Jurisprudência Selecionada
1 - TJRJ APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO EM CONCURSO MATERIAL. RÉU CONDENADO À PENA DE 10 (DEZ) ANOS, 10 (DEZ) MESES E 20 (VINTE) DIAS DE RECLUSÃO, A SER CUMPRIDA INICIALMENTE EM REGIME FECHADO, E PAGAMENTO DE 1.632 (UM MIL, SEISCENTOS E TRINTA E DOIS) DIAS-MULTA, À RAZÃO UNITÁRIA MÍNIMA. RECURSO DEFENSIVO. ARGUI EM PRELIMINAR A NULIDADE ABSOLUTA DO FEITO POR INDÍCIOS DE FLAGRANTE FORJADO, ANTE A SUPOSTA INOCORRÊNCIA DE FUNDADA SUSPEITA. PRETENDE: A) ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA; B) A ABSOLVIÇÃO PELOS DELITOS DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO PELA AUSÊNCIA DO ANIMUS ASSOCIATIVO; C) SUBSIDIARIAMENTE, A REVISÃO DOSIMÉTRICA; D) O AFASTAMENTO DA PENA DE MULTA. POR FIM, PREQUESTIONA O DESCUMPRIMENTO DE NORMAS CONSTITUCIONAIS E INFRACONSTITUCIONAIS.
O recurso preenche os requisitos de admissibilidade e, por isso, deve ser conhecido. De início, registra-se que as preliminares alegadas pela Defesa serão analisadas juntamente com a prova produzida, haja vista a profunda relação entre as mencionadas alegações e o acervo probatório. A denúncia dá conta de que no dia 05 de abril de 2022, por volta das 17 horas, na Rua Maria Gama, bairro Tomazinho, comarca de São João de Meriti, o denunciado, de forma livre, consciente e voluntária, trazia consigo, para fins de tráfico, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, 620g (seiscentos e vinte gramas) da substância entorpecente Cannabis Sativa L, popularmente conhecida como «maconha, distribuídos por 197 (cento e noventa e sete) embalagens semelhantes, confeccionadas com pequenos tabletes irregulares envoltos por filme polimérico do tipo PVC, contendo uma etiqueta colada sobre a sua superfície, ostentando as diferentes inscrições «CPX DO BQ SJM C.V MACONHA R$30 ou «CPX DO BQ SJM C.V MACONHA R$20"; 635g (seiscentos e trinta e cinco gramas) da substância entorpecente cloridrato de cocaína, distribuídos em 228 (duzentos e vinte e oito) recipientes plásticos incolores dotados de tampa, inseridos em invólucros plásticos incolores, estes fechados com auxílio de retalhos de papel com as diferentes inscrições «CPX DO BQ SJM C.V PÓ 15 ou «CPX DO BQ SJM C.V PÓ 10 ou «CPX DO BQ C.V PÓ 5, além de 33g (trinta e três gramas) da substância entorpecente cloridrato de cocaína em pedra, popularmente conhecida como «CRACK, distribuídos em 69 (sessenta e nove) invólucros plásticos incolores, estes fechados com auxílio de retalhos de papel com as diferentes inscrições «CPX DO BQ SJM C.V CRACK 10 ou «CPX DO BQ SJM C.V CRACK 5, conforme laudo de exame em material entorpecente às fls. 30/32. A peça exordial ainda dá conta de, em data que não se pode precisar, sendo certo que até o dia 05 de abril de 2022, o denunciado, de forma livre e consciente, associou-se a indivíduos ainda não identificados, todos pertencentes à facção criminosa Comando Vermelho, que domina a localidade, unindo recursos e esforços para a prática do tráfico de drogas naquela Comarca. Segundo consta dos autos, policiais militares estavam em patrulhamento pela localidade conhecida como ponto de venda de drogas, quando tiveram a atenção voltada para o denunciado, que estava em posse de uma mochila. Ato contínuo, os agentes abordaram o denunciado, encontrando, no interior da mochila que estava em sua posse, os entorpecentes acima descritos, além de um rádio transmissor e um aparelho celular. Na divisão de tarefas da associação criminosa voltada para o tráfico de drogas no bairro São Mateus, o I. Parquet imputou ao denunciado a função de «vapor, ou seja, aquele que era responsável por armazenar e vender as drogas na localidade. Do compulsar dos autos vê-se que a materialidade, como a autoria dos delitos imputados ao réu restaram evidenciadas pelo registro de ocorrência 064-05252/2022, auto de prisão em flagrante, auto de apreensão, laudo de exame definitivo de material entorpecente, termos de declarações, Auto de apreensão (rádio comunicador), auto de recebimento (rádio comunicador), bem como pela prova oral colhida sob o crivo do contraditório. O réu exerceu o direito de permanecer em silêncio. Inicialmente, improcede o argumento de ilicitude da prova em razão da ausência