Jurisprudência em Destaque

STJ. 2ª Seção. Consumidor. Responsabilidade por vício no produto. Inversão do ônus da prova. Inversão «ope judicis» . Momento da inversão. Preferencialmente na fase de saneamento do processo. Considerações do Min. Paulo de Tarso Sanseverino sobre o tema. CDC, arts. 6º, VIII, 12, § 3º, II, e 14, § 3º, I e 18. CPC, art. 333.

Postado por Emilio Sabatovski em 02/07/2012
... Eminentes Colegas! A controvérsia consiste em definir qual o momento processual adequado para que o juiz, na responsabilidade por vício do produto (art. 18 do CDC), determine a inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC.

A questão não é pacífica neste Superior Tribunal de Justiça, havendo divergência entre as duas Turmas que compõem a Segunda Seção (vg, AgRg nos EDcl no Ag 977.795/PR e REsp 949.000/ES, TERCEIRA TURMA; REsp 720.930/RS e REsp 881.651/BA, QUARTA TURMA).


PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO - RESPONSABILIDADE CIVIL - ACIDENTE DE TRÂNSITO - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - 2º GRAU DE JURISDIÇÃO - POSSIBILIDADE - CRITÉRIO DE JULGAMENTO.


Sendo a inversão do ônus da prova uma regra de julgamento, plenamente possível seja decretada em 2º grau de jurisdição, não implicando esse momento da inversão em cerceamento de defesa para nenhuma das partes, ainda mais ao se atentar para as peculiaridades do caso concreto, em que se faz necessária a inversão do ônus da prova diante da patente hipossuficiência técnica da consumidora que não possui nem mesmo a documentação referente ao contrato de seguro. Agravo regimental improvido.


(AgRg nos EDcl no Ag 977.795/PR, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/09/2008, DJe 13/10/2008)


RECURSO ESPECIAL. CONSUMIDOR. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. ART. 6º, VIII, DO CDC. REGRA DE JULGAMENTO.


- A inversão do ônus da prova, prevista no Art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, é regra de julgamento.


- Ressalva do entendimento do Relator, no sentido de que tal solução não se compatibiliza com o devido processo legal.


(REsp 949000/ES, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/03/2008, DJe 23/06/2008)


RECURSO ESPECIAL. GRAVIDEZ ALEGADAMENTE DECORRENTE DE CONSUMO DE PÍLULAS ANTICONCEPCIONAIS SEM PRINCÍPIO ATIVO (PÍLULAS DE FARINHA) . INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. ENCARGO IMPOSSÍVEL. ADEMAIS, MOMENTO PROCESSUAL INADEQUADO. AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL ENTRE A GRAVIDEZ E O AGIR CULPOSO DA RECORRENTE.


(...)


5. De outra sorte, é de se ressaltar que a distribuição do ônus da prova, em realidade, determina o agir processual de cada parte, de sorte que nenhuma delas pode ser surpreendida com a inovação de um ônus que, antes de uma decisão judicial fundamentada, não lhe era imputado. Por isso que não poderia o Tribunal a quo inverter o ônus da prova, com surpresa para as partes, quando do julgamento da apelação.


6. Recurso especial parcialmente conhecido e, na extensão, provido.


(REsp 720930/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/10/2009, DJe 09/11/2009)


PROCESSO CIVIL - RECURSO ESPECIAL - CONSUMIDOR - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - MOMENTO OPORTUNO - INSTÂNCIA DE ORIGEM QUE CONCRETIZOU A INVERSÃO, NO MOMENTO DA SENTENÇA - PRETENDIDA REFORMA - ACOLHIMENTO - RECURSO ESPECIAL CONHECIDO EM PARTE E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO.


- A inversão do ônus da prova, prevista no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, como exceção à regra do artigo 333 do Código de Processo Civil, sempre deve vir acompanhada de decisão devidamente fundamentada, e o momento apropriado para tal reconhecimento se dá antes do término da instrução processual, inadmitida a aplicação da regra só quando da sentença proferida.


- O recurso deve ser parcialmente acolhido, anulando-se o processo desde o julgado de primeiro grau, a fim de que retornem os autos à origem, para retomada da fase probatória, com o magistrado, se reconhecer que é o caso de inversão do ônus, avalie a necessidade de novas provas e, se for o caso, defira as provas requeridas pelas partes.


- Recurso especial conhecido em parte e, na extensão, provido.


