Jurisprudência em Destaque

STJ. 5ª T. «Habeas corpus». Calúnia e difamação. Anulação. Primeira sentença anulada em face de incompetência absoluta. Imposição de pena mais grave em segunda condenação. Impossibilidade. Violação ao princípio que proíbe a reformatio in pejus. Juiz natural. Restrição do juízo natural à reprimenda imposta pelo magistrado incompetente. Concessão da ordem. Considerações do Min. Jorge Mussi sobre o tema, bem como sobre a natureza jurídica da sentença proferida por juiz incompetente e também sofre a distinção dos atos inexistentes e nulos. Precedentes do STJ e STF. CF/88, art. 5º, XXXVII. CPP, arts. 617 e 647.

Postado por Emilio Sabatovski em 15/01/2012
... De início, cumpre esclarecer que há grande discussão acerca da natureza da sentença proferida por magistrado absolutamente incompetente: se nula ou inexistente.

Tal polêmica, conquanto seja utilizada por diversos autores para justificar a vedação ou não da reformatio in pejus indireta, não é determinante para a solução da questão ora em debate, já que até mesmo aqueles que entendem que os atos praticados por juiz absolutamente incompetente são inexistentes admitem que deles podem emanar certos efeitos.

É o que ocorre, por exemplo, no caso de sentença absolutória proferida por juiz absolutamente incompetente e que transita em julgado. Ainda que se adote a posição de que a citada decisão seria inexistente, não se admite que o acusado possa sofrer nova persecução criminal, agora em ação penal conduzida por magistrado competente, em observância ao princípio que proíbe o bis in idem.

Nesse sentido, veja-se a lição de Luis Felipe Tegon Cerqueira Leite:


A categoria da inexistência da teoria geral perde força no processo penal, sempre que haja uma absolvição, a qual acaba surtindo efeitos jurídicos para impedir um novo julgamento pelo mesmo fato apontado como delituoso.


Ora, isso significa conferir efeito ao que seria inexistente, por mais paradoxal que possa parecer! Sendo assim, parece-nos um contra-sendo admitir como inexistentes atos que, juridicamente, podem irradiar efeitos. Além disso, a aceitação da categoria dos atos inexistentes obriga o técnico a uma verdadeira manobra doutrinária, para distinguir casos em que o ato, a despeito de ser inexistente, pode transitar em julgado e casos em que o ato inexistente nunca se convalida.


Assim é que, em nosso entendimento, a distinção entre atos inexistentes e nulos não conduz a nenhum resultado prático. Por mais grave que seja o vicio do ato processual, haverá sempre a necessidade de um pronunciamento judicial para solucionar a questão. Vale aqui o que já afirmamos sobre os atos nulos: não se pode questionar uma nulidade ipso iure porque é necessário reconhecer a presença de certos requisitos para que o ato efetivamente possa ser tido como nulo. (Sentença inexistente e reformatio in pejus indireta. Revista dos Tribunais. Ano 91, volume 802, agosto de 2002, p. 469-470).

Pois bem. Ainda que a definição sobre a natureza da sentença proferida por juiz absolutamente incompetente não seja crucial para o deslinde da presente controvérsia, é de se ter em mente que tem prevalecido o entendimento segundo o qual o referido ato é nulo, e não inexistente.

A propósito:


RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIMES DE DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA E CORRUPÇÃO DE TESTEMUNHAS (ARTS. 339 E 343, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO PENAL). ACÓRDÃO PROFERIDO EM SEDE ORIGINÁRIA PELO TJPB. ABSOLVIÇÃO PELO PRIMEIRO CRIME E CONDENAÇÃO PELO SEGUNDO. ACÓRDÃO ANULADO PELO STJ POR INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA. REPERCUSSÃO DA DECISÃO ANULADA NO JUÍZO COMPETENTE. REFORMATIO IN PEJUS INDIRETA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. OCORRÊNCIA.


(...)


4. O Juiz absolutamente incompetente para decidir determinada causa, até que sua incompetência seja declarada, não profere sentença inexistente, mas nula, que depende de pronunciamento judicial para ser desconstituída. E se essa declaração de nulidade foi alcançada por meio de recurso exclusivo da defesa, ou por impetração de habeas corpus, como no caso, não há como o Juiz competente impor ao Réu uma nova sentença mais gravosa do que a anteriormente anulada, sob pena de reformatio in pejus indireta.


