Narrativa de Fato e Direito
I - Narrativa dos Fatos e Fundamentos de Direito
Os Requerentes são filhos do Requerido, que se encontra em uma situação crítica de dependência do uso de bebidas alcoólicas. O Requerido é classificado como hébrio habitual, conforme a CID F10, e já foi submetido a um período de internação de 16 de julho a 12 de agosto de 2024, sem, contudo, obter sucesso duradouro na recuperação, pois voltou ao uso abusivo do álcool em poucas semanas. Desde então, a situação do Requerido tem se agravado, evidenciando comportamentos cada vez mais descontrolados, agressivos e ameaçadores.
O Requerido proferiu ameaças contra os próprios familiares, chegando a declarar sua intenção de atear fogo na residência da família. Tal conduta levou a Sra. C., esposa do Requerido, a solicitar uma medida protetiva, que foi concedida em 9 de novembro de 2024, determinando o afastamento do Requerido do lar. No entanto, o Requerido tem desrespeitado reiteradamente essa ordem judicial, retornando à residência familiar e ameaçando os presentes, o que tem causado grande temor e insegurança.
Além disso, o Requerido invadiu o espaço de trabalho da Sra. C., proferindo ameaças contra uma terceira pessoa (filha da idosa que é acompanhada pela Sra. C.), colocando em risco a subsistência da esposa e dificultando a continuidade de seu trabalho. Comportamentos recentes, como delírios persecutórios, agressividade sem provocação e desorientação temporal e espacial, indicam o agravamento da condição mental do Requerido.
Diante dos riscos para a integridade física da família e da incapacidade do Requerido de seguir tratamentos voluntários, os Requerentes decidiram pleitear a sua interdição, buscando a curatela provisória e internação compulsória para garantir tanto a segurança do Requerido quanto de seus familiares. A medida de internação compulsória, além de proteger terceiros, visa proporcionar o tratamento adequado ao Requerido, promovendo sua saúde e reintegração social.
II - Fundamentos Jurídicos para a Interdição e Internação Compulsória
A interdição e curatela provisória têm fundamento no Código Civil de 2002 (art. 1.767, III), que trata da incapacidade de pessoas que, por enfermidade ou deficiência mental, não têm o necessário discernimento para a prática dos atos da vida civil. No presente caso, a condição do Requerido, como hébrio habitual, se encaixa nessa situação, visto que ele apresenta uma incapacidade de gerir sua vida e proteger a integridade de seus bens, sendo necessário que terceiros assumam a administração de seus atos civis.
O pedido de internação compulsória também encontra respaldo na Lei 10.216/2001, que regula a proteção e os direitos das pessoas com transtornos mentais. Segundo o art. 6º, § 1º, essa internação é justificável quando há risco para o próprio interditando ou para terceiros, sendo essa a situação apresentada, dado o comportamento agressivo e as ameaças reiteradas contra seus familiares.
Além disso, a Constituição Federal de 1988, em seu art. 1º, III, destaca a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito. Nesse sentido, a internação compulsória busca assegurar ao Requerido o direito a um tratamento adequado e digno, que lhe permita retomar o controle de sua vida e garantir uma convivência pacífica com seus familiares.
Os Requerentes também solicitam a concessão de tutela de urgência, conforme o CPC/2015, art. 300, uma vez que há elementos que evidenciam a probabilidade do direito (problemas psiquiátricos do Requerido, seu comportamento agressivo, e a violação de medidas protetivas) e o perigo de dano irreparável (ameaças constantes à integridade física da família).
III - Defesas que Podem Ser Opostas pela Parte Contrária
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Capacidade Civil do Requerido: A parte contrária poderá alegar que o Requerido possui plena capacidade de entendimento e discernimento, argumentando que ele não se encontra em estado de incapacidade civil que justifique a sua interdição. Poderá ainda sustentar que o Requerido possui períodos de lucidez e que suas ações foram pontuais e motivadas por eventos externos, que não caracterizam uma incapacidade permanente.
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Violação ao Direito de Liberdade do Requerido: A defesa pode alegar que a internação compulsória viola o direito à liberdade do Requerido, previsto na Constituição Federal, art. 5º, XV. Alega-se que a internação compulsória só deveria ser utilizada em última instância, quando outras medidas terapêuticas e sociais forem totalmente ineficazes, e que, no presente caso, não se tentou outras abordagens menos restritivas.
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Inadequação das Medidas Propostas: Pode ser argumentado que as medidas propostas pelos Requerentes são inadequadas e excessivamente restritivas. A defesa poderá alegar que, ao invés de uma curatela provisória e internação compulsória, seria mais razoável a adoção de medidas menos invasivas, como acompanhamento médico regular, tratamento ambulatorial ou aplicação de medidas protetivas com monitoramento mais rigoroso.
IV - Conceitos e Definições Importantes
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Curatela Provisória: A curatela provisória é a nomeação temporária de um curador para representar e gerir os atos da vida civil de uma pessoa que se encontra incapaz de fazê-lo por si mesma. No caso, os filhos do Requerido pedem a curatela provisória para proteger o pai, que é incapaz de gerir sua vida em decorrência da dependência alcoólica.
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Internação Compulsória: Refere-se à medida de internação psiquiátrica determinada por ordem judicial, independentemente da vontade da pessoa internada. Essa medida é justificada quando a pessoa representa risco a si mesma ou a terceiros e não tem condições de decidir por um tratamento voluntário.
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Hébrio Habitual: A expressão "hébrio habitual" refere-se à pessoa que faz uso abusivo de bebidas alcoólicas de forma constante, a ponto de afetar sua capacidade de discernimento e funcionamento social. Essa condição é classificada pelo CID F10 e é uma das causas que pode justificar a interdição.
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Dignidade da Pessoa Humana: A dignidade da pessoa humana é um princípio fundamental garantido pela Constituição Federal, que impõe a proteção dos direitos humanos em sua integralidade, assegurando tratamento digno e respeito aos direitos individuais, incluindo o direito à saúde e à integridade.
V - Considerações Finais sobre o Modelo de Peça Processual
O modelo de ação de interdição com curatela provisória e internação compulsória é utilizado quando o interditando se encontra em uma situação que compromete seriamente sua capacidade de cuidar de si mesmo e de proteger os direitos dos familiares. No presente caso, a dependência alcoólica do Requerido e seus comportamentos agressivos e ameaçadores colocam em risco a sua integridade e a de seus familiares, justificando as medidas judiciais requeridas pelos filhos.
A peça processual apresenta, de forma clara e detalhada, os fatos que evidenciam a incapacidade do Requerido, bem como fundamenta juridicamente a necessidade das medidas requeridas, utilizando normas constitucionais, civis e processuais. O pedido de curatela e internação compulsória busca não apenas proteger terceiros, mas também garantir ao Requerido a possibilidade de tratamento e recuperação, assegurando sua dignidade e promovendo a segurança de todos os envolvidos.
Ao mesmo tempo, o modelo também antecipa as possíveis defesas da parte contrária, que pode alegar a capacidade do Requerido, a violação de direitos fundamentais, e a inadequação das medidas propostas. No entanto, as circunstâncias de risco e o comportamento reiterado do Requerido fortalecem a argumentação dos Requerentes quanto à necessidade da interdição e internação.
Esta ação de interdição reflete a complexidade de casos envolvendo saúde mental e segurança familiar, visando garantir a proteção de todos os envolvidos e a promoção da dignidade humana.