Jurisprudência Selecionada

Doc. LEGJUR 987.5434.8580.0988

1 - TJRJ APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO EM CONCURSO FORMAL. RÉU CONDENADO COMO INCURSO NAS SANÇÕES DOS LEI 11.343/2006, art. 33 e LEI 11.343/2006, art. 35 AO CUMPRIMENTO DA PENA DE 9 (NOVE) ANOS E 4 (QUATRO) MESES DE RECLUSÃO EM REGIME FECHADO E 1399 (MIL TREZENTOS E NOVENTA E NOVE) DIAS-MULTA. RECURSO DA DEFESA QUE ALEGA E PRETENDE: I) NULIDADE DA BUSCA PESSOAL REALIZADA; II) NULIDADE POR SUPOSTA QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA; III) NULIDADE DA CONFISSÃO INFORMAL POR SUPOSTA VIOLAÇÃO DO DIREITO AO SILÊNCIO; IV) ABSOLVIÇÃO QUANTO AOS CRIMES IMPUTADOS; V) ABSOLVIÇÃO QUANTO AO CRIME DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO; VI) SUBSIDIARIAMENTE, REQUER: A) REFORMA NA DOSIMETRIA DA PENA; B) AFASTAMENTO DA AGRAVANTE DO ART. 61, II, ALÍNEA «J, DO CÓDIGO PENAL (PANDEMIA); C) APLICAÇÃO DA MINORANTE CONSTANTE DO Lei 11.343/2006, art. 33, § 4º (TRÁFICO PRIVILEGIADO); D) SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS.

De início, registra-se que as preliminares alegadas pela Defesa serão analisadas juntamente com a prova produzida, haja vista a profunda relação entre as mencionadas alegações e o acervo probatório. A denúncia dá conta de que no dia 19 de novembro de 2021, por volta das 14 horas e 30 minutos, na Rua Francisco Guimarães Neves, esquina com a Rua Doutor Vicente Goulart, bairro Vila Norma, comarca de São João de Meriti, o denunciado, de forma livre, consciente e voluntária, trazia consigo, para fins de tráfico, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, 112g (cento e doze gramas) da substância entorpecente Cannabis sativa L. popularmente conhecida como maconha, acondicionados em 68 (sessenta e oito) invólucros plásticos e transparentes, vulgarmente conhecidos como «sacolé, contendo as inscrições «VN C.V $5 A BRABA VILA JURANDI 10"; 5,70g (cinco gramas e setenta decigramas) da substância entorpecente Cloridrato de Cocaína em pedra, popularmente conhecida como CRACK, acondicionados em 67 (sessenta e sete) invólucros plásticos e transparentes, vulgarmente conhecidos como «sacolé, contendo as inscrições «VILA NORMA CRACK 5 C.V, além de 22,20 (vinte e dois gramas e vinte decigramas da substância entorpecente Cloridrato de Cocaína em pó, acondicionados em 50 (cinquenta) invólucros plásticos e transparentes, conhecidos como «eppendorf, contendo as inscrições «VILA NORMA PÓ 5/15 C.V, conforme laudo de exame em material entorpecente. A peça exordial ainda dá conta de que em data que não se pode precisar, sendo certo que até o dia 19 de novembro de 2021, o denunciado, de forma livre e consciente, associou-se a indivíduos ainda não identificados, todos pertencentes à facção criminosa Comando Vermelho, que domina a localidade, unindo recursos e esforços para a prática do tráfico de drogas naquela Comarca. Do compulsar dos autos vê-se que a materialidade, como a autoria dos delitos imputados ao réu restaram evidenciadas pelo registro de ocorrência, auto de prisão em flagrante, auto de apreensão, laudo de exame definitivo de material entorpecente, termos de declarações, laudo de exame de descrição de material (rádio comunicador), bem como pela prova oral colhida sob o crivo do contraditório. O réu não foi interrogado, ante o decreto de revelia, dado que, intimado, não compareceu ao ato. Rejeita-se arguição de ausência de fundadas suspeitas e nulidade para busca pessoal. Como é de conhecimento, a Corte Cidadã possui entendimento no sentido de que, «se não havia fundadas suspeitas para a realização de busca pessoal no acusado, não há como se admitir que a mera constatação de situação de flagrância, posterior à revista do indivíduo, justifique a medida. Assim, o fato de o acusado se amoldar ao perfil descrito em denúncia anônima e ter empreendido fuga ante a tentativa de abordagem dos policiais militares, não justifica, por si só, a invasão da sua privacidade, haja vista a necessidade de que a suspeita esteja fundada em elementos concretos que indiquem, objetivamente, a ocorrência de crime no momento da abordagem, enquadrando-se, assim, na excepcionalidade da revista pessoal". (HC 625.819/SC, Rel. Min. NEFI CORDEIRO, Sexta Turma, DJe de 26/2/2021)". Todavia, no caso em exame, após a análise dos depoimentos prestados em juízo sob o manto das garantias constitucionais, observa-se que nenhuma ilegalidade foi cometida pelos