(...)


6. Prejudicada a análise da alegada inépcia da denúncia.


7. Recurso parcialmente provido para decretar a prescrição da pretensão punitiva estatal nos autos em tela, restando extinta a punibilidade do Recorrente.


(RHC 20.337/PB, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 14/04/2009, DJe 04/05/2009)


PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. FALSIFICAÇÃO DE CTPS. PROCESSO INICIADO NA JUSTIÇA FEDERAL. DECLINATÓRIA EM FAVOR DA JUSTIÇA ESTADUAL. INCOMPETÊNCIA RATIONE MATERIAE. NECESSIDADE DE REFAZIMENTO DE TODOS OS ATOS, INCLUSIVE O OFERECIMENTO DE NOVA DENÚNCIA.


1. Todos os atos praticados perante juiz constitucionalmente incompetente são absolutamente nulos - ratione materiae. (...)


2. Ordem concedida para anular o processo a partir do oferecimento da denúncia, inclusive.


(HC 99.247/SP, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 23/02/2010, DJe 17/05/2010)

Não se desconhece a existência de posicionamentos doutrinários e de julgados que não admitem que o juiz fique limitado à pena inicialmente imposta em caso de nulidade do processo por incompetência absoluta.

Por todos, veja-se o que consignado por Eugênio Pacelli:


Cuidando-se, porém, de incompetência absoluta, instituída em razão da matéria e da função exercida pelo acusado, pensamos que a solução há de ser diferente, na linha, aliás, de decisões da Suprema Corte (...).


Nesta hipótese, parece-nos, a discussão haverá de contemplar um dado novo, de origem constitucional e não contido no primeiro problema, a saber: o princípio do juiz natural, a ser examinado não só como garantia do indivíduo diante do Estado, mas também como exigência da qualidade da jurisdição, sob a perspectiva do interesse público na correta aplicação da lei penal.


Dizemos qualidade da jurisdição unicamente para nos referirmos, mais uma vez, aos critérios de distribuição constitucional da competência jurisdicional penal, fundados ora na especialização em relação à matéria, ora com referência às funções públicas exercidas pelo acusado, a reclamar uma jurisdição colegiada e de, no mínimo, segunda instância.


Por isso, não nos parece razoável que o juiz natural, cuja competência decorre da própria Constituição, possa estar subordinado aos limites de pena fixados em decisão absolutamente nula, ainda que tal nulidade somente tenha sido conhecida a partir de recurso da defesa. Nunca é demais lembrar que a nulidade absoluta, em regra, deve ser conhecida ex officio, diante da gravidade do vício nela contido.


Além disso, a limitação feita ao juiz por ocasião da incompetência relativa decorre de norma infraconstitucional, qual seja, aquela do art. 617 do CPP, e dirige-se contra violação de critério legal igualmente ordinário, isto é a competência territorial. Não há, no caso, como conseqüência da limitação imposta ao juiz, afetação aos princípios constitucionais.


Todavia, na segunda hipótese, de vício decorrente de incompetência absoluta, a subordinação à quantidade de pena imposta na primeira decisão dirige-se contra o princípio do juiz natural, não no que concerne à prevalência de sua jurisdição, já garantida com o reconhecimento da nulidade, mas no que respeita à liberdade de seu convencimento e do livre exercício de sua tarefa judicante. Não nos parece possível, assim, falar-se em vedação da reformatio in pejus indireta, sob pena de fazer-se prevalecer regra legislativa de natureza ordinária (art. 617, CPP), sobre princípio de fonte constitucional. (Curso de Processo Penal. 10ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 672).

Contudo, com a devida vênia, essa não é a orientação que mais se coaduna com os princípios que regem a persecução penal.

Ao se admitir que em recurso exclusivo da defesa o processo seja anulado e, em nova sentença, seja possível impor pena maior ao acusado, se estará limitando sobremaneira o seu direito à ampla defesa, já que nele se provocaria enorme dúvida quanto à possibilidade de se insurgir ou não contra a decisão, pois ao invés de conseguir modificar o julgado para melhorar a sua situação ou, ao menos, mantê-la como está, ele poderia ser prejudicado.

