Jurisprudência em Destaque

STJ. 2ª T. Tributário. Execução fiscal. Certidão de Dívida Ativa - CDA. Multa administrativa. Decreto de liquidação extrajudicial. Previdência privada. Entidade de previdência complementar. Hermenêutica. Lei Compl. 109/2001, art. 49, VII. Interpretação lógico-sistemática. Suspensão do feito executivo. Amplas considerações do Min. Castro Meira sobre a liquidação extrajudicial das entidades de previdência complementar. Lei Compl. 109/2001, art. 52. Lei 6.830/1980, art. 29.

Postado por Emilio Sabatovski em 15/03/2013
«... A liquidação extrajudicial das entidades de previdência complementar.

A liquidação extrajudicial foi definida pelo Exmo. Min. Teori Zavaski como «uma forma de intervenção do Estado no domínio econômico que visa resguardar, primordialmente, a integridade e o pagamento dos credores. (Liquidação Extrajudicial e Correção Monetária. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, nova série, v.24, 57, p. 30-34, jan./mar. 1985. Disponível em: ).

No caso específico das entidades de previdência complementar, a proteção foi direcionada, essencialmente, aos participantes do plano, credores, e maiores prejudicados em caso de insuficiência patrimonial dessas entidades, tanto que a Lei Complementar 109/2001 previu a intervenção como medida acautelatória-administrativa «[p]ara resguardar os direitos dos participantes e assistidos» (artigo 44).

Invocando, mais uma vez, a lição do Ministro Teori Zavascki, a «liquidação extrajudicial, como via administrativa obrigatória, somente pode alcançar legitimidade constitucional na medida em que não trouxer prejuízo aos credores que a ela hão de se submeter». Por isso mesmo, há necessidade de incluir-se a correção monetária nos créditos sujeitos à liquidação extrajudicial, pois o não pagamento «representa não a preservação e sim a deterioração do interesse público» (idem, ibidem), afirmando ser inconstitucional o artigo 18, f, da Lei 6.024/74 que previa como efeito do decreto a «não reclamação de correção monetária de quaisquer divisas passivas».

Esse entendimento, exposto no início de 1985, foi prestigiado na Constituição de 1988, na qual o artigo 46 do ADCT, sepultando «a maior distorção dos processos de liquidação» (Elvira Lobato. Constituição acaba com favorecimento a empresas em liquidação extrajudicial. A Folha de São Paulo: 11 de setembro de 1988. p. b3. Disponível em: ).

Partindo desse entendimento, o escopo da liquidação extrajudicial é o de proteger o interesse público e imediatamente a proteção do patrimônio dos credores que foi direcionado às sociedades empresárias.

O diploma primário que rege as entidades de previdência complementar é a Lei Compl. 109/2001 que, além de compor a estrutura e o funcionamento dessas pessoas jurídicas, rege, a princípio, a intervenção e a liquidação no Capítulo VI, artigos 44 a 53.

É certo que existem diferenças substanciais nos procedimentos liquidatórios das entidades de previdência complementar com a utilização de diferentes diplomas normativos a depender da natureza jurídica, aberta ou fechada da entidade.

Com efeito, a vedação à falência ocorre de forma absoluta nos casos de entidade fechada, que não se submete às disposições da Lei 11.101/2005 (artigo 2º, II). Todavia, quanto à entidade aberta, a restrição se mostra relativa, podendo em circunstâncias especiais ter a falência decretada (art. 73 da Lei Compl. 109/2001, c/c art. 26 do Decreto-Lei 73/66 e art. 3º da Lei 10.190/2001 c/c art. 19 da Lei 6.024/74).

A propósito, oportuno colacionar a lição de Fábio Ulhoa Coelho:


Na verdade, a lei prevê hipóteses de exclusão total ou parcial do regime falencial. Quando totalmente excluída da falência, a sociedade empresária devedora com ativo inferior ao passivo (menos bens em seu patrimônio do que o necessário ao pagamento dos débitos) submete-se sempre a regime de execução concursal diverso do falimentar. Chama-se, também, a hipótese de exclusão absoluta. Quando, de outro lado, é parcialmente excluída da falência, submete-se a sociedade empresária a procedimento extrajudicial de liquidação concursal alternativo ao processo falimentar. Essa hipótese é também chamada de exclusão relativa. Uma sociedade empresária excluída totalmente da falência não pode, em nenhuma hipótese, submeter-se ao processo falimentar como forma de execução concursal de suas obrigações, isto é, ela nunca pode falir. Já a excluída parcialmente, em determinados casos discriminados por lei, pode ter o seu patrimônio concursalmente executado por via da falência. Ou seja, nesse último caso, ela não pode falir em determinadas situações.