agentes da lei. Os policiais esclareceram que estavam em patrulhamento em local conhecido pela mercancia de material entorpecente. Avistaram três elementos que empreenderam fuga. Pois bem, diante de tal atitude evasiva, em local de mercancia de drogas, os policiais foram ao encontro dos elementos em fuga e, como o réu correu com a mochila nas costas e não conseguiu pular os muros, tal qual os outros, eles lograram êxito em abordar o ora apelante e encontraram o material entorpecente e o rádio transmissor na mochila que o réu portava. A busca pessoal não se fundou apenas em uma simples suposição, conforme sugerido pela defesa, restando configurada fundada suspeita exigida pela norma processual. Igualmente, está afastada a arguição de nulidade por suposta quebra da cadeia de custódia. Isso porque o instituto da cadeia de custódia (art. 158A usque CPP, art. 158F) diz respeito à idoneidade do caminho que deve ser percorrido pela prova até sua análise pelo juízo competente, sendo certo que a defesa não apresentou qualquer argumento hábil a demonstrar de que maneira haveria ocorrido a quebra e a consequente mácula a ensejar a exclusão dos elementos de prova obtidos a partir da operação policial, ou seja, não há qualquer indício, ainda que mínimo, de adulterações, supressões, fraude etc. no transporte da prova desde sua arrecadação até sua valoração. Portanto, não há qualquer indício de que haja sido comprometida a idoneidade do material arrecadado, devendo ser observado o princípio do pas de nulité sans grief (não há nulidade sem prejuízo). Nesse sentido, vide AgRg no RHC 153.823/RS, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 28/9/2021, DJe de 4/10/2021). Afasta-se, por seu turno, a arguição de nulidade da confissão informal por suposta violação do direito ao silêncio. Sabe-se que o suspeito possui direitos fundamentais que devem ser observados mesmo no curso da investigação, dentre os quais o direito de não produzir provas contra si. Todavia, igualmente se reconhece que as provas são renovadas em juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Assim, em que pese a declaração dos policiais no sentido de que o apelante confessou informalmente que estava vendendo as drogas, no termo de declaração prestado em sede policial, a autoridade policial consignou que o réu foi informado acerca da garantia constitucional. Destarte, a alegada confissão extraoficial tampouco foi utilizada pelo juízo sentenciante. Segundo o entendimento consolidado no STJ, a ausência de informação acerca do direito de permanecer calado é capaz de gerar apenas nulidade relativa, dependendo de comprovação de efetivo prejuízo, o que não ocorreu no caso em exame. Nesse sentido, vide HC n 614.339/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 9/2/2021, DJe de 11/2/2021.). Não prospera a pretensão absolutória relativa ao crime de tráfico de entorpecentes. Ao contrário do sustentado pela defesa técnica, a prova não é frágil, estando a condenação amparada em conjunto probatório convincente, robusto e suficiente, no qual amplamente demonstradas a materialidade e a autoria. Os depoimentos dos policiais são firmes e coerentes não apenas entre si, mas com o vertido em sede policial, além de harmônicos à prova documental, em especial o auto de apreensão e o laudo de exame de entorpecente. De outro lado, inexistem nos autos quaisquer mínimos indícios de que os agentes quisessem prejudicar o acusado, de modo que caberia à defesa o ônus de demonstrar a imprestabilidade da prova, fato que não ocorreu no presente caso (HC 165.561/AM, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, DJe 15/02/2016). Ainda, quanto ao delito de tráfico de entorpecentes, da prova oral colhida sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, extrai-se que os policiais estavam em patrulhamento em local conhecido pela mercancia de material entorpecente, avistaram três elementos que empreenderam fuga e, após a fuga, eles lograram êxito em abordar o ora apelante, com o qual encontraram o material entorpecente e o rádio transmissor na mochila que o réu portava. Os depoimentos também esclarecem que as drogas continham inscrições em alusão à facção criminosa comando vermelho e que a localidade é reconhecido ponto de venda de drogas. O caso em exame reflete o posicionamento adotado por este Tribunal de Justiça, explicitado no verbete sumular 70, bem como pela jurisprudência das Cortes Suprema e Superior