Nessa ordem de ideias, o artigo 617 do Código de Processo Penal preceitua que o tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença.

Observe-se que o referido dispositivo legal não estabelece qualquer ressalva referente aos casos de anulação do processo, ainda que por incompetência absoluta, e não poderia ser diferente.

Caso não houvesse recurso da defesa do paciente, a sentença prolatada no âmbito do Juizado Especial Criminal Federal teria transitado em julgado, havendo, por conseguinte, coisa julgada material, ainda que decorrente de processo que tramitou perante Juízo absolutamente incompetente.

Desse modo, não se pode admitir que por meio de recurso exclusivo da defesa, que constitui meio processual de impugnação, a pena imposta ao paciente em nova ação penal seja mais severa, já que tal compreensão implicaria aceitar que, em apelo somente seu, o réu sofra consequências mais gravosas e severas do que as que redundariam do trânsito em julgado de sua condenação, em total subversão à ordem natural das coisas.

Por conseguinte, ainda que haja anulação do feito por incompetência absoluta, deve-se ter presente que se este acontecimento só se tornou possível diante de irresignação exclusiva da defesa, como na hipótese vertente, não é possível que no julgamento proferido pelo Juízo competente seja agravada a situação do réu, devendo prevalecer o princípio que proíbe a reformatio in pejus.

Esta conclusão torna-se ainda mais evidente quando se constata que o princípio do juiz natural, previsto como direito fundamental no inciso XXXVII do artigo 5º da Constituição Federal, é instituído essencialmente em favor daquele que é processado, a quem se confere o direito de ser julgado por quem esteja regular e legitimamente investido dos poderes de jurisdição.

Não é concebível, pois, que uma garantia estabelecida em favor do acusado seja contra ele invocada, a fim de possibilitar o agravamento de sua situação em processo no qual apenas ele recorreu.

Quanto ao ponto, vale destacar o seguinte julgado da Suprema Corte, no qual se atestou a inviabilidade de se suscitar a observância de princípios como o do juiz natural em desfavor do réu, quando somente ele recorre:


EMENTA: HABEAS CORPUS. PACIENTE ABSOLVIDO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA, NÃO SUSCITADA NA APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO, ACOLHIDA DE OFÍCIO PELO TRIBUNAL, POR TRATAR-SE DE NULIDADE ABSOLUTA. ALEGAÇÃO DE QUE A SENTENÇA ABSOLUTÁRIA TRANSITOU EM JULGADO EM TUDO AQUILO QUE NÃO FOI OBJETO DO RECURSO DO PARQUET. PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DA SÚMULA 160/STF, COM A MANUTENÇÃO DA ABSOLVIÇÃO DIANTE DA IMPOSSIBILIDADE DE HAVER NOVA DECISÃO MAIS GRAVOSA AO RÉU. O Tribunal, ao julgar apelação do Ministério Público contra sentença absolutória, não pode acolher nulidade - ainda que absoluta-, não veiculada no recurso da acusação. Interpretação da Súmula 160/STF que não faz distinção entre nulidade absoluta e relativa. Os atos praticados por órgão jurisdicional constitucionalmente incompetente são atos nulos e não inexistentes, já que proferidos por juiz regularmente investido de jurisdição, que, como se sabe, é una. Assim, a nulidade decorrente de sentença prolatada com vício de incompetência de juízo precisa ser declarada e, embora não possua o alcance das decisões válidas, pode produzir efeitos. Precedentes. A incorporação do princípio do ne bis in idem ao ordenamento jurídico pátrio, ainda que sem o caráter de preceito constitucional, vem, na realidade, complementar o rol dos direitos e garantias individuais já previstos pela Constituição Federal, cuja interpretação sistemática leva à conclusão de que a Lei Maior impõe a prevalência do direito à liberdade em detrimento do dever de acusar. Nesse contexto, princípios como o do devido processo legal e o do juízo natural somente podem ser invocados em favor do réu e nunca em seu prejuízo. Por isso, estando o Tribunal, quando do julgamento da apelação, adstrito ao exame da matéria impugnada pelo recorrente, não pode invocar questão prejudicial ao réu não veiculada no referido recurso, ainda que se trate de nulidade absoluta, decorrente da incompetência do juízo. Habeas corpus deferido em parte para que, afastada a incompetência, seja julgada a apelação em seu mérito.