[...]


Três são as hipóteses de exclusão absoluta.


[...]


A terceira hipótese de exclusão absoluta alcança as entidades fechadas de previdência complementar, isto é, que organizam planos acessíveis apenas aos empregados de certa empresa, servidores públicos de um determinado ente governamental (patrocinadores) ou associados ou membors de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial (instituidores). As entidades fechadas de previdência complementar estão sujeitas unicamente à liquidação extrajudicial (Lei Complementar 109/01, art. 47). Pode apenas executar o crédito que titula, mediante a penhora de bens da devedora. Note-se que as entidades abertas de previdência complementar, cujos planos são acessíveis a qualquer pessoa física, estão excluídas relativamente da falência, como se informa adiante.


[...]


Em idêntica situação à das seguradoras se encontram as entidades abertas de previdência complementar (Lei Complementar 109/01, art. 73). (Curso de Direito Comercial. Direito de Empresa. 8ª edição. São Paulo:Saraiva, 2008. v.3 p. 249-250)

Apesar das diferenças nos regimes aplicáveis, não se pode negar, como já mencionado, que existe uma confluência em torno do diploma maior que rege as duas entidades, a Lei Complementar 109/2001.

Os efeitos do decreto de liquidação extrajudicial (art. 49, VII, da Lei Compl. 109/2001).

A Lei Complementar, no artigo 49, elencou os efeitos do decreto de liquidação extrajudicial, entre eles, o inciso VII que assegura a «inexigibilidade das penas pecuniárias por infrações de natureza administrativa».

A norma possui a seguinte redação:


Art. 49. A decretação da liquidação extrajudicial produzirá, de imediato, os seguintes efeitos:


I - suspensão das ações e execuções iniciadas sobre direitos e interesses relativos ao acervo da entidade liquidanda;


II - vencimento antecipado das obrigações da liquidanda;


III - não incidência de penalidades contratuais contra a entidade por obrigações vencidas em decorrência da decretação da liquidação extrajudicial;


IV - não fluência de juros contra a liquidanda enquanto não integralmente pago o passivo;


V - interrupção da prescrição em relação às obrigações da entidade em liquidação;


VI - suspensão de multa e juros em relação às dívidas da entidade;


VII - inexigibilidade de penas pecuniárias por infrações de natureza administrativa;


VIII - interrupção do pagamento à liquidanda das contribuições dos participantes e dos patrocinadores, relativas aos planos de benefícios.


§ 1º As faculdades previstas nos incisos deste artigo aplicam-se, no caso das entidades abertas de previdência complementar, exclusivamente, em relação às suas atividades de natureza previdenciária.


§ 2º O disposto neste artigo não se aplica às ações e aos débitos de natureza tributária.

Reitere-se que a norma é aplicável às duas modalidades de entidade de previdência complementar, determinando a «inexigibilidade de penas pecuniárias por infrações de natureza administrativa».

Assinale-se que a inexigibilidade das sanções dessa espécie não surgiu no ordenamento jurídico pátrio com a referida lei complementar. A legislação anterior que regia as entidades de previdência continha preceito idêntico (Lei 6.435/77, art. 66, VII, regulamentada pelo Decreto 81.402/78, artigo 80, VIII), da mesma forma, a Lei 6.024/74 que regula a intervenção e a liquidação extrajudicial de instituições financeiras trilham a mesma senda (artigo 18, f). Também a antiga Lei de Falências, Decreto-Lei 7.661/45, estabelecia no artigo 23, parágrafo único, que «não podem ser reclamados na falência: [...] III - as penas pecuniárias por infração das leis penais e administrativas.»

Essa exclusão constava, de igual modo, na Lei Falimentar 2.024/1908, que dispunha: «Não poderão ser reclamados na fallencia [...] 4º As penas pecuniarias».

A inexigibilidade das penas pecuniárias por infração administrativa decorre, de um lado, da natureza da dívida, obrigação por ato ilícito, que em última análise acabaria por ser suportada pelos demais credores da massa, contrariando o princípio de que a responsabilidade deve ser imputada a quem deu causa ao ato ilícito (artigo 927 do Código Civil).

Afirma Sérgio Cavalieri que «[d]e regra, só responde pelo fato aquele que lhe dá causa, por conduta própria. É a responsabilidade direta por fato próprio, cuja justificativa está no próprio princípio informador da teoria da reparação» (Programa de Responsabilidade Civil. 4. ed. São Paulo:Malheiros, 2005. p. 45).

