Jurisprudência Selecionada

Doc. LEGJUR 398.0353.0774.7069

1 - TJRJ APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. ART. 217-A §1º C/C 226, IV, «A, AMBOS DO CP. RECURSO DO APELANTE L. QUE REQUER, PRELIMINARMENTE, A NULIDADE DO INTERROGATÓRIO E DO PROCESSO DESDE A AIJ. NO MÉRITO, POSTULA A ABSOLVIÇÃO POR FRAGILIDADE PROBATÓRIA. SUBSIDIARIAMENTE, REQUER A DESCLASSIFICAÇÃO PARA A CONDUTA PREVISTA NO CP, art. 215. JÁ O RECORRENTE H. PUGNA PELA ABVSOLVIÇÃO, POR FALTA DE PROVAS, E O AFASTAMENTO DA CAUSA DE AUMENTO PREVISTA NO art. 226, IV, A DO CP. SUBSIDIARIAMENTE, REQUER A DESCLASSIFICAÇÃO PARA A CONDUTA PREVISTA NO CP, art. 215-A

Improcede a alegação de nulidade do interrogatório realizado por videoconferência. Analisando a ata de julgamento (doc. 299), vê-se que não restou consignado nenhuma insurgência formal por parte das defesas a respeito de qualquer nulidade ligada ao fato ora questionado. A oitiva por videoconferência não acarreta nulidade, mesmo que sem anuência prévia das partes, se dela não houver manifestação consignada em ata, restando preclusa qualquer insurgência, porquanto em momento processual inoportuno. Ademais, nos termos do CPP, art. 563, «nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa, sendo que o interrogatório por videoconferência não produziu, por si só, prejuízo aos recorrentes, até porque os fundamentos do recurso não apontaram elementos concretos que demonstrem a ausência de comunicação reservada prévia entre os recorrentes e os Advogados de Defesa, ou sua essencialidade à comprovação de alguma tese defensiva. Ademais, a realização de audiências por videoconferência está normatizada pela Resolução 465/2022 do CNJ e, no âmbito deste Tribunal, pelo Ato Normativo Conjunto 02/2023. Tais normatizações preveem a possibilidade dos réus ou das testemunhas arroladas para a audiência de instrução e julgamento encontrarem-se em local diverso da sede do Juízo competente para julgamento do feito. Preliminar rejeitada. No mérito, emerge dos autos que no dia 08 de outubro de 2022 policiais rodoviários federais estavam em patrulha na BR 495, próximo à comunidade Madame Machado, quando perceberam um veículo VW Gol, branco, placa GVU 08950, sendo conduzido de forma suspeita, tendo os recorrentes tentado empreender fuga ao visualizarem a viatura, mas foram abordados pelos agentes públicos. Após receberem ordem de desembarque, o recorrente L. desceu do veículo sem camisa e o apelante H. desembarcou com a calça aberta, momento em que os policiais perceberam que havia no banco traseiro do veículo uma mulher seminua, chorando e com o discernimento muito alterado, a qual afirmou que havia sido abusada por ambos os recorrentes. A materialidade do crime restou comprovada pelo registro de ocorrência de fls. 07/08, pelo auto de prisão em flagrante de fls. 15/16, pelo laudo prévio de conjunção carnal e ato libidinoso diverso da conjunção carnal de fls. 17/21, pelo laudo de exame de conjunção e ato libidinoso diverso da conjunção carnal de fls. 28/31 e pelos depoimentos prestados em juízo, sob o crivo do contraditório. Ao contrário do sustentado pelas defesas técnicas, a prova não é frágil, tampouco há nulidade a ser reconhecida, estando a condenação amparada em conjunto probatório convincente, robusto e suficiente, no qual restaram amplamente demonstradas a materialidade e a autoria. Analisados atentamente os autos, chega-se à conclusão de que o pleito absolutório não merece prosperar. A ofendida relata claramente que «não consentiu em fazer sexo com ninguém. Que ficou sabendo que os acusados aproveitaram a situação e fizeram isso dentro do carro de L. Que não sabe se foi desvirginada". Especificou que naquele dia, bebeu a caipirinha e 04 chopps, indo ao banheiro por duas vezes, tendo por última lembrança a de voltar da segunda vez que foi no banheiro, e que o apelante L. estava de mão dada com ela, mas ele estava andando, e quando chegaram na mesa, sentaram e somente se lembra que se beijaram e encostou no ombro dele, sendo é a última lembrança que tem do local. Afirmou que, depois, só se lembra de estar acordando em um local todo branco, não tendo consciência de estar no hospital, e a primeira coisa que veio na sua mente foi o policial Gustavo sentado do seu lado e falando para ficar calma. Acrescente-se que os policiais rodoviários federais declararam que, ao abordarem o carro dos apelantes, encontraram a vítima em posição fetal, chorando muito e nua por debaixo de uma camisa branca que utilizava. Além disso, os policiais confirmaram que a vítima relatou ter sido abusada pelos recorrentes e que estava muito atordoada e parecendo fora de si. O recorrente H. por seu turno, negou a prática delitiva, afirmando que a vítima tirou a camisa espontaneamente e já estava sem a vestimenta no momento em que se sentou no banco de trás. O apelante L. por sua vez, declarou que a vítima chamou o H. e ficou com os dois, tendo trocado de direção no veículo com este, pois a vítima também o chamou para ir para o banco de trás com ela. Por outro lado, embora tenha negado ter feito sexo com a vítima, confirmou tê-la beijado. Destaca-se