Jurisprudência em Destaque
TJRJ. 3ª Ccrim. Tóxicos. Tráfico. Princípio da congruência. Desclassificação para o crime de porte de drogas para o próprio consumo. Declínio de competência. Manutenção da decisão. Considerações da Desª. Suimei Meira Cavalieri sobre o tema. CPP, art. 383, «caput». Lei 11.719/2008. Lei 11.343/2006, arts. 28 e 33.
Ressalte-se que a reforma do Código de Processo Penal de 2008 não veda a referida desclassificação.
A Lei 11.719/2008 manteve a regra que permitia ao julgador, mantida inalterada sua base fática, modificar ou divergir da qualificação jurídica que constar da imputação. A pequena mudança de redação por ela dada ao artigo 383, caput, do CPP, apenas enfatiza a impossibilidade de que, a pretexto de realizar simples emendatio libelli, o juiz considere fatos diversos daqueles descritos na denúncia.
Em sua obra «Correlação entre Acusação e Sentença». (São Paulo, 2009, Editora Revista dos Tribunais, 2ª ed., pg.139/140), Gustavo Henrique Badaró detalha:
«Em nosso processo penal há expressa possibilidade de mudança da qualificação jurídica do fato. O juiz na sentença pode dar ao fato imputado um enquadramento legal diverso do constante da imputação. Portanto, a imutabilidade do objeto do processo não precisa ser total. Pelo contrário, é possível que haja mudança de tal objeto, sem que com isso se viole a regra da correlação entre a acusação e sentença.
A mudança da definição jurídica do fato imputado é uma dessas hipóteses.
[...]
Desde que os fatos imputados permaneçam inalterados, pode o juiz dar-lhes definição jurídica diversa da denúncia ou da queixa, mesmo sem aditamento dessas peças.».
A imputação é a atribuição de um fato penalmente relevante a alguém; portanto, a qualificação jurídica do fato também integra a imputação. Porém, permanecendo inalterado o substrato fático da imputação, eventual mudança da qualificação jurídica de tal fato não representa para fins de correlação entre acusação e sentença, quebra de identidade do objeto do processo.
No caso em apreço, para realizar a desclassificação do crime de tráfico de drogas para o de posse de substância entorpecente para consumo próprio não se faz necessário considerar fatos diversos daqueles descritos na denúncia.
O fato processual penal é um acontecimento histórico concreto. No caso em apreço, o acontecimento da vida penalmente relevante atribuído ao recorrente foi a posse, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, de substância entorpecente. Com efeito, da comparação entre o fato naturalístico imputado e aquele considerado na R. decisão, conclui-se não ter ocorrido qualquer modificação, mantendo-se sua correlação na hipótese de desclassificação.
A definição da questão de direito pode, entretanto, ser complexa, nem sempre se resolvendo num simples processo de subsunção. JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA explica que a motivação in iure pode se desdobrar na qualificação jurídica dos fatos, na determinação da regra de direito aplicável (onde podem surgir problemas de concurso aparente de normas e conflitos de Lei tempo e no espaço), no eventual controle de validade da regra e na interpretação da regra (Temas de Direito Processual. São Paulo, 1994, Saraiva, p.123). Da aplicação das regras destinadas à solução do conflito de normas decorre a admissibilidade da desclassificação do tráfico para posse de substância entorpecente para uso próprio, sem necessidade de aditamento da denúncia.
A doutrina admite a passagem direta, sem necessidade de aditamento da denúncia, de um crime especial para um crime geral, quando o juiz considera não provado o aspecto que caracteriza o elemento especializante, condenando o acusado pelo restante da imputação, que caracteriza o crime geral (GUSTAVO HENRIQUE BADARÓ, ob. cit., p.219). A mudança do crime complexo é igualmente admitida:
«Nesse caso, assim como na relação entre o crime especial e o crime comum, há uma relação de continência entre o crime complexo e o crime simples que o integra. Portanto, será perfeitamente possível a passagem de imputação por crime complexo à condenação pelo delito simples que seja um dos elementos constitutivos da unidade complexa (nesse sentido, GAETANO FOSCHINI; GIROLAMNO BELLAVISTA; GIOVANNI LEONE. Na doutrina nacional, ANTONIO SCARANCE FERNANDES; MAGALHÃES). Não será necessário o aditamento da denúncia, porque o objeto do processo não terá sido alterado. Contudo, embora não haja alteração do objeto do processo, as partes deverão ser cientificadas da possibilidade de mudança da qualificação jurídica dos fatos imputados, respeitando-se assim o princípio do contraditório e evitando surpresas ao réu e ao acusador.». (GUSTAVO HENRIQUE BADARÓ, cit., p.220).
Sendo o crime de tráfico um plus em relação ao simples uso, subjacente, em ambas as infrações, a posse da droga, pode o juiz enquadrar o réu na primeira fase dessa infração sem aditamento da denúncia. Há uma relação de continência entre as diversas etapas do crime progressivo, representando, figurativamente, círculos concêntricos com os raios diversos. Imputando-se o crime progressivo, todos os elementos do crime simples, que constitui uma de suas etapas de passagem, também estarão sendo imputados. É lícita a condenação do acusado pelo restante da imputação, uma vez não comprovado o aspecto que confere o plus de gravidade à conduta, pois, diante dessa relação de continência entre um fato menor e o maior, permanece idêntico o objeto do processo. ...» (Desª. Suimei Meira Cavalieri).»
Doc. LegJur (134.7671.1000.0700) - Íntegra: Click aqui
Referência(s):
▪ Tóxicos (Jurisprudência)
▪ Tráfico (v. ▪ Tóxicos) (Jurisprudência)
▪ Princípio da congruência (Jurisprudência)
▪ Desclassificação (v. ▪ Tóxicos) (Jurisprudência)
▪ Porte de drogas (v. ▪ Tóxicos) (Jurisprudência)
▪ CPP, art. 383, «caput»
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