o valor do negócio acrescido do valor do ICMS caracteriza uma «tributação em cascata» ou tributação «por dentro», ao arrepio da Constituição Federal.

Em virtude da dinâmica da não cumulatividade do ICMS, a práxis mercantil destaca, nas notas fiscais relativas à circulação de mercadoria, o valor da venda do produto e o valor que o contribuinte direto deve pagar ao Fisco a título de ICMS. A soma das quantias corresponde à operação mercantil.

Primeiramente, observo que a inclusão do valor destacado do tributo em sua própria base de cálculo não é um fenômeno isolado no sistema tributário pátrio.

Sobre o tema, confira-se estudo de Everardo Maciel e José Antônio Schontag:


«Nos regimes de tributação ad valorem, são admitidas diversas formas de incidência de alíquotas. Basicamente, elas podem ser grupadas em três categorias: proporcionais, «por dentro» e «por fora». A opção por uma delas decorrerá exclusivamente e sempre da legislação de regência, informada pela técnica de tributação mais adequada.


Na incidência proporcional, o tributo devido é calculado pela aplicação direta da alíquota sobre a base de cálculo. São exemplos dessa hipótese o IPI e o imposto de importação. No IPI, a base de cálculo definida no CTN é o valor da operação de que decorrer a saída da mercadoria, sem que se faça qualquer menção à inclusão do próprio imposto em sua base de cálculo. Por conseguinte, um aumento de 10% na alíquota implica aumento de 10% no imposto devido.


Na incidência por dentro, o tributo goza da peculiar condição de integrar sua própria base de cálculo. É o caso do ICMS, conforme preceituam o art. 155, § 2º, inciso XII, alínea «i», da Constituição e o art. 13, § 1º, da Lei Complementar 87. Ainda que possa parecer estranho para leigos, aumento de 10% na alíquota do ICMS significa aumento de 11,11% no imposto devido.


A base de cálculo do ICMS, na conformidade com a Lei Complementar 87, é o valor da operação de que decorrer a saída da mercadoria. Portanto, no caso de saídas de um estabelecimento industrial o ICMS e o IPI têm a mesma base de cálculo, observadas as seguintes peculiaridades quanto à tributação reflexa: o IPI incide sobre o ICMS, pois de acordo com o texto constitucional esse imposto estadual é parte integrante do valor da operação; por sua vez, o ICMS, ressalvados as situações previstas no art. 155, § 2, XI, da Constituição, também incide sobre o AIPI.


Constituem outros exemplos da incidência por dentro: a contribuição social incidente sobre a folha de salário e a devida pelo empregado, previstas, respectivamente, no inciso I, a, e no inciso II do art. 195 da Constituição. No primeiro caso, a contribuição ao incidir sobre a folha de salário incide, em consequência, sobre a contribuição do empregado; no outro, a contribuição do empregado ao incidir sobre o valor bruto da remuneração incide, por conseguinte, sobre ela mesma.


Inclusões ou exclusões na incidência por dentro, tal como ocorre no imposto de renda, são as previstas na legislação aplicável, como é o caso da expressa exclusão da incidência do imposto sobre a contribuição do empregado.


Por fim, no tocante à incidência por fora, o tributo é excluído de sua base de cálculo previamente à determinação do montante devido. Era o que acontecia com a CSLL, desde sua instituição até o advento da Lei 9.316, de 1996. O mesmo aumento de 10% na alíquota, nessa hipótese, resultaria em aumento de 9,09% do tributo devido.


