Jurisprudência em Destaque

STJ. 4ª T. Execução. Hipoteca. Ônus hipotecário. Pedido de preferência. Penhora não registrada. Alegação de fraude à execução. Inexistência de inscrição da penhora. Boa-fé presumida do credor hipotecário. Violação dos arts. 167, 169 e 240 da Lei 6.015/1973. CPC, arts. 593, 659, § 4º, 709 e 711. Hipótese anterior à Lei 8.953/1994. Considerações do Min. João Otávio de Noronha sobre o tema. Precedentes do STJ. Súmula 375/STJ. CCB, arts. 759 e 1.557.

Postado por Emilio Sabatovski em 23/07/2012
... Fernando Antônio de Oliveira Alves ajuizou ação de execução em desfavor de Luiz Edésio Cavenaghi, na qual foi realizada penhora sobre bem imóvel em setembro de 1992. Contudo, em 3 de dezembro de 1993 (mais de um ano depois), o executado ofertou o bem penhorado em garantia à CEF, gravando-o com ônus hipotecário.

Em razão disso, a CEF, em março de 1995, aviou petição ao juízo da execução, requerendo preferência sobre o fruto da venda judicial do bem penhorado, fundando seu pedido nos artigos 759 e 1.557 do Código Civil de 1916 (vigente à época).

Assim, aquele juízo reconheceu que o bem foi gravado com ônus hipotecário em flagrante fraude à execução, indeferindo o pedido de preferência formulado pela CEF. O Tribunal a quo manteve a decisão ao entendimento de que deveria o credor hipotecário ter cuidado de extrair certidão no distribuidor cível.

Daí o recurso especial, no qual a CEF sustenta que foram vulneradas as disposições dos artigos 167, 169 e 240 da Lei 6.015/73 e 711 do Código de Processo Civil. Afirma que inexistia registro de penhora no cartório competente, fato que afasta a tese da fraude, porquanto não foi dado a conhecer tal constrição.

O Ministro Luiz Felipe Salomão, em um bem elaborado voto, concluiu por não conhecer do recurso. Seu entendimento pode ser sintetizado no seguinte:


... é da própria natureza da penhora que decorre a ineficácia de atos de disposição ou oneração do bem penhorado, e não do seu registro, mesmo porque em certos casos este não é possível, como na penhora de bens móveis, de direitos e de ações..

Todavia, creio que as circunstâncias identificadas nos autos merecem conclusões distintas.

A questão que ora se apresenta é simples e sobejamente conhecida no âmbito desta Corte, qual seja: o registro da penhora é pressuposto à configuração de fraude na alienação de bem imóvel penhorado em ação de execução?

O registro da penhora de bem imóvel tem sido exigida no Código de Processo Civil deste 1994, quando a Lei 8.953/94 acrescentou o parágrafo 4º ao artigo 659. Depois vieram as Leis 10.444, de 2002, e 11.382, de 2006, todas atribuindo redação específica ao § 4º do art. 659.

Em dezembro de 1994, a redação do dispositivo era a seguinte:


§ 4º A penhora de bens imóveis realizar-se-á mediante auto ou termo de penhora, e inscrição no respectivo registro.

Em relação a este dispositivo, a jurisprudência desta Corte conferia-lhe interpretação literal. Observe-se:


PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. ALEGAÇÃO DE FRAUDE À EXECUÇÃO. ALIENAÇÃO NA PENDÊNCIA DE EXECUÇÃO. INEXISTÊNCIA DE INSCRIÇÃO DA PENHORA. BOA-FÉ PRESUMIDA DO ADQUIRENTE. Lei 8.953/94. CPC, ART. 593, II.


I. Nos termos do art. 659 do CPC, na redação que lhe foi dada pela Lei 8.953/94, exigível a inscrição da penhora no cartório de registro imobiliário para que passe a ter efeito erga omnes e, nessa circunstância, torne-se eficaz para impedir a venda a terceiros em fraude à execução.