(HC 80263, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Tribunal Pleno, julgado em 20/02/2003, DJ 27-06-2003 PP-00030 EMENT VOL-02116-03 PP-00515)

Logo, havendo recurso somente da defesa, é inadmissível que se imponha pena mais grave ao réu, ainda que o decreto condenatório venha a ser anulado por incompetência absoluta do Juízo, porquanto tal proceder implicaria ofensa ao princípio que veda o agravamento da situação do acusado em apelo exclusivamente seu.

Eis o que leciona Guilherme de Souza Nucci ao tratar da reformatio in pejus indireta:


Trata-se da anulação da sentença, por recurso exclusivo do réu, vindo outra a ser proferida, devendo respeitar os limites da primeira, sem poder agravar a situação do acusado. Assim, caso o réu seja condenado a 5 anos de reclusão, mas obtenha a defesa a anulação dessa decisão, quando o magistrado - ainda que seja outro - venha a proferir outra sentença, está adstrito a uma condenação máxima de 5 anos. Se pudesse elevar a pena, ao proferir nova decisão, estaria havendo autêntica reforma em prejuízo da parte que recorreu. Em tese, seria melhor ter mantido a sentença, ainda que padecendo de nulidade, pois a pena seria menor. Parece-nos justa, portanto, essa posição, que é dominante na jurisprudência atual. (Código de Processo Penal Comentado. 9ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 994).

Em arremate, cumpre trazer à baila o que afirmado por Luis Felipe Tegon Cerqueira Leite, especificamente sobre a hipótese da proibição da reformatio in pejus indireta em casos de anulação por incompetência absoluta:


As razões que levam à proibição da reformatio in pejus indireta são exatamente as mesmas quer se trate de sentença nula, quer se trate de sentença inexistente. O objetivo é assegurar o exercício da mais ampla defesa, eliminando qualquer tipo de óbice para que a defesa recorra da sentença que não lhe pareceu adequada. Excluindo-se a proibição da reformatio in pejus indireta dos casos de sentença inexistente, a defesa estaria de mãos atadas, atemorizada com a possibilidade de a situação do réu ser agravada na nova sentença. Além do que parece extremamente injusto que o réu tenha sua situação piorada em razão de impugnação de sua exclusiva iniciativa.


(...)


Assim é que, em nome da plenitude de defesa e do favor rei, deve ser admitida a proibição da reformatio in pejus indireta quando a sentença for proferida por juiz constitucionalmente incompetente.


Parece extremamente técnico afirmar que a sentença proferida por juiz que não tinha jurisdição não pode servir de parâmetro para nova decisão a ser proferida pelo juiz competente. Entretanto, por que não se afirma que, se a sentença for absolutória, ainda que proferida por juiz constitucionalmente incompetente, e ocorrer o trânsito em julgado, o réu não poderá ser processado novamente? Já mencionamos a hipótese mais acima, salientando que os mesmos autores que não admitem que os atos inexistentes produzam efeitos jurídicos assumem a ocorrência de coisa julgada se a sentença for absolutória. Se o objetivo é favorecer o réu, por que ele não pode ser favorecido se a sentença for proferida por juiz absolutamente incompetente? Que técnica é essa que em alguns casos vale a para outros não vale? Deve ser feita nessa hipótese uma ponderação de princípios: o que, na hipótese, deve prevalecer - a técnica ou a defesa de valores com a vida, a liberdade e a dignidade? Na verdade, não podemos nos esquecer de que a técnica está (ou pelo menos deve estar) em função desses valores. Além do que não se trata de falta de técnica, mas de adoção de regras peculiares para preservar a plenitude de defesa. (Op. cit., p. 472/473).

Na mesma esteira é a jurisprudência desta Corte Superior:


HABEAS CORPUS. CRIME DE TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. SENTENÇA ANULADA DE OFÍCIO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM EM RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA. RECONHECIMENTO DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO ESTADUAL PARA O JULGAMENTO DO FEITO. NOVA SENTENÇA PROFERIDA PELO JUIZ NATURAL QUE APLICA PENA SUPERIOR ÀQUELA ESTABELECIDA PELO MAGISTRADO PRIMEVO. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO NE REFORMATIO IN PEJUS. LIMITAÇÃO DA PENA QUE SE IMPÕE. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.


