Jurisprudência em Destaque

STJ. 3ª T. Família. Casamento sob regime de comunhão universal de bens. Cônjuge. Separação de fato. Responsabilidade. Possibilidade de prestação de contas antes da formalização da partilha de bens. Eventual prejuízo na posterior divisão patrimonial. Cabimento da ação. Legitimidade ativa. Considerações do Min. Ricardo Villas Bôas Cueva sobre o tema. Precedentes do STJ. CCB, art. 266. CPC, arts. 3º, 267, VI e 914.

Postado por Emilio Sabatovski em 03/06/2012
«... A legitimidade ad causam para a ação de prestação de contas decorre, excepcionalmente, do direito da ex-mulher obter informações dos bens de sua propriedade administrados por outrem (gestor do patrimônio comum), no caso seu ex-marido, de quem já se encontrava separada de fato, durante o período compreendido entre a separação de fato e a partilha de bens da sociedade conjugal.

A propósito, cite-se oportuna lição de Humberto Theodoro Júnior:


«Na vigência da comunhão de bens, os cônjuges entre si não se acham jungidos ao dever de prestação de contas. A comunhão de bens é a mais ampla possível e não permite a separação de cotas, nem mesmo ideal entre os consortes. Não há, pois, como cogitar-se de prestação de contas de um cônjuge ao outro.


Uma vez dissolvida a sociedade conjugal, desaparece a comunhão universal e os bens comuns devem ser partilhados como em qualquer comunhão que se extingue. Havendo, porém, um interregno entre a dissolução da sociedade conjugal e a partilha, aquele que conservar a posse dos bens do casal estará sujeito a prestação de contas como qualquer consorte de comunhão ordinária. In casu, não é preciso demonstrar a existência de autorização ou mandato entre os ex-cônjuges em torno da administração do patrimônio comum para justificar o pleito judicial de acerto de contas.


É que a ação de prestação de contas não se subordina sempre e invariavelmente a um mandato entre as partes. Ao contrário, o princípio universal que domina a matéria é que todos aqueles que administram, ou têm sob sua guarda, bens alheios devem prestar contas. Daí que basta o fato de um bem achar-se, temporariamente, sob administração de outrem que não o dono, para que esse detentor tenha que dar contas da gestão eventualmente desempenhada, ainda que não precedida de acordo ou autorização por parte do proprietário.


A gestão de negócio, um dos principais fundamentos do dever de prestar contas, ocorre à revelia do dono, segundo a definição do art. 1.331 do Código Civil, razão pela qual não se pode negar ao comunheiro o direito a exigir contas do consorte que explora com exclusividade os bens comuns a pretexto de inexistência de mandato ou outro negócio jurídico entre os interessados» (in Curso de Direito Processual Civil - Procedimentos Especiais, Rio de Janeiro, Editora Forense, 1990, págs. 1.557/1.558, grifou-se).

Na mesma esteira, Adroaldo Furtado Fabrício: «a ação de prestação de contas pressupõe divergência entre as partes, seja quanto à existência mesma da obrigação de dar contas, seja sobre o estado delas, vale dizer, sobre a existência, o sentido ou o montante do saldo. O titular do bem ou interesse gerido ou administrado por outrem, assim como se legitima à propositura da ação para exigir contas, é também legitimado passivo à ação para dar contas; em contrapartida, o que administrou ou geriu tem legitimação ativa para esta ação e passiva para aquela outra» (in Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro, Forense, 2001. pág. 329).

O supracitado professor ainda ensina que


«Não há correlação necessária entre o dever jurídico de prestar contas e a situação de devedor; nem aquele a quem as contas são devidas é necessariamente credor de algum pagamento. A prestação de contas tem precisamente a finalidade de aclarar qual o estado, em determinado momento, das relações contrapostas de débito e crédito entre os interessados, de tal modo que só depois de prestadas se saberá quem há de pagar e quem tem a receber. Pode suceder que o administrador de bens ou interesses alheios, ou quem esteja em posição assemelhável a essa, seja credor do titular dos bens ou interesses, por haver despendido mais do que recebeu; nem por isso se exime da obrigação de prestar contas. Não se confunde a obrigação específica de prestar contas com a de dar ou de pagar, nem o direito a exigir contas com o direito a receber pagamento. Aquele que presta contas frequentemente o faz no interesse de apurar um saldo que supõe lhe seja favorável, a fim de colocar-se em condições de exigir o pagamento respectivo» (in Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro, Forense, 2001, págs. 387/388, grifou-se).

O Superior Tribunal de Justiça já se posicionou no sentido de que «a prestação de contas é devida por quantos administram bens de terceiros» (REsp 327.363-RS e AgRg no Ag nº 45.515/MG, Relator Ministro Barros Monteiro, e AgRg no Ag nº 33.211/SP, Relator Ministro Eduardo Ribeiro).