(REsp 881651/BA, Rel. Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, QUARTA TURMA, julgado em 10/04/2007, DJ 21/05/2007 p. 592)

Estabelecida a vexata quaestio, resta que se tome posição a seu respeito.

Já tive oportunidade de analisar essa delicada questão processual em sede doutrinária (Responsabilidade Civil no Código do Consumidor e a Defesa do Fornecedor, 3ª edição. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 355/357).

Inicialmente, deve-se estabelecer uma diferenciação entre duas modalidades de inversão do ônus da prova previstas pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), podendo ela decorrer da lei (ope legis) ou de determinação judicial (ope judicis).

Na primeira hipótese, a própria lei – atenta às peculiaridades de determinada relação jurídica – excepciona previamente a regra geral de distribuição do ônus da prova. Constituem exemplos dessa situação as hipóteses previstas pelos enunciados normativos dos arts. 12, §3º, II, e 14, §3º, I, do CDC, atribuindo ao fornecedor o ônus de comprovar, na responsabilidade civil por acidentes de consumo - fato do produto (art. 12) ou fato do serviço (art. 14), a inexistência do defeito, encargo que, segundo a regra geral do art. 333, I, do CPC, seria do consumidor demandante.

Nessas duas hipóteses, não se coloca a questão de estabelecer qual o momento adequado para a inversão do ônus da prova, pois a inversão foi feita pelo próprio legislador (ope legis) e, naturalmente, as partes, antes mesmo da formação da relação jurídico-processual, já devem conhecer o ônus probatório que lhe foi atribuído por lei.

A segunda hipótese prevista pelo CDC, que é a discutida no presente processo, mostra-se mais tormentosa, pois a inversão resulta da avaliação casuística do magistrado, que a poderá determinar uma vez verificados os requisitos legalmente previstos, como a verossimilhança. e a hipossuficiência. a que refere o enunciado normativo do art. 6º, VIII, do CDC.

Nestes casos, de que é exemplo marcante a situação retratada nos autos, relativo à responsabilidade por vício no produto (art. 18 do CDC), surge a questão de se estabelecer qual o momento processual mais adequado para que o juiz, verificando a presença dos pressupostos legais, determine a inversão da distribuição do ônus probatório.

A este respeito, embora diante da responsabilidade pelo fato do produto – em que a inversão do ônus da prova, ao meu sentir, advém automaticamente da própria lei (ope legis) –, esta Terceira Turma, no REsp 422.778/SP, leading case do atual entendimento, entendeu possível a utilização, no momento do julgamento, do art. 6º, VIII, do CDC (ope judicis):


Recurso especial. Civil e processual civil. Responsabilidade civil. Indenização por danos materiais e compensação por danos morais. Causa de pedir. Cegueira causada por tampa de refrigerante quando da abertura da garrafa. Procedente. Obrigação subjetiva de indenizar. Súmula 7/STJ. Prova de fato negativo. Superação. Possibilidade de prova de afirmativa ou fato contrário. inversão do ônus da prova em favor do consumidor. regra de julgamento. Doutrina e jurisprudência.arts. 159 do CC/1916, 333, I, do CPC e 6º, VIII, do CDC.


(...)


- Conforme posicionamento dominante da doutrina e da jurisprudência, a inversão do ônus da prova, prevista no inc. VIII, do art. 6º do CDC é regra de julgamento. Vencidos os Ministros Castro Filho e Humberto Gomes de Barros, que entenderam que a inversão do ônus da prova deve ocorrer no momento da dilação probatória.


Recurso especial não conhecido.


(REsp 422778/SP, Rel. Ministro CASTRO FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/06/2007, DJ 27/08/2007 p. 220)

Considerou-se que o ônus da prova, por ser regra de julgamento, poderia – e deveria – ter a sua inversão determinada na sentença, único momento processual em que a distribuição do encargo probatório possuiria sentido e relevância.

Não se desconhece que as normas relativas ao ônus da prova constituem, também, regra de julgamento para se evitar o non liquet do Direito Romano, pois as consequências da não-comprovação de fato ou circunstância relevante para o julgamento da causa devem, quando da decisão, ser atribuídas à parte a quem incumbia o ônus da sua prova.

Nada obstante, entendo ser este somente um dos aspectos relevantes da distribuição do ônus da prova. Trata-se do aspecto objetivo, dirigido ao juiz.