1 - O princípio ne reformatio in pejus, apesar de não possuir caráter constitucional, faz parte do ordenamento jurídico complementando o rol dos direitos e garantias individuais já previstos na Constituição Federal, cuja interpretação sistemática permite a conclusão de que a Magna Carta impõe a preponderância do direito a liberdade sobre o Juiz natural. Assim, somente se admite que este último - princípio do Juiz natural - seja invocado em favor do réu, nunca em seu prejuízo.


2 - Sob essa ótica, portanto, ainda que a nulidade seja de ordem absoluta, eventual reapreciação da matéria, não poderá de modo algum ser prejudicial ao paciente, isto é, a sua liberdade.


3 - Não obstante irrepreensível o reconhecimento pela autoridade coatora da incompetência da Justiça Estadual para o julgamento da ação penal de que se cuida - em que se imputa ao paciente a prática de tráfico internacional de entorpecentes -, ainda que em sede de apelação exclusiva da defesa, eis que se trata de vício de natureza absoluta, impõe-se que a nova condenação pelo juiz natural da causa não exceda 4 anos de reclusão, tal como estabelecido pelo Juízo da 12ª Vara Criminal de São Paulo - Juízo primitivo -, em observância ao princípio ne reformatio in pejus.


4 - Ordem parcialmente concedida.


(HC 105.384/SP, Rel. Ministro HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/CE), SEXTA TURMA, julgado em 06/10/2009, DJe 03/11/2009)


HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL MILITAR. CONSTRANGIMENTO E LESÕES LEVES (ARTS. 222, § 2º., E 209, caput, AMBOS DO CPM). PACIENTE QUE, PELOS MESMOS FATOS, JÁ CUMPRIU OBRIGAÇÃO IMPOSTA EM TRANSAÇÃO PENAL (PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE), PERANTE JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL, COM EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. DENÚNCIA RECEBIDA PELO JUÍZO MILITAR. ALEGAÇÃO DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA COMUM. PRINCÍPIO DO NE BIS IN IDEM. CENTRALIDADE, EM NOSSO ORDENAMENTO CONSTITUCIONAL, DOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS. PARECER DO MPF PELA CONCESSÃO DA ORDEM. ORDEM CONCEDIDA, PARA TRANCAR A AÇÃO PENAL EM CURSO NA 1ª. AUDITORIA DA JUSTIÇA MILITAR/RS.


1. A sentença prolatada por juiz absolutamente - ou, como se dá no caso, a homologação de transação penal proposta pelo Parquet -, embora nula, pode acarretar o efeito de tornar definitiva a absolvição do acusado. Assim, apesar de eivada de nula, a decisão do Juízo Especial Criminal tem como conseqüência a proibição da reformatio in pejus.


2. A coisa julgada material significa a imutabilidade do comando contido na sentença. Na seara penal, a res judicata sustenta-se sobre a necessidade de segurança que a ordem jurídica demanda.


3. Ao confrontar a competência absoluta da Justiça Militar e o princípio do ne bis in idem, deve a solução tender para esta, em razão da centralidade dos direitos e garantias individuais em nossa Carta Constitucional.


4. Parecer do MPF pela concessão da ordem.


5. Ordem concedida, para determinar o trancamento da Ação Penal em curso na 1ª. Auditoria da Justiça Militar do Estado do Rio Grande do Sul.


(HC 90.472/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 29/09/2009, DJe 03/11/2009)


RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIMES DE DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA E CORRUPÇÃO DE TESTEMUNHAS (ARTS. 339 E 343, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO PENAL). ACÓRDÃO PROFERIDO EM SEDE ORIGINÁRIA PELO TJPB. ABSOLVIÇÃO PELO PRIMEIRO CRIME E CONDENAÇÃO PELO SEGUNDO. ACÓRDÃO ANULADO PELO STJ POR INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA.


REPERCUSSÃO DA DECISÃO ANULADA NO JUÍZO COMPETENTE. REFORMATIO IN PEJUS INDIRETA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. OCORRÊNCIA.


(...)


3. Hipótese em que o Recorrente, em sede de ação penal originária, foi absolvido pelo crime de denunciação caluniosa e condenado pelo de corrupção de testemunhas a um ano e seis meses de reclusão, com posterior anulação do processo por esta Corte em razão da incompetência absoluta do Tribunal de Justiça, sendo novamente denunciado pelos mesmos crimes perante o Juízo de primeiro grau.