No caso em análise, os bens ficaram sob administração do cônjuge varão, motivo pelo qual a recorrida, casada sob regime de comunhão universal de bens, consoante disposto no art. 1.580 do Código Civil de 1916, vigente à data da separação de fato, tem direito de obter informações sobre os bens conjugais postos aos cuidados do recorrente por mais de 15 anos, obrigação que pode ser realizada por meio da ação de prestação de contas prevista no art. 914 - Capítulo IV do Título I do Livro IV - dos Procedimentos Especiais - do Código de Processo Civil, porquanto mecanismo protetor dos interesses daquele cônjuge que não se encontra na administração ou posse dos bens comuns.

Ademais, nos termos do acórdão recorrido, o cônjuge, ora recorrente, assumiu «o dever de detalhar e esclarecer os rendimentos advindos das terras arrendadas, bem como prestar as respectivas informações quanto ao patrimônio comum» (fl. 1.486 e-STJ), estando assentada a relação jurídica de direito material entre as partes, o que sequer poderia ser analisado nesta instância especial em virtude do óbice constante da Súmula 7/STJ.

No que tange ao período em que houve a ruptura da convivência conjugal, veja-se a fundamentação do acórdão recorrido:


«(...) Quanto à data reconhecida na sentença como o termo final do casamento entre as partes, cabe transcrição do parecer do representante do Ministério Público, que fica aqui integralmente adotado como fundamento da presente decisão: a sentença fundamentou com razoabilidade o termo final da convivência conjugal - 1º de janeiro de 1990 (fls. 615) - apontado pela autora e não infirmado pelo réu. À falta, ao menos, de prova indiciária da separação de fato das partes nos idos de 1981, como pretende o varão, reportando-se ao aluguel do apartamento nº 11, da rua Marquês de Sabará, onde teria permanecido durante um ano, até a compra, em março de 1982, do imóvel situado à rua Barão de Campos Gerais, nº 184, sua residência atual. Mesmo porque, como patenteado no decisum, ao adquirir o apartamento nº 81 da rua Barão de Campos Gerais, nº 184, o recorrente declarou-se casado, indicando como residência dos cônjuges o apartamento nº 11, da rua Marquês de Sabará, nº 64, nesta Capital (nº 62.339, R. 5, fls. 110 v). Daí porque, imprecisões e contradições tornam inviável a pretensão do apelante de remontar a separação de fato do caso aos idos de 1981» (fl. 1.487 e-STJ, grifou-se).

Não se desconhece a circunstância de que, na constância do casamento sob o regime de comunhão universal, os cônjuges não estão obrigados ao dever de prestar contas um ao outro dos seus negócios, haja vista a indivisibilidade patrimonial. Todavia, quando efetivamente separados, com a separação de corpos, e antes da formalização da partilha entre os consortes, quando os bens estiverem sob a administração de um deles, impõe-se reconhecer o dever de prestação de contas pelo gestor do patrimônio comum.

Confira-se acórdão da lavra da então Desembargadora do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, e atual Ministra desta Corte, Nancy Andrighi:


«PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS AJUIZADA PELA EX-ESPOSA EM FACE DO EX-MARIDO, REFERENTE A FATOS OCORRIDOS DURANTE A ESTABILIDADE DO CONVÍVIO CONJUGAL. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO RECONHECIDA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO.


A ação de prestação de contas pode ser manejada pelo ex-casal, pelos atos de gestão e administração do patrimônio comum, em uma única hipótese excepcional que ocorre com a disposição dos bens móveis e imóveis durante o período compreendido entre a separação de fato e a partilha de bens da sociedade conjugal, sem a autorização do outro cônjuge. A alienação de bens comuns durante o convívio presume-se em benefício de ambos os cônjuges, não podendo ser o ex-marido compelido a demonstrar o retorno de parte da renda auferida com a venda para a esfera de disposição de sua ex-esposa, que se mostra arrependida após a efetivação do negócio jurídico perfeito e acabado» (APELAÇÃO CÍVEL nº 453.189-7 - 0045318-45.1997.807.0000 (Res.65 - CNJ) DF, 2ª Turma Cível, julgada em 23/03/1998, DJU: 15/04/1998, Pág. 49 Seção: 3, grifou-se).

É induvidoso que aquele que detiver a posse e a administração dos bens comuns antes da efetivação do divórcio, com a consequente partilha, deve geri-los no interesse de ambos os cônjuges, sujeitando-se ao dever de prestar contas ao outro consorte, a fim de evitar eventuais prejuízos relacionados ao desconhecimento quanto ao estado dos bens comuns.

Assim, excepcionalmente, conclui-se pelo cabimento da ação de prestação de contas pelos cônjuges casados sob regime de comunhão universal, mas separados de fato, antes da formalização da dissolução conjugal. ...» (Min. Ricardo Villas Bôas Cueva).»

Doc. LegJur (123.2534.1000.2000) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
Família (Jurisprudência)
Casamento (Jurisprudência)
Cônjuge (v. Casamento ) (Jurisprudência)
Regime de comunhão universal de bens (v. Casamento ) (Jurisprudência)
Separação de fato (v. Casamento ) (Jurisprudência)
Prestação de contas (v. Casamento ) (Jurisprudência)
Partilha de bens (v. Casamento ) (Jurisprudência)
Legitimidade ativa (v. Prestação de contas ) (Jurisprudência)
CCB, art. 266
CPC, art. 3º
CPC, art. 267, VI
CPC, art. 914
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