Jurisprudência em Destaque

STJ. 2ª Seção. Propriedade industrial. Marca. Caducidade. Cinge-se a lide a definir quais os efeitos do cancelamento de registro de marca industrial por ausência de uso – caducidade – (Lei 9.279/1996, art. 142, III). Reconhecido o efeito prospectivo (ex nunc). Finalidade da lei. Embargos de divergência em recurso especial. Precedentes do STJ. Considerações da Minª. Nancy Andrighi sobre o tema. Lei 9.279/1996, arts. 2º, 120, 134 e 139.

Postado por Emilio Sabatovski em 04/10/2011
«... V - A solução da controvérsia

A Lei 9.279/96 em seu art. 2º tem entre suas finalidades aliar o registro da marca comercial com a função social da propriedade e o desenvolvimento tecnológico e econômico do país. Para isso é que se permite a cessão ou a licença da marca a terceiros, de modo a facilitar a circulação de riquezas, pois se trata de bem imaterial juridicamente tutelado (arts. 130 c/c 134 e 139 da Lei 9.279/96).

Embora seja muito razoável a tese da 4ª Turma, cuja orientação se dá pelo leading case de autoria do Min. Ruy Rosado de Aguiar Jr., entendo que há uma diferença entre os institutos da caducidade e da nulidade do registro de uma marca que é fundamental para se compreender o intuito do legislador.

Antes de se fazer essa distinção, devemos compreender a finalidade que se pretende conferir à compreensão da mens legis. Essa finalidade é denominada técnica de política judiciária. Ou seja: quando o legislador não optou por definir de forma explícita a atividade temporal de determinado instituto jurídico, cabe ao Poder Judiciário delimitar sua direção – para frente (ex nunc) ou para trás (ex tunc) – e sua extensão – limitada a um ponto no tempo ou ilimitada.

Essa técnica advém da jurisprudência da Corte Suprema dos Estados Unidos e foi adotada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 2.240/BA. Naquela situação, o STF – diante de uma situação fática consolidada no tempo (criação do Município Luis Eduardo Magalhães/BA) – debateu a atividade dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade da lei estadual que formalizou o novo ente municipal. A precitada técnica foi esmiuçada no voto-vista do Min. Gilmar Mendes na seguinte passagem (fl. 315 do acórdão):


(...) a jurisprudência americana evoluiu para admitir, ao lado da decisão de inconstitucionalidade com efeitos retroativos amplos ou limitados (limited retrospectivity), a superação prospectiva (prospective overruling), que tanto pode ser limitada (limited prospectivity), aplicável aos processos iniciados após a decisão, inclusive ao processo originário, como ilimitada (pure prospectivity), que sequer se aplica ao processo que lhe deu origem.


Vê-se, pois, que o sistema difuso ou incidental mais tradicional do mundo passou a admitir a mitigação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade e, em casos determinados, acolheu até mesmo a pura declaração de inconstitucionalidade com efeito exclusivamente pro futuro.

Uma vez compreendida a finalidade de se determinar a direção e a extensão da atividade temporal dos efeitos de determinado instituto jurídico, parte-se para a distinção entre o instituto da caducidade e da nulidade de um registro de marca industrial.

A nulidade ocorre quando se reconhece a existência de determinado vício apto a macular a concessão do registro desde seu início. Justamente por ser inviável a manutenção de algo válido por ser nulo ab ovo é que se operam os efeitos retroativos.

A caducidade implica a declaração de determinada circunstância fática, que pode ser: (i) de inexistência de uso, gozo ou fruição do sinal desde seu registro; ou (ii) de interrupção do exercício de qualquer um daqueles poderes por prazo superior ao limite fixado na lei. Quando a condição para manutenção do registro deixa de existir, operam-se efeitos prospectivos.

Essa distinção faz muito sentido quando se analisa a evolução da legislação brasileira sobre marca industrial. A Lei de Propriedade Industrial, de 1996, retirou da caducidade sua conotação de matéria de interesse público ao suprimir a possibilidade de o INPI instaurar de ofício o procedimento de sua averiguação, procedimento que era presente na LPI de 1971.