de Justiça. Cumpre observar, ademais, que o crime da Lei 11.343/2006, art. 33 é de natureza multinuclear, caracterizando-se o tráfico de drogas pela realização de qualquer dos verbos previstos no tipo penal. Assim, a intenção de difusão ilícita não se dá apenas por meio do flagrante eventual da venda das substâncias aos usuários, mas também por outras circunstâncias, dentre elas ter em depósito, trazer consigo e guardar, exatamente como na hipótese. A defesa técnica, por sua vez, não trouxe aos autos os elementos suficientes a descaracterizar o conjunto fático probatório que foi amealhado, conforme determina a regra do CPP, art. 156, tentando apenas desconstituir a narrativa dos agentes da lei em versão isolada ao conjunto de provas, sem lograr comprovar que estes tinham algum interesse em apontar situação inexistente, incriminando um inocente. Escorreito, portanto, o juízo de censura referente ao delito de tráfico de drogas. Não assiste razão à defesa em seu pleito absolutório, relativo ao crime de associação ao tráfico de drogas. In casu, a materialidade e autoria restaram comprovadas pelo robusto caderno probatório já delineado linhas atrás. No que diz respeito ao delito imputado ao ora apelante, vale reproduzir a prova testemunhal obtida em juízo, no sentido de que com o réu foram encontradas as drogas que continham inscrições em alusão à facção criminosa comando vermelho e um aparelho de radiotransmissão, item de uso comum em operação de venda de drogas. A prova dos autos aponta que, no dia e local dos fatos, conforme constou da denúncia, Policiais Militares realizavam patrulhamento e lograram êxito na prisão em flagrante do ora apelante. Cumpre destacar que o local é controlado pela facção criminosa «Comando Vermelho, o que demonstra que o réu se associou a outros indivíduos não identificados com o fim de praticar, de forma reiterada ou não, o crime de tráfico ilícito de entorpecentes. A associação do ora apelante para a prática do ilícito de tráfico de drogas é evidente, dado o exercício da função (vapor) que resultou em sua prisão. Tal comportamento contribui de forma consciente e eficaz para a prática da mercancia de drogas, sendo certo que a atuação do réu era primordial para o sucesso da associação criminosa por ele integrada. Destarte, ao contrário do alegado pela defesa, encontram-se presentes elementos empíricos que, conjugados com aqueles colhidos no curso da instrução probatória, demonstram a indisfarçável prática do delito da Lei 11.343/06, art. 35: 1) é fato notório, que independe de prova, a existência de facções criminosas dedicadas ao narcotráfico instaladas em diversas comunidades do Estado do Rio de Janeiro; 2) a facção criminosa que atua na localidade é a autodenominada «Comando Vermelho"; 3) O recorrente foi flagrado com objeto tipicamente usado com a finalidade de avisar aos traficantes sobre a chegada da Polícia ao local e sobre a movimentação na localidade («Radinho); 4) o local do flagrante é conhecido ponto de venda de drogas. É fato notório a existência de facções criminosas dedicadas ao narcotráfico instaladas em diversas comunidades do Estado do Rio de Janeiro, sendo que o recorrente foi flagrado em localidade dominada pela facção criminosa autodenominada «Comando Vermelho, com drogas e rádio comunicador, durante patrulhamento policial na comunidade. As provas colhidas encontram-se em perfeita harmonia com os depoimentos das testemunhas de acusação prestados na fase policial e posteriormente colhidos sob o crivo do contraditório e ampla defesa, encaixando-se perfeitamente ao caso concreto a fundamentação efetivada pelo magistrado. Observa-se, portanto, que os fatos conhecidos e provados, examinados sob a ótica do que preconiza o CPP, art. 239, bem como pelas regras de experiência comum, subministrada pelo que comumente ocorre, nos termos do disposto no CPC, art. 375, levam à certeza de que o recorrente estava associado entre si e a outros traficantes da localidade, com patente animus associativo para a prática do tráfico de drogas, nos exatos termos da Lei 11.343/06, art. 35, hipótese não afastada por nenhum elemento de prova existente nos autos. Nesse viés, aliás, é importante destacar o posicionamento do STJ apontando «relevante a informação de que realizava o suposto comércio espúrio em área dominada pela facção criminosa Comando Vermelho, sendo presumível a sua adesão à organização criminosa, dada a intransigente