que o E. STJ já consagrou o entendimento de que o beijo lascivo, como os que deixou marcas no pescoço da vítima, integra o rol de atos libidinosos diverso da conjunção carnal e configura o crime de estupro contra vítima maior de 14 anos. Apesar da negativa dos apelantes, como se verifica, não foi trazido aos autos nenhum elemento capaz de ilidir a segura prova produzida pela acusação. Ademais, é consabido que, nos crimes contra a dignidade sexual, a palavra da vítima assume importância diferenciada, notadamente quando corroborada por outros meios de prova, haja vista ser ela que experimentou contra si e seu corpo a prática de atos voltados exclusivamente à satisfação da lascívia desmedida de outrem. Isto, mais das vezes, ocorre de maneira absolutamente silenciosa, distante de olhos alheios, perfazendo um humilhante quadro onde o ser humano é reduzido a mero objeto voltado à satisfação sexual de terceiros. No presente caso, as declarações da vítima ainda se coadunam com o laudo de exame de corpo de delito de conjunção carnal e ato libidinoso diverso da conjunção carnal de fls. 17/21. O parecer técnico indica a presença de equimose avermelhada na região cervical latera esquerda, com sentido vertical medindo 35x15mm, compatível com as lesões provocadas pela boca humana, a qual é bastante visível conforme foto de fl. 21. Além disso, a situação de vulnerabilidade da vítima restou evidenciada no parecer técnico, o qual descreve que ela deu entrada já inconsciente no DEPARTAMENTO DE POLÍCIA TÉCNICO-CIENTIFICA PRPTC, sendo carregada no colo pelo policial rodoviário federal. Destaca-se do laudo que a vítima recobrou a consciência somente após 20 minutos de observação e, ainda assim, de forma parcial, estando desorientada no tempo e espaço, sem a menor ideia de onde se encontrava. Além disso, ainda descreve que a vítima estava com labilidade emocional, chorando ao tentar relatar o fato, bem como dormindo com facilidade e apresentando lacunas de pensamento, que estava lentificado. Por fim, a perícia concluiu que a vítima encontrava-se com sua capacidade psicomotora alterada sem condições de autodeterminar-se, deixando clara a real situação de vulnerabilidade da vítima. Dessa forma, eventual ausência de exame de alcoolemia ou toxicológico não tem condão de alterar a correção da decisão recorrida, vez que pautada em elementos probatórios concretos e suficientes. Ademais, conforme jurisprudência consolidada do E. STJ, nos casos em que a vulnerabilidade decorre de enfermidade, deficiência mental ou por outra causa que impeça a vítima de oferecer resistência à prática sexual (art. 217-A, §1º, do CP), o magistrado não está vinculado à existência de laudo pericial para aferir tais condições, bastando que a decisão esteja devidamente fundamentada nos demais elementos probatórios. Nesse sentido AgRg no AREsp. Acórdão/STJ, relator Ministro Ribeiro Dantas. Mostra se impossível, ainda, acolher as teses defensivas de desclassificação do crime de estupro de vulnerável (CP, art. 217-A para os crimes de importunação sexual (CP, art. 215-A ou de violação sexual mediante fraude (CP, art. 215). Isso porque, os crimes previstos nos arts. 215 e 215-A, ambos do CP, são praticados sem violência ou grave ameaça, enquanto no estupro de vulnerável há presunção absoluta de violência ou de grave ameaça, sendo sua aplicação ao caso concreto regulada pelo princípio da especialidade. Por fim, restou caracterizada a causa de aumento de pena prevista no art. 226, IV, «a do CP pela ação conjunta dos recorrentes na prática dos atos libidinosos contra a vítima. Ainda que prevalecesse a tese de que apenas o recorrente L. tocou na vítima, restaria caracterizada a causa de aumento. Nos termos da jurisprudência do E. STJ, o concurso de agentes deve ser reconhecido ainda que um deles não tenha praticado a conduta descrita no tipo penal, desde que adira à atuação do comparsa e contribua para a consumação do crime de estupro, sendo certo que o recorrente H. confirmou estar dirigindo enquanto o apelante L. e a vítima estavam no banco de trás se beijando. Nesse sentido REsp. Acórdão/STJ, relator Ministro Sebastião Reis Júnior. Assim, o seguro arcabouço probatório produzido se mostra plenamente apto a ensejar um juízo de condenação pelo delito descrito no art. 217-A c/c 226, IV, «a, ambos do CP. No que diz respeito à resposta penal, as penas-base foram impostas no patamar mínimo legal para ambos os recorrentes, assim como a fração de aumento prevista no CP, art. 226, IV, «a. Além disso, o reconhecimento da atenuante de menoridade para o primeiro apelante, sem redução da pena na segunda fase abaixo do mínimo legal obedece aos ditames do verbete sumular 231 do STJ. O regime fechado é o adequado e suficiente a garantir os objetivos da pena, tendo em vista o quantum de sanção fixada, nos termos do art. 33 §2º, «a, do CP. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos ou a aplicação do sursis nos termos da decisão de 1º Grau em função da elevada pena imposta. RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS.... ()

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