Jurisprudência em Destaque

STJ. 3ª T. Consumidor. Contrato de adesão. Convenção de arbitragem. Limites e exceções. Arbitragem em contratos de financiamento imobiliário. Cabimento. Limites. Precedentes do STJ. Considerações da Minª. Nancy Andrighi sobre o tema. Lei 9.307/1996, art. 4º, § 2º. CDC, arts. 51, VII e VIII. Lei 9.514/1997, art. 34. CPC, art.267, VII.

Postado por Emilio Sabatovski em 28/02/2013
«... II. Da validade da cláusula arbitral. Violação dos arts. 267, VII, 480 e 481 do CPC; 1º, 3º, 4º e 9º da Lei 9.307/1996; e 34 da Lei 9.514/97.

O TJ/RJ entendeu que o contrato objeto da ação não estaria sujeito ao procedimento arbitral, apresentando como fundamento o princípio da inafastabilidade da jurisdição, «não vinculando qualquer das partes a previsão de cláusula referente ao compromisso arbitral, que pode a qualquer tempo socorrer-se do judiciário para a solução da lide». (fl. 385, e-STJ).

As recorrentes rebatem essa conclusão, afirmando que «a estipulação de pacto comissório arbitral gera, para os contratantes, uma obrigação cujo desrespeito implica em violação direta da Lei de Arbitragem». (fl. 425, e-STJ).

(i) O efeito vinculante da convenção de arbitragem. A regra geral.

Pelo Protocolo de Genebra de 1923, do qual o Brasil é subscritor, a eleição de compromisso ou cláusula arbitral imprime às partes contratantes a obrigação de submeter eventuais conflitos à arbitragem, ficando afastada a solução judicial.

Nesse contexto, com a alteração imposta ao art. 267, VII, do CPC, pela Lei 9.307/96, afastou-se qualquer dúvida quanto ao fato de que a pactuação tanto do compromisso como da cláusula arbitral constituem hipóteses de extinção do processo sem julgamento do mérito.

Em síntese, pois, tem-se que a convenção de arbitragem implica, como regra, a derrogação da jurisdição estatal.

Outro não tem sido o entendimento do STJ, consoante se verifica dos seguintes julgados: REsp 1.297.974/RJ, 3ª Turma, minha relatoria, DJe de 19/06/2012; REsp 933.371/RJ, 1ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe de 20/10/2010; AgRg na MC 14.130/RJ, 1ª Turma, Rel. Min. Denise Arruda, DJe de 30/10/2008; e REsp 712.566/RJ, 3ª Turma, minha relatoria, DJ de 05/09/2005.



Trata-se, porém, de regra geral, cuja aplicabilidade pode ceder paço frente às peculiaridades de cada caso.

(II) A hipótese dos autos.

No particular, a análise dos autos evidencia estarmos diante de uma relação de consumo, corporificada em contrato de adesão.

Com efeito, não cabe dúvida de que a relação estabelecida entre as partes – compra e venda de imóvel para fins de moradia – é de consumo, como já decidiu reiteradas vezes esta Corte, do que são exemplo os seguintes precedentes: REsp 669.990/CE, 4ª Turma, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ de 11.09.06; REsp 698.499/SP, 3ª Turma, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ de 05.12.05; e REsp 662.585/SE, 4ª Turma, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ de 25.04.05.

Igualmente induvidoso que o contrato firmado é de adesão. Tanto é assim que, conforme admitem as próprias recorrentes, elas tiveram a preocupação de inserir na cláusula compromissória as exigências contidas no art. 4º, § 2º, da Lei 9.307/96, que dispõe sobre a validade da convenção de arbitragem em contratos de adesão.

Ademais, as recorrentes em momento algum impugnam a alegação do recorrido, de que o instrumento celebrado entre as partes consiste em «típico contrato de adesão, regulado pela Lei 8.078/90». (fl. 28, e-STJ).

Portanto, a existência de relação de consumo e de contrato de adesão é premissa que deve ser levada em consideração na análise da validade da cláusula arbitral em questão.

(III) A convenção de arbitragem em contratos de adesão envolvendo relação de consumo. Exceções à regra geral.