II. Caso em que, à míngua de tal requisito, a alienação, ainda que posterior à citação da empresa alienante na ação de execução, é eficaz.


III. Precedentes do STJ.


IV. Recurso especial conhecido e provido.(Quarta Turma, REsp 509.827/SP, relator Ministro Aldir Passarinho Júnior, DJ de 24/2/2003.)

Mesmo antes da referida lei, este Tribunal já adotava majoritariamente o entendimento de que a penhora deveria ser registrada:


Embargos de Terceiro. Bem penhorado. Ausência de registro. Hipótese anterior à vigência da Lei 8.953/94.


Não registrada a penhora, a ineficácia da venda, em relação à execução, depende de se demonstrar que o adquirente, que não houve o bem diretamente do executado, tinha ciência da constrição.


Prevalência da boa-fé. (Terceira Turma, REsp 225.091/GO, rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ de 28.8.2000.)

Vê-se, portanto, que, na falta do registro, a jurisprudência adotara um caminho alternativo para a apuração da fraude à execução, impondo ao credor o ônus de provar que o adquirente tinha ciência da constrição que pesava sobre o imóvel:


EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. FRAUDE À EXECUÇÃO. REQUISITOS. ACÓRDÃO EMBARGADO EM CONSONÂNCIA COM ENTENDIMENTO DESTA CORTE. SÚMULA 168/STJ.


1 - O acórdão embargado em consonância com o entendimento pacífico desta Corte assevera que ante a ausência do registro da penhora a decretação de fraude à execução depende da prova do conhecimento, por parte do adquirente do imóvel, de ação pendente contra o devedor capaz de reduzi-lo à insolvência. Incidência da súmula 168/STJ.


2 - Agravo regimental desprovido. (Segunda Seção, AgRg nos EREsp 719.949/RS, Min. Fernando Gonçalves, DJ de 8.11.2007.)

Essa diretriz visava proteger o terceiro de boa-fé, que, à falta do registro da penhora, não tem meios para saber da existência de execução ou de ato constritivo judicial.

E, não se diga, como fez o acórdão recorrido, que o credor hipotecário, in casu, deveria ter corrido os distribuidores cíveis, porquanto isso é exigência anódina, uma vez que apenas informa o credor da existência de ação na específica localidade, sem informações outras sobre os trâmites processuais e, muito menos, acerca de eventual penhora.

Atualmente, o entendimento neste Tribunal é pacífico, externado por meio da Súmula 375: O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente.

Portanto, rogando vênia ao Relator, o entendimento posto em seu voto acerca da natureza e dos efeitos do ato de penhora colide com o entendimento desta Corte, até porque esse entendimento jurisprudencial foi firmado considerando-se os aspectos legais, formais e materiais que envolvem a penhora.

Desenvolvendo um pouco mais a questão, em atenção às questões propostas no voto do Ministro Relator, não se olvida de que um dos efeitos da penhora perante o próprio devedor é a perda da posse direta (mesmo que o devedor seja o depositário, porquanto passa a ocupar a posição de detentor) e a perda da disponibilidade do bem penhorado, mas não de forma total, pois continua a ter o domínio da coisa, podendo dela dispor, em que pese tal disposição ser ineficaz em relação ao credor exeqüente.

Humberto Theodoro Júnior, sobre a relação de dominialidade do bem penhorado, elucida:


Juridicamente, portanto, nada impede que o executado venda, doe, permute, onere seu direito sobre o bem penhorado, pois nada obstante o efeito da penhora não se exerce sobre o direito (substancial) do credor, nem correlativamente, sobre a obrigação (substancial) do devedor a respeito dele; senão sobre a responsabilidade do devedor, correlativamente, sobre ação (executiva) do credor, a qual pode continuar exercitando-se como se o devedor não houvesse disposto o bem penhorado; portanto, a penhora atua em prejuízo de terceiros que tenham adquirido um direito real ou pessoal, ou ainda somente um privilégio, sobre o bem penhorado, no sentido de que, não obstante tal aquisição, o bem continua submetido à expropriação em prejuízo do terceiro e em favor do credor exeqüente e dos credores intervenientes.. (Curso de Direito Processual Civil, volume II, 41ª edição, pág. 296.)