territorialidade exercida por tais grupos (STJ, Rel. Min. Reynaldo Soares, 5ª T. HC 478822/RJ, julgado em 05.02.2019). Ou seja, «nas localidades em que o tráfico de drogas é exercido por facção criminosa, não há possibilidade que seja exercida atividade criminosa similar, por facção criminosa rival ou de forma autônoma e independente (STJ, Rel. Min. Antônio Saldanha, 6ª T. HC 492528, julg. em 28.02.2019), de modo que, em situações como a presente, não se tolera qualquer tipo de ingerência, oposição ou concorrência, seja de outras facções, quanto mais de alguns indivíduos atuando de per si. Em tal cenário, a prisão em local conhecido como ponto de venda de drogas, em posse de drogas e radiocomunicador, adido às declarações uníssonas das testemunhas policiais e da prova documental, tudo se sobrepõe nos autos à negativa efetivada pelo apelante, assim comprovando a sua integração à associação para o tráfico de drogas com os outros traficantes da localidade, com funções específicas e perene vínculo associativo. Assim, não há como se acatar o pleito absolutório, portanto correta a condenação pelo crime do art. 35, c/c o art. 40, IV da Lei 11.343/06. Sobre o afastamento da agravante do CP, art. 61, II, «j (pandemia), a defesa não tem melhor sorte. Vale dizer que a mencionada agravante sequer foi aplicada pelo Juízo sentenciante, razão pela qual é descabido o inconformismo recursal. Também deve ser afastado o pedido defensivo que diz respeito ao reconhecimento do tráfico privilegiado. Em que pese primários e portadores de bons antecedentes, não ficou evidenciado que o réu não se dedique à atividade criminosa. A variedade de drogas e o rádio transmissor que o recorrente detinha indica que ele poderia sim se dedicar à atividade criminosa de tráfico, até mesmo porque ele foi condenado por associação ao tráfico de drogas. Examinado, nesses termos, o juízo de condenação, passa-se ao exame da dosimetria. 1 - Do delito de tráfico de entorpecentes: Na primeira fase, atento às circunstâncias do CP, art. 59, vê-se que, no caso em exame, a quantidade e variedade da droga apreendida, com destaque à presença de cocaína, de vasto poder destrutivo, autorizam o aumento da pena básica, com amparo na Lei 11.343/06, art. 42, na fração de 1/6, tal como o d. juízo a quo considerou. Assim, a pena afasta-se do patamar básico e alcança 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa. Na segunda etapa, inexistentes atenuantes ou agravantes, a pena fica inalterada na fase intermediária. Na terceira fase, foi corretamente afastado o benefício da causa de diminuição da pena prevista na Lei 11.343/06, art. 33, § 4º, conforme já analisado linhas atrás. Assim, ausentes causas de diminuição ou aumento a pena é tornada definitiva em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa. 2 - Do crime de associação ao tráfico: Na primeira fase, atento às circunstâncias do CP, art. 59, vê-se que, no caso em exame, a quantidade e variedade da droga apreendida, com destaque à presença de cocaína, de vasto poder destrutivo, autorizam o aumento da pena básica, com amparo na Lei 11.343/06, art. 42, na fração de 1/6, tal como o d. juízo a quo considerou. Destarte, a pena afasta-se do patamar básico e alcança 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 816 (oitocentos e dezesseis) dias-multa. Na segunda etapa, inexistentes atenuantes ou agravantes, a pena fica inalterada na fase intermediária e é mantida na derradeira fase dosimétrica, pois ausentes causas de aumento ou diminuição de pena. Uma vez que os crimes foram praticados na forma do concurso material de delitos, as penas cominadas devem ser cumuladas e totalizam 9 (nove) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 1399 (mil trezentos e noventa e nove) dias-multa. O regime para cumprimento inicial da pena, nos termos do art. 33, § 2º «a, é o fechado. O quantum de pena imposto impede a substituição da pena privativa de liberdade por restiva de direitos, a teor da norma do art. 44, I do CP. Ficam mantidos os demais termos da sentença combatida. Quanto ao prequestionamento trazido, não se vislumbra nenhuma contrariedade/negativa de vigência, ou interpretação de norma violadora, nem a demonstração de violação de artigos constitucionais ou infraconstitucionais, de caráter abstrato e geral. PRELIMINARES REJEITADAS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.... ()

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