Constatado o fato de que a controvérsia em questão se submete aos ditames do CDC, não se pode ignorar os termos do seu art. 51, VII, que estabelece serem nulas de pleno direito as cláusulas contratuais que determinem a utilização compulsória da arbitragem.

Esta 3ª Turma já deve a oportunidade de apreciar a matéria, envolvendo justamente a inclusão de cláusula arbitral em contrato de promessa de compra e venda de imóvel, no julgamento do REsp 819.519/PE, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 05.11.2007, tendo então decidido ser «nula clausula de convenção de arbitragem inserta em contrato de adesão, celebrado na vigência do CDC».

  • 819.519/STJ (STJ. Consumidor. Contrato de adesão. Compromisso de compra e venda. Imóvel. Cláusula de arbitragem. Abusividade. CDC, arts. art. 51, VII e 54. Lei 9.507/96, art. 4º).


Naquela ocasião, porém, não se analisou a questão especificamente à luz do art. 4º, § 2º, da Lei 9.307/96, cuja redação dá margem a questionamentos quanto à possível revogação do art. 51, VII, do CDC.

A resposta a essa indagação exige remissão ao art. 2º, § 1º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (antiga LICC), segundo o qual a revogação de lei pode ser expressa ou tácita.

Na primeira hipótese, a Lei 9.307/96 deveria ter explicitamente disposto acerca da revogação do art. 51, VII, do CDC, o que não ocorreu.

Por outro lado, no que tange à revogação tácita, esta ocorre em duas situações: quando a lei nova regular por completo a matéria tratada na lei anterior – hipótese de que não se cogita na espécie – ou quando a norma anterior for incompatível com a lei nova.

Dessa forma, a questão se resume em verificar se há incompatibilidade entre o art. 51, VII, do CDC e os dispositivos da Lei de Arbitragem, notadamente o seu art. 4º, § 2º.

Nesse sentido, ao mesmo tempo em que estabeleceu como regra geral a obrigatoriedade de se respeitar a convenção arbitral, a Lei 9.307/96 criou mecanismos para proteger o aderente que, ao firmar contrato de adesão, se vê impossibilitado de discutir as cláusulas contratuais, que lhe são impostas unilateralmente pelo proponente.

Para tanto, o art. 4º, § 2º, da Lei 9.307/96 dispõe que a cláusula compromissória só terá eficácia nos contratos de adesão «se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula».

Assim, da confrontação dos arts. 51, VII, do CDC e 4º, § 2º, da Lei 9.307/96, constata-se que a incompatibilidade entre os dispositivos legais é apenas aparente, não resistindo à aplicação do princípio da especialidade das normas, a partir do qual, sem grande esforço, se conclui que o 4º, § 2º, da Lei 9.307/96 versou apenas acerca de contratos de adesão genéricos, subsistindo, portanto, a aplicação do art. 51, VII, do CDC, às hipóteses em que o contrato, mesmo que de adesão, regule uma relação de consumo.

Na realidade, com a promulgação da Lei de Arbitragem, passaram a conviver, em harmonia, três regramentos de diferentes graus de especificidade: (i) a regra geral, que obriga a observância da arbitragem quando pactuada pelas partes; (ii) a regra específica, aplicável a contratos de adesão genéricos, que restringe a eficácia da cláusula compromissória; e (iii) a regra ainda mais específica, incidente sobre contratos sujeitos ao CDC, sejam eles de adesão ou não, impondo a nulidade de cláusula que determine a utilização compulsória da arbitragem, ainda que satisfeitos os requisitos do art. 4º, § 2º, da Lei 9.307/96.

Note-se, por oportuno, que essa circunstância não impede a utilização da arbitragem na resolução de conflitos de consumo.

O CDC veda apenas a utilização compulsória da arbitragem, o que não obsta o consumidor de eleger o procedimento arbitral como via adequada para resolver eventuais conflitos surgidos frente ao fornecedor.

O legislador, inspirado na proteção do hipossuficiente, reputou prejudicial a prévia imposição de convenção de arbitragem, por entender que, usualmente, no ato da contratação, o consumidor carece de informações suficientes para que possa optar, de maneira livre e consciente, pela adoção dessa forma de resolução de conflitos.