Portanto, não há duvida de que a perfectibilização da penhora independe do seu registro e, nesse ponto, correto, a meu entender, o ilustre relator. Contudo, as disposições do parágrafo 4º do art. 659 do Código de Processo Civil exigem o registro da penhora a fim de salvaguardar direitos tanto do credor como de terceiros, pois, por meio do registro, a presunção do conhecimento da constrição sobre o imóvel é absoluta. E a importância disso está em que a alienação promovida em sede de fraude à execução é considerada ineficaz, porquanto não pode o adquirente alegar boa-fé por desconhecimento do gravame. Em razão disso é que a jurisprudência dominante nesta Corte, mesmo antes da Lei 8.953/94, já era no sentido de que o reconhecimento da fraude dependia de prévio registro.

E, como é de interesse do credor, a redação atual do artigo imputa a ele mesmo a responsabilidade pela efetivação do registro (atualmente averbação), de forma que a demora pode ser-lhe prejudicial caso tenha de se ver em meio a litígios em relação à alienação do bem penhorado, porque, nessa hipótese, terá de provar a má-fé do adquirente.

O próprio Humberto Theodoro Júnior, citado acima e também pelo i. Relator, deslinda a questão da seguinte forma:


Quando o Código atual entrou em vigor, estabeleceu-se uma divergência de orientação normativa entre sua disciplina traçada para a penhora de bem imóvel e as exigências da Lei de Registro Públicos. Esta considerava obrigatório o registro da penhora para produzir efeito contra terceiros (art. 240), enquanto o Código de Processo Civil dispunha que se devia considerar feita a penhora mediante a apreensão e depósito dos bens, seguindo-se a lavratura do auto, sem qualquer exigência registral (art. 664).


(...)


Com a superveniência da Lei 8.953, de 13.12.94, acrescentou-se o § 4º ao art. 659 do Código de Processo Civil, tornando obrigatório o registro da penhora de imóvel no Registro Público competente. A dúvida, porém, continuou, porque não estava claro na inovação legislativa se o registro tinha função no aperfeiçoamento do ato processual da penhora, ou se seu objetivo era apenas o da publicidade contra terceiros.


A Lei 10.444, de 07.05.02, enfrentou o tema e, ao alterar o texto do § 4º do citado art. 659, deixou bem claro:


o ato de penhora sobre imóvel, para o processo, se aperfeiçoa com a lavratura do respectivo auto ou termo;


ao credor, e não ao juízo, incumbe providenciar o registro do gravame processual...;


o objetivo do registro é a publicidade erga omnes da penhora, de sorte a produzir presunção absoluta de conhecimento por terceiros. Quer isto dizer que, estando registrada a penhora, o eventual adquirente do imóvel constrito jamais poderá argüir boa-fé para se furtar aos efeitos da aquisição em fraude de execução. A presunção estabelecida pela lei é iuris et de jure


(...)


Havendo negligência a respeito do registro, a eventual alienação do bem penhorado ficará na incerteza da ocorrência ou não de boa-fé do adquirente. A fraude de execução só acontecerá se o adquirente a título oneroso tiver, efetivamente, conhecimento do gravame judicial. Sem o registro não se pode presumir sua má-fé, pois, ao contrário, o que de ordinário se presume é a boa-fé. Em outros termos, o exeqüente que não registra a penhora de imóvel do devedor cria para o terceiro de boa-fé, que negocia a sua compra junto ao legítimo dono, uma aparência que impedirá a configuração de fraude de execução. (obra citada, págs. 297/298).