Não se pode olvidar, porém, que o aspecto subjetivo da distribuição do ônus da prova mostra-se igualmente relevante.

Pelo aspecto subjetivo ou – na doutrina de Barbosa Moreira (Temas de direito processual civil: segunda série. São Paulo: Saraiva, 1980, p. 74) – formal do ônus da prova, ele se apresenta, conforme destacado por Fredier Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira (Curso de direito processual civil, vol. 2, 4ª Edição. Editora Juspodivm. Salvador: 2009, p. 74), como uma regra de conduta para as partes. ou ainda, nos dizeres de Daniel Mitidiero (Colaboração no processo civil: pressupostos sociais, lógicos e éticos. São Paulo: 2009, p. 125), como uma norma de instrução.

A distribuição do ônus da prova apresenta extrema relevância de ordem prática, norteando, como uma verdadeira bússola, o comportamento processual das partes. Naturalmente, participará da instrução probatória com maior vigor, intensidade e interesse a parte sobre a qual recai o encargo probatório de determinado fato controvertido no processo.

Exatamente isso pode ser verificado no caso dos autos, pois o fornecedor do produto considerado viciado pelo recorrente desistiu da produção das provas testemunhal e pericial que havia requerido, comportamento que certamente não adotaria se soubesse – antes da sentença – que sobre si recairia o ônus probatório.

Influindo a distribuição do encargo probatório decisivamente na conduta processual das partes, devem elas possuir a exata ciência do ônus atribuído a cada uma delas para que possam, com vigor e intensidade, produzir oportunamente as provas que entenderem necessárias.

Do contrário, permitida a distribuição, ou a inversão, do ônus probatório na sentença e inexistindo, com isto, a necessária certeza processual, haverá o risco do julgamento ser proferido sob uma deficiente e desinteressada instrução probatória, na qual ambas as partes tenham atuado com base na confiança de que sobre elas não recairá o encargo da prova de determinado fato.

De outro lado, o argumento de que a simples previsão legal da inversão ope judicis já seria suficiente para alertar as partes acerca da possibilidade da sua utilização pelo juiz quando da prolação da sentença desconsidera a distinção inicialmente referida, entre inversão ope judicis e ope legis.

Expressão dessa tendência de se conferir cada vez mais relevo ao aspecto subjetivo do ônus da prova é o Projeto de Código de Processo Civil, elaborado pela Comissão presidida pelo eminente Min. Luiz Fux (Projeto 166, de 2010, em tramitação no Senado Federal), cujo enunciado normativo do art. 262, §1º, dispõe que a dinamização do ônus da prova será sempre seguida de oportunidade para que a parte onerada possa desempenhar adequadamente seu encargo.

Assim, a inversão ope judicis do ônus da prova deve ocorrer preferencialmente no despacho saneador, ocasião em que o juiz decidirá as questões processuais pendentes e determinará as provas a serem produzidas, designando audiência de instrução e julgamento. (art. 331, §§ 2º e 3º, do CPC).

Desse modo, confere-se maior certeza às partes acerca dos seus encargos processuais, evitando-se a insegurança.

Com estas considerações, pedindo vênia aos eminentes Colegas que perfilham orientação contrária, esposo o entendimento sufragado pela Quarta Turma deste Tribunal (v.g¸ REsp 881.651/BA e REsp 720.930/RS, QUARTA TURMA), votando por negar provimento ao recurso especial para manter o acórdão que desconstituiu a sentença que determinara, nela própria, a inversão do ônus da prova.

Deverão os autos retornar ao juízo de primeiro grau para que, mantido o seu entendimento acerca da necessidade de inversão do ônus da prova, reabra a oportunidade para indicação de provas e realize a fase de instrução do processo.

Em síntese, nego provimento ao recurso especial. ... (Min. Paulo de Tarso Sanseverino).

Doc. LegJur (124.3555.3000.4400) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
Consumidor (Jurisprudência)
Responsabilidade por vício no produto (v. Consumidor ) (Jurisprudência)
Prova (Jurisprudência)
Ônus da prova (v. Consumidor ) (Jurisprudência)
Inversão do ônus da prova (v. Consumidor ) (Jurisprudência)
Inversão ope judicis (v. Consumidor ) (Jurisprudência)
Saneamento do processo (Jurisprudência)
CDC, art. 6º, VIII
CDC, art. 12, § 3º, II
CDC, art. 14, § 3º, I
CDC, art. 18
CPC, art. 333
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