de fundada suspeita para a realização da busca pessoal. Conforme se depura do caso concreto, a diligência foi realizada em local conhecido pelo comércio ilegal de substâncias entorpecentes. Durante o patrulhamento, os policiais se posicionaram próximo à barricada, que impede acesso à policiamento ostensivo e com o amparo da circunstância, os agentes visualizaram o réu Yan, que estava portando uma mochila que contia o entorpecente arrecadado em grandes quantidades e um rádio transmissor. Assim, conforme bem delineado pela D. Procuradoria de Justiça, não se trata, portanto, de diligência especulativa indiscriminada, tampouco há que se falar em «pescaria probatória, eis que as circunstâncias fáticas, em especial o fato de que o réu trazia consigo a mochila onde foram arrecadadas as drogas em local de intenso tráfico e próximo a uma barricada justificam a ação policial. Não prospera a pretensão absolutória relativa ao crime de tráfico de entorpecentes. Ao contrário do sustentado pela defesa técnica, a prova não é frágil, estando a condenação amparada em conjunto probatório convincente, robusto e suficiente, no qual amplamente demonstradas a materialidade e a autoria. Os depoimentos dos policiais são firmes e coerentes não apenas entre si, mas com o vertido em sede policial, além de harmônicos à prova documental, em especial o auto de apreensão e o laudo de exame de entorpecente. De outro lado, inexistem nos autos quaisquer mínimos indícios de que os agentes quisessem prejudicar o acusado, de modo que caberia à defesa o ônus de demonstrar a imprestabilidade da prova, fato que não ocorreu no presente caso (HC 165.561/AM, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, DJe 15/02/2016). Ainda, quanto ao delito de tráfico de entorpecentes, da prova oral colhida sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, extrai-se que os policiais fizeram incursão no local da abordagem para patrulhamento de rotina, em localidade conhecida como «buraco quente, dominada pela organização criminosa comando vermelho e lá, lograram êxito em apreender com o réu 620g (seiscentos e vinte gramas) da substância entorpecente Cannabis Sativa L, popularmente conhecida como «maconha, distribuídos por 197 (cento e noventa e sete) embalagens semelhantes, confeccionadas com pequenos tabletes irregulares envoltos por filme polimérico do tipo PVC, contendo uma etiqueta colada sobre a sua superfície, ostentando as diferentes inscrições «CPX DO BQ SJM C.V MACONHA R$30 ou «CPX DO BQ SJM C.V MACONHA R$20"; 635g (seiscentos e trinta e cinco gramas) da substância entorpecente cloridrato de cocaína, distribuídos em 228 (duzentos e vinte e oito) recipientes plásticos incolores dotados de tampa, inseridos em invólucros plásticos incolores, estes fechados com auxílio de retalhos de papel com as diferentes inscrições «CPX DO BQ SJM C.V PÓ 15 ou «CPX DO BQ SJM C.V PÓ 10 ou «CPX DO BQ C.V PÓ 5, além de 33g (trinta e três gramas) da substância entorpecente cloridrato de cocaína em pedra, popularmente conhecida como «CRACK, distribuídos em 69 (sessenta e nove) invólucros plásticos incolores, estes fechados com auxílio de retalhos de papel com as diferentes inscrições «CPX DO BQ SJM C.V CRACK 10 ou «CPX DO BQ SJM C.V CRACK 5". O caso em exame reflete o posicionamento adotado por este Tribunal de Justiça, explicitado no verbete sumular 70, bem como pela jurisprudência das Cortes Suprema e Superior de Justiça. Cumpre observar, ademais, que o crime da Lei 11.343/2006, art. 33 é de natureza multinuclear, caracterizando-se o tráfico de drogas pela realização de qualquer dos verbos previstos no tipo penal. Assim, a intenção de difusão ilícita não se dá apenas por meio do flagrante eventual da venda das substâncias aos usuários, mas também por outras circunstâncias, dentre elas, trazer consigo e guardar, exatamente como na hipótese. A defesa técnica, por sua vez, não trouxe aos autos os elementos suficientes a descaracterizar o conjunto fático probatório que foi amealhado, conforme determina a regra do CPP, art. 156, tentando apenas desconstituir a narrativa dos agentes da lei em versão isolada ao conjunto de provas, sem lograr comprovar que estes tinham algum interesse em apontar situação