Portanto, não havendo registro da penhora, entendo que o gravame nos autos discutido não pode ser considerado ineficaz em relação ao credor da execução, e, justamente, porque não havia registro de penhora, não se pode presumir que a recorrente, Caixa Econômica Federal, agiu de má-fé ao gravar o bem penhorado com garantia hipotecária, inclusive, como se viu, trata-se de presunção iuris et de jure. A propósito, confira-se este julgado:


PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PENHORA EM IMÓVEL. INEXISTÊNCIA DE REGISTRO EM CARTÓRIO. INEXISTÊNCIA DE FRAUDE. TRANSAÇÃO VÁLIDA. SÚMULA Nº 84/STJ. PRECEDENTES.


1. Recurso especial interposto contra acórdão que reconheceu não ter ocorrido fraude à execução, já que à época em que celebrada a venda do imóvel, não havia registro da penhora no cartório imobiliário.


2. O art. 129, § 9º, da Lei 6.015/73 dispõe que: Estão sujeitos a registro, no Registro de Títulos e Documentos, para surtir efeitos em relação a terceiros: § 9º Os instrumentos de cessão de direitos e de créditos, de sub-rogação e de dação em pagamento.


3. Todavia, sobrelevando a questão de fundo sobre a questão da forma, a jurisprudência desta Casa Julgadora, como técnica de realização da justiça, tem imprimido interpretação finalística à Lei de Registros Públicos. Tal característica está assente na Súmula 84/STJ: É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro.


4. O CTN nem o CPC, em face da execução, não estabelecem a indisponibilidade de bem alforriado de constrição judicial. A pré-existência de dívida inscrita ou de execução, por si, não constitui ônus erga omnes, efeito decorrente da publicidade do registro público. Para a demonstração do consilium fraudis não basta o ajuizamento da ação. A demonstração de má-fé, pressupõe ato de efetiva citação ou de constrição judicial ou de atos repersecutórios vinculados a imóvel, para que as modificações na ordem patrimonial configurem a fraude. Validade da alienação a terceiro que adquiriu o bem sem conhecimento de constrição já que nenhum ônus foi dado à publicidade. Os precedentes desta Corte não consideram fraude de execução a alienação ocorrida antes da citação do executado alienante. (EREsp 31321/SP, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ de 16/11/1999).


5. Não há que se falar em fraude contra credores se, quando da alienação do bem, não havia registro de penhora. Para tanto, teria que restar nos autos provado que o terceiro adquirente tinha conhecimento da demanda executória, o que não ocorreu no caso em apreço. Precedentes.


6. Recurso especial não-provido. (Primeira Turma, REsp 791.104/PR, Min. José Delgado, DJ de 6.2.2006.)

Com base nisso, conheço do recurso especial ante a flagrante violação dos dispositivos da Lei de Registro Públicos, não dissonantes do 659, § 4º, do Código de Processo Civil, em relação à exigência de registro.

VOTO, portanto, para dar provimento ao recurso especial e determinar que a entrega do dinheiro seja feita na forma estabelecida nos artigos 709 e seguintes do Código de Processo Civil. ... (Min. João Otávio de Noronha).

Doc. LegJur (124.7663.0000.1700) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
Execução (Jurisprudência)
Hipoteca (Jurisprudência)
Ônus hipotecário (v. Hipoteca ) (Jurisprudência)
Pedido de preferência (v. Hipoteca ) (Jurisprudência)
Penhora (Jurisprudência)
Penhora não registrada (v. Penhora ) (Jurisprudência)
Fraude à execução (Jurisprudência)
Inscrição da penhora (v. Penhora ) (Jurisprudência)
Boa-fé (Jurisprudência)
Credor hipotecário (v. Boa-fé ) (Jurisprudência)
(Legislação)
(Legislação)
(Legislação)
CPC, art. 593
CPC, art. 659, § 4º
CPC, art. 709
CPC, art. 711
(Legislação)
CCB, art. 759
CCB, art. 1.557
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