Jurisprudência Selecionada

Doc. LEGJUR 526.2020.1700.9424

1 - TJRJ Apelação criminal defensiva. Condenação por crime de ameaça e por contravenção penal de vias de fato, em concurso material e praticado no contexto de violência doméstica. Apelação defensiva objetivando a solução absolutória, por alegada insuficiência probatória, por atipicidade do crime de ameaça, e, em relação a contravenção penal, por excludente de ilicitude de legítima defesa. Subsidiariamente, requer a revisão da pena, a redução do período de prova da suspensão da pena, a alteração da condição do sursis, para que o comparecimento seja bimestral e a proibição de ausência do Estado sem autorização judicial só seja exigida quando por mais de 30 dias, a exclusão da participação em grupo reflexivo, o afastamento da condenação por dano moral ou a redução para em um salário mínimo. Mérito que se resolve parcialmente em favor do Recorrente. Positivação da materialidade e autoria. Prova inequívoca de que o Apelante, consciente e voluntariamente, praticou vias de fato contra a vítima, sua ex-companheira, ao empurrá-la, fazendo-a cair no chão. Ato contínuo, a vítima afirmou que iria denunciá-lo e o recorrente lhe ameaçou, dizendo que se caso o fizesse, iria «meter-lhe a porrada". Ofendida que registrou ocorrência noticiando que ela e o réu tiveram uma discussão acerca da ajuda financeira dispensada ao filho menor que possuem em comum, momento em que o apelante a empurrou e ela veio a cair ao chão. Logo após, a vítima afirmou que iria denunciá-lo, e o recorrente, imediatamente, lhe afirmou que se caso o fizesse, iria «meter-lhe a porrada". Palavra da mulher-ofendida que, em crimes praticados em âmbito doméstico, tende a assumir caráter probatório destacado. Testemunha ocular dos fatos, mãe do réu, que ratificou integralmente a versão da Ofendida. Recorrente que, na DP, negou a ameaça e admitiu ter empurrado a Vítima. Em juízo, o réu confirmou ter ameaçado e empurrado a vítima, mas tentou minimizar a gravidade da conduta ao sustentar ter agido após ser agredido pela Ofendida, sem qualquer contraprova. Conjunto probatório apto a suportar a versão restritiva. Tipo contravencional que «compreende o exercício de violência ou força física de uma pessoa contra a outra, sem o intuito de causar lesões corporais, as quais não são produzidas. É o ato violento contra a pessoa com a intenção de causar mal físico, mas sem a cogitação ou produção de lesões corporais (Alamiro Veludo), ciente de que «a perícia não é indispensável para a comprovação da contravenção de vias de fato, ou mesmo do crime de lesões corporais, cuja materialidade pode ser demonstrada por outros meios, inclusive pela prova testemunhal (STJ). Tese de legítima defesa que se mostra incabível. Firme orientação da jurisprudência no sentido de atribuir à Defesa o ônus de comprovar a incidência de qualquer hipótese que exclua a tipicidade ou a concreção de eventual tipo permissivo ou de exculpação (CPP, art. 156). Legítima defesa real, enquanto causa excludente de ilicitude, que reclama prova da injusta agressão, utilização moderada dos meios eficazes e suficientes a repelir essa agressão, além da atualidade ou iminência da violência. Agressão perpetrada pelo réu em resposta à prévia discussão verbal entre ambos que evidenciam, por si sós, o excesso doloso punível, caracterizado pelo emprego de meio desnecessário e imoderado para repelir a agressão (verbal). Crime de ameaça igualmente configurado. Tipo legal que encerra a definição de «crime formal e instantâneo, que se consuma independentemente do resultado lesivo objetivado pelo agente, pelo que «basta para a sua caracterização que a ameaça seja idônea e séria, com vontade livre e consciência de incutir temor na vítima, sendo irrelevante o estado emocional desequilibrado no momento dos fatos". Injusto frente ao qual «não se exige qualquer elemento subjetivo específico (Nucci). Presença inquestionável do dolo da conduta do Réu, a qual, em tema de tipo penal congruente, se interliga com a manifestação volitiva natural, com o desejo final do agir, traduzindo-se pela simples consciência e vontade de realizar os elementos objetivos previstos, em abstrato, no modelo legal incriminador, ciente de que o mesmo «não fica excluído quando o sujeito ativo procede sem ânimo calmo e refletido, «porquanto a exaltação de ânimo não impede o reconhecimento do crime de ameaça, nos termos do CP, art. 28, I, o qual assevera que a emoção não é causa de exclusão do crime (TJERJ). Concreção dos injustos imputados, mediante reunião de todos os seus elementos constitutivos, unidos sob o signo do CP, art. 69. Juízos de condenação e tipicidade irreparáveis. Dosimetria que comporta pontual ajuste. Pena-base que encerra idônea majoração, considerando que, na linha do STJ, «condutas praticadas na presença do filho menor do Paciente - fundamento esse que não é ínsito ao tipo penal e, portanto, é idôneo e apto a alicerçar maior desvalor aos atos praticados". Decote da negativação da pena-base atrelado ao histórico de agressão e violência doméstica relatada pela vítima e valorado a título de má conduta social, já que tal situação tende a configurar eventual crime em tese, frente ao qual o apelante não foi formalmente acusado (nulla poena sine judicio). Correta incidência da agravante do CP, art. 61, II, f, ciente de que «não há bis in idem na aplicação da causa especial de aumento de pena pelo fato de o crime ser cometido com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher, em caso de crimes processados sob o rito da Lei Maria da Penha, pois a agravante foi acrescida pela própria Lei 11.340/2006, com o intuito de recrudescer a punição pelos delitos de que trata. (STJ). Confissão, mesmo que parcial, justificante ou retratada em juízo, que se reconhece na forma da Súmula 545/STJ, para ambos delitos. Firme orientação do STJ no sentido de se quantificar, nas primeiras fases de depuração, segundo a fração de 1/6, sempre proporcional ao número de incidências, desde que a espécie não verse (como é o caso) sobre situação de gravidade extravagante. Pena-base individual redimensionada segundo a fração de 1/6. Compensação prática que se reconhece entre a agravante do CP, art. 61, II, f e a atenuante de confissão (STJ), para ambos os delitos, com manutenção do regime prisional aberto. Redimensionamento da pena que impõe a acolhida do pleito de redução do período de prova do sursis, a qual fixo em dois anos. Pedido de alteração das condições do sursis, objetivando o comparecimento bimestral e para que a proibição de se ausentar do Estado sem autorização do juiz só seja exigida quando por mais de 30 dias, que não merece guarida. Defesa que não trouxe qualquer argumento relevante e devidamente comprovado que amparasse tal pedido, como, por exemplo, prejuízo comprovado às atividades laborais. Condições do sursis validamente fixadas pelo juiz, guardando pertinência concreta e exibindo proporcionalidade ao caso presente. Imposição de frequência a grupo reflexivo que, exibindo pertinência temática concreta, pode ser estabelecido como condição judicial do sursis (CP, art. 79). Condenação a título de danos morais que se afasta, ante a ausência de pedido de aplicação do CPP, art. 387, IV, na denúncia. Recurso parcialmente provido, para redimensionar a sanção final para em 01 (um) mês e 05 (cinco) dias de detenção e 17 (dezessete) dias de prisão simples, reduzir o período de prova do sursis para dois anos e excluir a condenação referente ao pagamento do valor de dois mil reais, a título de reparação de danos morais.

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