4. O Juiz absolutamente incompetente para decidir determinada causa, até que sua incompetência seja declarada, não profere sentença inexistente, mas nula, que depende de pronunciamento judicial para ser desconstituída. E se essa declaração de nulidade foi alcançada por meio de recurso exclusivo da defesa, ou por impetração de habeas corpus, como no caso, não há como o Juiz competente impor ao Réu uma nova sentença mais gravosa do que a anteriormente anulada, sob pena de reformatio in pejus indireta.


5. A prevalecer a sanção imposta no acórdão condenatório originário, qual seja, de um ano e seis meses de reclusão, o prazo prescricional é de quatro anos, a teor do art. 109, inciso V, do Código Penal. Nesse cenário, vê-se que entre a data dos fatos (fevereiro de 1999) e o recebimento da nova denúncia perante o Juízo de primeiro grau (02 de agosto de 2004) transcorreu o lapso temporal prescricional.


6. Prejudicada a análise da alegada inépcia da denúncia.


7. Recurso parcialmente provido para decretar a prescrição da pretensão punitiva estatal nos autos em tela, restando extinta a punibilidade do Recorrente.


(RHC 20.337/PB, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 14/04/2009, DJe 04/05/2009)

Merece destaque, por fim, a posição do Supremo Tribunal Federal, que também reconhece que mesmo nos casos de anulação do processo em virtude de incompetência absoluta, aplica-se o princípio da ne reformatio in pejus, não podendo o juiz natural fixar pena superior à estipulada pelo incompetente:


EMENTA: Reformatio in pejus indireta: aplicação à hipótese de consumação da prescrição segundo a pena concretizada na sentença anulada, em recurso exclusivo da defesa, ainda que por incompetência absoluta da Justiça de que promanou. I. Anulada uma sentença mediante recurso exclusivo da defesa, da renovação do ato não pode resultar para o réu situação mais desfavorável que a que lhe resultaria do trânsito em julgado da decisão de que somente ele recorreu: é o que resulta da vedação da reformatio in pejus indireta, de há muito consolidada na jurisprudência do Tribunal. II. Aceito o princípio, é ele de aplicar-se ainda quando a anulação da primeira sentença decorra da incompetência constitucional da Justiça da qual emanou.


(HC 75907, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, julgado em 11/11/1997, DJ 09-04-1999 PP-00002 EMENT VOL-01945-01 PP-00126)

No caso dos autos, como visto, ao paciente foi imposta inicialmente a reprimenda de 01 (um) ano de detenção e pagamento de 15 (quinze) dias-multa, sendo que em decorrência de recurso exclusivamente seu, o julgamento foi anulado em face da incompetência absoluta do Juizado Especial Criminal Federal,

Portanto, na ação penal que tramitou perante o Juízo competente a sanção aplicada ao paciente não poderia ter sido maior do que a que lhe foi fixada pelo magistrado incompetente, estando tanto o Juízo da 2ª Vara Criminal Federal da Seção Judiciária do Espírito Santo, como o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, limitados ao quantum de pena inicial, em atenção ao princípio que veda a reformatio in pejus.

Ante o exposto, concede-se a ordem apenas para determinar que a Corte de origem redimensione a pena do paciente, tendo como parâmetro o teto estabelecido pela sentença anulada. ... (Min. Jorge Mussi).

Doc. LegJur (12.2601.5000.3300) - Íntegra: Click aqui


Referências:
Habeas corpus (Jurisprudência)
Sentença (Jurisprudência)
Anulação (v. Sentença ) (Jurisprudência)
Pena (Jurisprudência)
Pena mais grave (v. Pena ) (Jurisprudência)
Segunda condenação (v. Reformatio in pejus ) (Jurisprudência)
Reformatio in pejus (Jurisprudência)
Juiz natural (Jurisprudência)
Distinção (Jurisprudência)
Ato nulo (Jurisprudência)
Ato inexistente (Jurisprudência)
Natureza jurídica (Jurisprudência)
Juiz incompetente (v. Sentença ) (Jurisprudência)
CF/88, art. 5º, XXXVII
CPP, art. 617
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