Nesse sentido importa registrar o entendimento da Procuradoria Federal do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, que foi normatizado a partir do Parecer INPI/PROC/CJCONS/Nº 2/10 e publicado na Revista Eletrônica da Propriedade Industrial 2.091, de 1º.2.2011, cujo trecho se transcreve:


(...) a caducidade se reveste de natureza diversa, a começar pela constatação de que a discussão, na espécie, se cinge não às condições da constituição do direito em si (que é o de excluir terceiros do uso da marca), mas da sua manutenção, se inobservada a condição erigida pelo legislador como para tanto imprescindível, e que reside no uso do sinal.


(...) O registro é, portanto - ao menos por princípio, naturalmente -, válido. O que há é a denúncia de que a marca dele objeto não estaria sendo usada, fato a ser investigado mediante o competente processo apuratório (e que implica, inclusive, excepcionalmente, a inversão do ônus da prova, atribuída ao titular do registro), sabendo-se que tal denúncia é, no mais das vezes, apresentada por interessados na utilização do signo, que, não usado, não está cumprindo a sua função e nem justificando a proteção conferida pelo Estado (§§ 16 e 17 do parecer, p. 16. Disponível em http://revista.inpi.gov.br/INPI_UPLOAD/ Revistas/marcas2091.pdf. Acesso em 29.4.2011).

Diante dessas premissas, a direção temporal dos efeitos da caducidade mais adequada à finalidade do registro industrial é – sem dúvidas – a prospectividade (ex nunc).

Primeiro, porque os agentes do comércio – que são responsáveis pelo desenvolvimento econômico do país – precisam de segurança para realizar seus negócios.

Veja-se a seguinte situação: se uma marca for cedida/licenciada a diversas empresas em cadeia sucessória e a última cessionária/licenciada não exerce qualquer dos poderes inerentes à propriedade da marca, temos uma situação que coloca termo à circulação de riquezas.

Porém – se entendermos que os efeitos da caducidade são ex tunc – na hipótese de um terceiro interessado se apropriar daquela marca, esse estará legitimado a pedir lucros cessantes em face de todos os antigos proprietários. Consectário disso seria o início de uma reação em cadeia de ações de regresso até que o penúltimo prejudicado pela inércia consiga cobrar do último o prejuízo decorrente da abstenção de uso, gozo ou fruição do sinal industrial.

A vingar esse entendimento não é necessário muito esforço para concluir que o registro de marcas e patentes – ao invés de oferecer segurança jurídica ao seu proprietário e eventuais cessionários/licenciados – demonstra um risco ad eternum para quem se aventurar a adquirir direitos sobre propriedade imaterial.

Essa perene espada de Damocles sobre a cabeça dos agentes econômicos esvaziaria o propósito da lei, pois inspiraria a desconfiança generalizada no sistema de registro de marcas industriais, inviabilizando-o.

Ademais, não há sentido em penalizar o proprietário de uma marca – por não exercer seu direito de uso, gozo e fruição no prazo legal – além da sanção já prevista nos arts. 142, III, e 143, I, da Lei 9.279/96. A caducidade por si só já é a punição máxima que todo proprietário de uma marca pode sofrer: ele praticamente é desapropriado pelo decurso do tempo ou – em outras palavras – tem sua propriedade usucapida às avessas. É por essa razão que a lei presume seu prejuízo quando não exerce qualquer um dos poderes inerentes à propriedade (art. 1.228 do CC). Exemplo disso ocorre na apuração dos lucros cessantes decorrentes de uso indevido de sua marca. Os parâmetros do cálculo da indenização são: (i) os benefícios que o prejudicado teria auferido se a violação não tivesse ocorrido; (ii) os benefícios que foram auferidos pelo autor da violação do direito; ou (iii) a remuneração que o autor da violação teria pago ao titular do direito violado pela concessão de uma licença que lhe permitisse explorar o bem em conformidade com a lei (art. 210 da Lei 9.279/96).