Via de regra, o consumidor não detém conhecimento técnico para, no ato de conclusão do negócio, avaliar as vantagens e desvantagens inerentes à futura e ocasional sujeição ao procedimento arbitral. Ainda que o contrato chame a atenção para o fato de que se está optando pela arbitragem, o consumidor, naquele momento, não possui os elementos necessários à realização de uma escolha informada.

Tanto é assim que a redação aprovada pelo Senado Federal para o art. 4º, § 2º, da Lei 9.307/96 foi de que «nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem, ou concordar, expressamente, com a sua instituição». Em outras palavras, a instauração da arbitragem pelo aderente vincularia o proponente, mas a recíproca não seria verdadeira, isto é, a proposta de instauração da arbitragem pelo proponente dependeria da aceitação expressa do aderente. A ideia era evitar a utilização abusiva da cláusula em contratos de adesão.

Prevaleceu, porém, a redação emendada pela Câmara, que teve a intenção de resguardar a plena eficácia do CDC, mas que pecou na técnica redacional, acabando por dificultar a exegese da norma e, por consequência, a defesa do aderente.

Carlos Alberto Carmona bem observa que a subemenda da Câmara «não teve o mérito de aumentar a proteção do oblato, e acabou, por atecnia, causando amplo malefício, mitigado pelo fato de não ter sido revogado o art. 51, VII, do CDC».

Seja como for, o art. 51, VII, do CDC se limita a vedar a adoção prévia e compulsória da arbitragem, no momento da celebração do contrato, mas não impede que, posteriormente, diante de eventual litígio e havendo consenso entre as partes (em especial a aquiescência do consumidor), seja instaurado o procedimento arbitral.

Friso, por fim, que o raciocínio ora construído não conflita com o art. 34 da Lei 9.514/97, suscitado pelas recorrentes, segundo o qual «os contratos relativos ao financiamento imobiliário em geral poderão estipular que litígios ou controvérsias entre as partes sejam dirimidos mediante arbitragem».

Realmente, não se vislumbra incompatibilidade. Em primeiro lugar, porque nada impede que, em financiamentos imobiliários não sujeitos ao CDC, se estipule, desde o início, a utilização da arbitragem.

Em segundo lugar porque, havendo relação de consumo, prevalecerá a regra acima delineada, de que a efetiva instauração do procedimento arbitral se sujeite à posterior concordância das partes, por ocasião do surgimento do conflito de interesses, o que não é vedado pelo art. 34 da Lei 9.514/97, que, além de prever a arbitragem como mera faculdade ou alternativa, não fixa o momento em que deverá ser definida a sua efetiva utilização.

(IV) Conclusão.

Na hipótese específica dos autos, o ajuizamento da ação principal evidencia, ainda que de forma implícita, a discordância do recorrido em se submeter ao procedimento arbitral, não podendo, pois, nos termos do art. 51, VII, do CDC, prevalecer a cláusula que impõem sua utilização compulsória.

Portanto, ainda que por fundamento diverso, deve ser mantida a conclusão alcançada pelo TJ/RJ quanto à inaplicabilidade à espécie da cláusula arbitral. ...» (Minª. Nancy Andrighi).»

Doc. LegJur (131.0944.2000.2600) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
▪ Consumidor (Jurisprudência)
▪ Contrato de adesão (v. ▪ Consumidor) (Jurisprudência)
▪ Arbitragem (v. ▪ Consumidor) (Jurisprudência)
▪ Convenção de arbitragem (v. ▪ Consumidor) (Jurisprudência)
▪ Limites (v. ▪ Arbitragem) (Jurisprudência)
▪ Exceções (v. ▪ Arbitragem) (Jurisprudência)
▪ Contratos de financiamento imobiliário (v. ▪ Arbitragem) (Jurisprudência)
▪ Financiamento imobiliário (v. ▪ Arbitragem) (Jurisprudência)
▪ Lei 9.307/1996, art. 4º, § 2º (Legislação)
▪ CDC, art. 51, VII e VIII
▪ Lei 9.514/1997, art. 34 (Legislação)
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