A ampla diversidade dos exemplos apontados serve apenas para demonstrar que não é inusitado, no modelo tributário brasileiro, um tributo incluir, em sua base de cálculo, ele próprio ou outro tributo. Houvesse algum impedimento de incidência reflexa, o ICMS e as contribuições sociais deveriam ser excluídos da base de cálculo do IPI, o imposto de importação e as contribuições sociais da base de cálculo do ICMS, as contribuições sociais da base de cálculo do ISS e delas mesmas, etc. Ao fim e ao cabo, haveria uma verdadeira subversão do sistema tributário brasileiro sem motivação razoável». (MACIEL, Everardo & SCHONTAG, José Antônio. «O ICMS E A BASE DE CÁLCULO DA COFINS», Valor Econômico, edição de 2.8.2002)

No que diz respeito ao cálculo «por dentro» do ICMS, o tema foi objeto de amplo debate nesta Corte, no julgamento do RE 212.209, Red. para o acórdão Min. Nelson Jobim, DJ 14.2.2003, ementado nos seguintes termos:


«Constitucional. Tributário. Base de cálculo do ICMS: inclusão no valor da operação ou da prestação de serviço somado ao próprio tributo. Constitucionalidade. Recurso desprovido».

Na sessão de 23/06/1999, o Plenário do STF, vencido apenas o Min. Marco Aurélio, pacificou o entendimento no sentido de que a quantia referente ao ICMS faz parte do «conjunto que representa a viabilização jurídica da operação» e, por isso, integra sua própria base de cálculo.

Em outras palavras, a base de cálculo do ICMS, definida como o valor da operação da circulação de mercadorias (art. 155, II, da CF/1988, c/ c arts. 2º, I, e 8º, I, da LC 87/1996), inclui o próprio montante do ICMS incidente, pois ele faz parte da importância paga pelo comprador e recebida pelo vendedor na operação.

Por ocasião do julgamento do mencionado RE 212.209, acompanhando a divergência inaugurada pelo Ministro Nelson Jobim, o Ministro Moreira Alves ressaltou a necessidade de inclusão destacada do montante próprio do ICMS na sua base de cálculo, tendo em vista que a sistemática de compensações deste tributo lhe confere mecânica diversa de imposto sobre valor agregado. Oportunamente, transcrevo suas precisas considerações:


«Se o ICMS não for um imposto por dentro, jamais chegaremos ao que se deve chegar com a observância do princípio da não-cumulatividade, com o seu jogo de compensações. Ademais, o fato gerador é que decorre da Constituição, mas é a lei complementar que impõe a base de cálculo, e ela só seria inconstitucional, nesse ponto, se estabelecer base de cálculo que não se coadune com o fato gerador, o que não ocorre aqui, em que a base de cálculo é a única que se compatibiliza com o próprio imposto, inclusive para a observância da não-cumulatividade.»

Merece destaque, ainda, o voto do Min. Ilmar Galvão, que, mais uma vez, foi bastante elucidativo quanto à possibilidade de incidência «por dentro» de tributos:


«Sr. Presidente, não é a primeira vez que esta questão é discutida no Supremo Tribunal Federal. Já tive ocasião de relatar casos análogos, não só aqui mas também no STJ. Esse, aliás, não poderia ser um assunto novo, se o DL nº 406 está em vigor há trinta anos. Não seria somente agora que o fenômeno da superposição do próprio ICMS haveria de ser identificado.


Vale dizer que, se a tese ora exposta neste recurso viesse a prevalecer, teríamos, a partir de agora, na prática, um novo imposto. Trinta anos de erro no cálculo do tributo.


Em votos anteriores, tenho assinalado que o sistema tributário brasileiro não repele a incidência de tributo sobre tributo. Não há norma constitucional ou legal que vede a presença, na formação da base de cálculo de qualquer imposto, de parcela resultante do mesmo ou de outro tributo, salvo a exceção, que é a única, do inciso XI do parágrafo 2º do art. 155 da Constituição, onde está disposto que o ICMS não compreenderá, em sua base de cálculo, o montante do imposto sobre produtos industrializados, quando a operação realizada entre contribuintes e relativa a produto destinado à industrialização ou à comercialização, configure fato gerador dos dois impostos.


(...)


Se, na verdade, não pudesse haver tributo embutido na base de cálculo de um outro tributo, então não teríamos que considerar apenas o ICMS, mas todos os outros. O problema se mostra relativamente à contribuição para o IAA e para o IBC, não havendo como afastar essas contribuições da base de cálculo do ICMS.