inexistente, incriminando um inocente. Escorreito, portanto, o juízo de censura referente ao delito de tráfico de drogas. Não assiste razão à defesa em seu pleito absolutório, relativo ao crime de associação ao tráfico de drogas. In casu, a materialidade e autoria restaram comprovadas pelo robusto caderno probatório já delineado linhas atrás. No que diz respeito ao delito imputado ao ora apelante, vale reproduzir a prova testemunhal obtida em juízo, no sentido de que com o réu foram encontradas as drogas que continham inscrições em alusão à facção criminosa comando vermelho e um aparelho de radiotransmissão, sintonizado na frequencia do tráfico de drogas local, cuja «boca de fumo era conhecida como «buraco quente, reconhecido ponto de venda de drogas. A prova dos autos aponta que, no dia e local dos fatos, conforme constou da denúncia, Policiais Militares realizavam patrulhamento de rotina e, lograram êxito na prisão em flagrante do ora apelante. Cumpre destacar que o local é controlado pela facção criminosa «Comando Vermelho, o que demonstra que o réu se associou a outros indivíduos não identificados com o fim de praticar, de forma reiterada ou não, o crime de tráfico ilícito de entorpecentes. A associação do ora apelante para a prática do ilícito de tráfico de drogas é evidente, dado o exercício da função (vapor) que resultou em sua prisão. Tal comportamento contribui de forma consciente e eficaz para a prática da mercancia de drogas, sendo certo que a atuação do réu era primordial para o sucesso da associação criminosa por ele integrada, com especial destaque para o fato de que ele carregava em sua mochila, mais de meio quilo de maconha, além de peso superior a meio quilo de cocaína e 69 invólucros de crack. Destarte, ao contrário do alegado pela defesa, encontram-se presentes elementos empíricos que, conjugados com aqueles colhidos no curso da instrução probatória, demonstram a indisfarçável prática do delito da Lei 11.343/06, art. 35: 1) é fato notório, que independe de prova, a existência de facções criminosas dedicadas ao narcotráfico instaladas em diversas comunidades do Estado do Rio de Janeiro; 2) a facção criminosa que atua na localidade é a autodenominada «Comando Vermelho"; 3) O recorrente foi flagrado com objeto tipicamente usado com a finalidade de avisar aos traficantes sobre a chegada da Polícia ao local e sobre a movimentação na localidade («Radinho); 4) o local do flagrante é conhecido ponto de venda de drogas. O recorrente foi flagrado em localidade dominada pela facção criminosa autodenominada «Comando Vermelho, com drogas e rádio comunicador, durante patrulhamento policial na comunidade. As provas colhidas encontram-se em perfeita harmonia com os depoimentos das testemunhas de acusação prestados na fase policial e posteriormente colhidos sob o crivo do contraditório e ampla defesa, encaixando-se perfeitamente ao caso concreto a fundamentação efetivada pelo magistrado. Observa-se, portanto, que os fatos conhecidos e provados, examinados sob a ótica do que preconiza o CPP, art. 239, bem como pelas regras de experiência comum, subministrada pelo que comumente ocorre, nos termos do disposto no CPC, art. 375, levam à certeza de que o recorrente estava associado entre si e a outros traficantes da localidade, com patente animus associativo para a prática do tráfico de drogas, nos exatos termos da Lei 11.343/06, art. 35, hipótese não afastada por nenhum elemento de prova existente nos autos. Nesse viés, aliás, é importante destacar o posicionamento do STJ apontando «relevante a informação de que realizava o suposto comércio espúrio em área dominada pela facção criminosa Comando Vermelho, sendo presumível a sua adesão à organização criminosa, dada a intransigente territorialidade exercida por tais grupos (STJ, Rel. Min. Reynaldo Soares, 5ª T. HC 478822/RJ, julgado em 05.02.2019). Ou seja, «nas localidades em que o tráfico de drogas é exercido por facção criminosa, não há possibilidade que seja exercida atividade criminosa similar, por facção criminosa rival ou de forma autônoma e independente (STJ, Rel. Min. Antônio Saldanha, 6ª T. HC 492528, julg. em 28.02.2019), de modo que, em situações como a presente, não se tolera qualquer tipo de ingerência, oposição