Partindo-se dessas premissas é que considero o posicionamento da 3ª Turma mais adequado à finalidade da legislação sobre propriedade industrial.

Forte nessas razões, DOU PROVIMENTO aos embargos de divergência, para que prevaleça a orientação seguida por esta Corte por ocasião do julgamento do REsp 330.175/PR, no sentido de reconhecer os efeitos prospectivos (ex nunc) da declaração de caducidade da marca industrial. ...» (Minª. Nancy Andrighi)»

Doc. LegJur (116.6641.6000.2200) - Íntegra: Click aqui


Referências:
Propriedade industrial (Jurisprudência)
Marca (Jurisprudência)
Caducidade (v. Marca ) (Jurisprudência)
Cancelamento (v. Marca ) (Jurisprudência)
Registro de marca (v. Marca ) (Jurisprudência)
Marca industrial (v. Marca ) (Jurisprudência)
Caducidade (v. Marca ) (Jurisprudência)
Lei 9.279/1996, art. 142, III. (Legislação)
Lei 9.279/1996, art. 2º (Legislação)
Lei 9.279/1996, art. 120 (Legislação)
Lei 9.279/1996, art. 134 (Legislação)
Lei 9.279/1996, art. 139 (Legislação)
LegJur: A Ferramenta Essencial para Advogados Modernos
Transforme seu escritório de advocacia com informações legais atualizadas e relevantes!

Olá Advogado(a),

Você já pensou sobre o tempo e os recursos que gasta pesquisando leis, jurisprudências e doutrinas para os seus casos? Já se imaginou otimizando esse processo de forma eficiente e segura?

Então, temos algo em comum. O LegJur foi criado pensando em você, no advogado moderno que não pode se dar ao luxo de perder tempo em um mercado tão competitivo.

Por que o LegJur é a solução que você precisa?

1. Conteúdo Atualizado: Nosso banco de dados é atualizado constantemente, oferecendo as informações mais recentes sobre legislações, súmulas e jurisprudências.

2. Fácil Acesso: Uma plataforma simples e intuitiva que você pode acessar de qualquer dispositivo, a qualquer momento. Seu escritório fica tão flexível quanto você.

3. Busca Inteligente: Nosso algoritmo avançado torna sua pesquisa rápida e eficaz, sugerindo temas correlatos e opções para refinar sua busca.

4. Confiabilidade: Nosso time de especialistas trabalha incansavelmente para garantir a qualidade e a confiabilidade das informações disponíveis.

5. Economia de Tempo: Deixe de lado as horas de pesquisa em múltiplas fontes. Aqui, você encontra tudo o que precisa em um só lugar.

Invista no seu maior capital: o tempo

Você já deve saber que o tempo é um dos ativos mais preciosos na advocacia. Utilize o LegJur para maximizar sua eficiência, oferecendo ao seu cliente uma consultoria de alto nível fundamentada em informações confiáveis e atualizadas.

Depoimentos

"O LegJur transformou a forma como faço minha pesquisa jurídica. Agora, posso concentrar-me mais no desenvolvimento de estratégias para meus casos e menos na busca de informações."
— Maria L., Advogada

Não perca mais tempo! Torne-se membro do LegJur e eleve sua prática jurídica a um novo patamar.

Faça parte da evolução na advocacia. Faça parte do LegJur.

Assinatura Mensal

Acesso Total ao Site com Débito Automático no Cartão de Crédito

R$ 19,90

À vista

1 mês

Acesso Total ao Site com Renovação opcional

R$ 29,90

Parcele em até 3x sem juros

3 meses

Equilave a R$ 26,63 por mês

Acesso Total ao Site com Renovação opcional

R$ 79,90

Parcele em até 6x sem juros

6 meses

Equilave a R$ 21,65 por mês

Acesso Total ao Site com Renovação opcional

R$ 129,90

Parcele em até 6x sem juros

12 meses + 2 meses de Brinde

Equilave a R$ 15,70 por mês

Acesso Total ao Site com Renovação opcional

R$ 219,90

Parcele em até 6x sem juros