Por que, então, o problema em torno do ICMS sobre ICMS e não do ICMS sobre o IPI, sobre as contribuições (COFINS, PIS)? Na verdade, o preço da mercadoria, que serve de base de cálculo ao ICMS, é formado de uma série de fatores: o custo; as despesas com aluguel, empregados, energia elétrica; o lucro; e, obviamente, o imposto pago anteriormente. O problema, diria que é até de ordem pragmática, em face da dificuldade, quase incontornável, de eliminar-se da base de cálculo de um tributo tudo o que decorreu de tributação.


O inciso do art. 34 do ADCT, sobre energia elétrica, é a prova do afirmado, ao estabelecer que o imposto é cobrado sobre o valor da operação final. É assim que o ICMS incide.


Peço vênia, portanto, para não conhecer do recurso.» (Voto do Min. Ilmar Galvão no RE 212.209/RS, Red. p/ o acórdão Min. Nelson Jobim, DJ 14.2.2003).

Destarte, assentou-se de maneira inequívoca que a Constituição Federal não torna imune o montante referente ao ICMS recebido pelo contribuinte de jure e repassado pelo contribuinte de facto, pois constitui parte do valor final da operação de transferência de mercadoria. Nesse sentido colaciono os seguintes julgados desta Suprema Corte: AI-AgR 633.911, Rel. Min. Eros Grau, Segunda Turma, DJe, 1.2.2008; RE-AgR 358.911, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJ 4.7.2006; AI-AgR 522.777, Rel. Min. Carlos Veiloso, Segunda Turma, DJe 16.12.2005; AI-AgR 397.743, Real. Min. Ellen Grade, Segunda Turma, DJ 18.2.2005; AI-AgR 413.753, Rel. Min. Eros Grau, Primeira Turma, DJ 15.10.2004, RE-AgR 236.409, Rel. Min. Maurício Corrêa, Segunda Turma, DJ 2.3.2001, RE 209.393, Rel. Min. Moreira Alves, Primeira Turma, DJ 9.6.2000.

Consigne-se, por fim, que a Emenda Constitucional 33, de 2001, inseriu a alínea «i» no inciso XII do § 2º do art. 155 da Constituição Federal, para fazer constar que cabe à lei complementar «fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço».

Ora, se o texto dispõe que o ICMS deve ser calculado com o montante do imposto inserido em sua própria base de cálculo também na importação de bens, naturalmente a interpretação que há de ser feita é que o imposto já era calculado dessa forma em relação às operações internas.

Com a alteração constitucional a Lei Complementar ficou autorizada a dar tratamento isonômico na determinação da base de cálculo entre as operações ou prestações internas com as importações do exterior, de modo que o ICMS será calculado «por dentro» em ambos os casos.

Ademais, diz o § 1º do art. 13 da Lei Complementar 87, de 1996, que integra a base de cálculo do ICMS o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle.

Enfim, a incidência da alíquota sob a forma denominada ICMS «por dentro» é compatível com a Constituição brasileira, motivo pelo qual julgo constitucional o art. 33 da Lei Estadual Paulista 6.374/89, tendo em vista a inexistência, na Lei Maior, de qualquer óbice à inclusão do montante do ICMS na sua própria base de cálculo. ...» (Min. Gilmar Mendes).»

Doc. LegJur (127.6182.4000.0800) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
▪ Recurso extraordinário (Jurisprudência)
▪ Repercussão geral (v. ▪ Recurso extraordinário) (Jurisprudência)
▪ ICMS (v. ▪ Tributário) (Jurisprudência)
▪ Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS (v. ▪ Tributário) (Jurisprudência)
▪ Base de cálculo (v. ▪ ICMS) (Jurisprudência)
▪ Princípio da vedação ao bis in idem (v. ▪ ICMS) (Jurisprudência)
(Legislação)
(Legislação)
▪ CF/88, art. 102, III, «a»
▪ CF/88, art. 146, III, «a»
▪ CF/88, art. 150, I, III e IV
▪ CF/88, art. 155, II
▪ CPC, art. 543-A
(Legislação)
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