ou concorrência, seja de outras facções, quanto mais de alguns indivíduos atuando de per si. Em tal cenário, a prisão em local conhecido como ponto de venda de drogas, em posse de drogas variadas e radiocomunicador, adido às declarações uníssonas das testemunhas policiais e da prova documental, tudo se sobrepõe nos autos à negativa efetivada pelo apelante, assim comprovando a sua integração à associação para o tráfico de drogas com os outros traficantes da localidade, com funções específicas e perene vínculo associativo. Assim, não há como se acatar o pleito absolutório, portanto correta a condenação pelo crime do art. 35, c/c o art. 40, IV da Lei 11.343/06. Examinado, nesses termos, o juízo de condenação, passa-se ao exame da dosimetria. 1 - Do delito de tráfico de entorpecentes: Na primeira fase, atento às circunstâncias do CP, art. 59, vê-se que, no caso em exame, a quantidade e variedade da droga apreendida, com destaque à presença de cocaína, de vasto poder destrutivo, autorizam o aumento da pena básica, com amparo na Lei 11.343/06, art. 42, na fração de 1/6, conforme, o d. juízo a quo adequadamente considerou. Assim, a pena-base, com o incremento de 1/6 resultou em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa. Na segunda etapa, inexistentes atenuantes e presente a agravante da reincidência específica (FAC - anotação 1 - e-doc. 102), a pena, com a aplicação da fração de 1/6 ficou corretamente estabelecida em 6 (seis) anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa. Na terceira fase, foi corretamente afastado o benefício da causa de diminuição da pena prevista na Lei 11.343/06, art. 33, § 4º, diante da quantidade e diversidade das drogas arrecadadas, o que demonstra que o réu se dedicava às atividades criminosas, não se tratando de um traficante episódico, ocasional, fazendo do tráfico o seu meio de vida e que esta atividade ocorreria, ao menos, por algum período, e não simplesmente naquele dia, além do fato de que se trata de réu reincidente, que também foi condenado por associação ao tráfico, o qual não preenche os requisitos necessários ao reconhecimento da referida causa de diminuição de pena. Assim, a pena ficou inalterada nessa fase derradeira em 6 (seis) anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa. 2 - Do crime de associação ao tráfico: Na primeira fase, o aumento operado, embasado na quantidade de material entorpecente apreendido, tal qual como ocorreu no processo dosimétrico do crime de tráfico de drogas, não configura bis in idem, pois apesar de conexos, são crimes distintos. Assim, em respeito ao princípio da proporcionalidade, a fração de 1/6 aplicada pelo magistrado a quo foi a mesma utilizada na pena basilar do crime de tráfico e resultou em pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 816 (oitocentos e dezesseis) dias-multa. Na segunda etapa, inexistentes atenuantes e presente a agravante da reincidência específica (FAC - anotação 1 - e-doc. 102), a pena, com a aplicação da fração de 1/6 ficou corretamente estabelecida em 4 (quatro) anos e 1 (um) mês de reclusão e 952 (novecentos e cinquenta e dois) dias-multa que, pena que é mantida na terceira fase, ausentes demais moduladores. Uma vez que os crimes foram praticados na forma do concurso material de delitos, as penas cominadas devem ser cumuladas e totalizam 10 (dez) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 1632 (mil seiscentos e trinta e dois) dias-multa, à razão do mínimo legal. O regime para cumprimento inicial da pena é o fechado, nos termos do art. 33, § 2º «a, é o fechado, eis que a pena excede a 8 (oito) anos. Melhor sorte não assiste à pretensão de afastamento da condenação ao pagamento da pena de multa, pois foram adequadamente impostas, nos termos do permissivo legal dos CP, art. 49 e CP art. 60, bem como da previsão legal da Lei 11.343/2006, art. 42. Quanto ao prequestionamento trazido, não se vislumbra nenhuma contrariedade/negativa de vigência, ou interpretação de norma violadora, nem a demonstração de violação de artigos constitucionais ou infraconstitucionais, de caráter abstrato e geral. RECURSO CONHECIDO. REJEITADAS AS PRELIMINARES E DESPROVIDO.... ()
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