A propósito, Fábio Ulhoa Coelho aponta que exigir da massa tais obrigações significaria distribuir aos credores as consequências da ilicitude, sendo oportuno transcrever, mais uma vez, sua lição:


Se é devedora de pena pecuniária, então um dos seus representantes cometeu crime ou contravenção, ou ela mesma incorreu em infração a lei administrativa ou deixou de pagar, no prazo, algum tributo. Em todas essas situações, a origem da obrigação é uma ato ilícito. Pois bem, não seria justo deixar de atender à maioria dos credores (excetuam-se desse tratamento apenas os subordinados em razão de se consumirem recursos da massa no pagamento desse gênero de obrigação. Equivaleria, num certo sentido, a transferir para a comunidade dos credores as consequências da ilicitude perpetrada pela sociedade devedora ou por seu representante. Isso, principalmente quando se trata de pena pecuniária por infração à lei penal, agride frontalmente os valores sociais cultivados pela organização democrática, que impedem seja a sanção suportada por que não cometeu o ilícito (Curso de Direito Comercial. Direito de Empresa. 8ª edição. São Paulo:Saraiva, 2008. v.3 p. 374-375).

A jurisprudência também reconhece ser esse o principal fundamento para excluir a exigência da multa por infração às normas administrativas da massa falida. O Supremo Tribunal Federal possui duas súmulas a respeito, a Súmula 192/STF: «Não se inclui no crédito habilitado em falência a multa fiscal com efeito de pena administrativa» e a Súmula 565/STF: «A multa fiscal moratória constitui pena administrativa, não se incluindo no crédito habilitado em falência.

No julgamento do RE 79625-SP, o saudoso Min. Cordeiro Guerra afirmou:


Essa proibição, como esclarece MIRANDA VALVERDE, «figura no nosso direito falimentar desde a Lei 2.024, de 1908, e provém da lei alemã sobre falências, que, no § 63, 3, ordena a exclusão, do concurso, dos créditos por penas pecuniárias, porquanto se eles pudessem ser incluídos na falência, feririam não tanto o devedor, quanto os credores dela, contrariando, ainda hoje, o princípio, que não necessita estar mais no códigos, de que a responsabilidade penal é absolutamente pessoal».

Neste Superior Tribunal de Justiça também foi reconhecido que o fundamento da inexigibilidade das multas é a proibição da pena ultrapassar o ofensor, conforme asseverado em precedentes da Egrégia Primeira Seção, e das Turmas que a compõe:


EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS. ICMS. EMPRESA EM REGIME DE CONCORDATA COM POSTERIOR DECLARAÇÃO DE FALÊNCIA. MULTA MORATÓRIA. EXCLUSÃO. POSSIBILIDADE. SÚMULAS 192, 565, DO STF.


A norma do art. 23, parágrafo único, inc. III, da Lei 7.661/45, que exclui da falência as multas penais e administrativas, não tem aplicação na concordata, que não sujeita a empresa ao regime de liquidação, razão pela qual o pagamento das ditas penalidades não se reflete senão sobre o próprio concordatário, não alterando os índices fixados para o saldo das contas de seus credores quirografários.


Cuidando-se de empresa em regime de concordata com posterior declaração de falência, deve-se afastar a exigência da multa moratória, no intuito de evitar que essa penalidade recaia em terceiros alheios à infração - credores habilitados no processo falimentar.


Tal entendimento é corroborado pelas Súmulas 192 e 565 do Pretório Excelso, que assim dispõe, respectivamente: «Não se inclui no crédito habilitado em falência a multa fiscal com efeito de pena administrativa.» «A multa fiscal moratória constitui pena administrativa, não se incluindo no crédito habilitado em falência.» Embargos de Divergência rejeitados (EREsp 169727/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Primeira Seção, DJ 30/10/2000);


PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO - EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA - EXECUÇÃO FISCAL - MASSA FALIDA - MULTA MORATÓRIA - NÃO INCIDÊNCIA - ARTIGO 23, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO III, DA LEI DE FALÊNCIAS - SÚMULAS 192 E 565 DO STF - PROVIMENTO DOS EMBARGOS.


1. Nos termos da jurisprudência uniforme desta Primeira Seção e de ambas as Turmas que a compõem, deve ser afastada a cobrança da multa moratória em execução fiscal ajuizada contra a massa falida. Isso porque deve-se evitar que a penalidade em questão recaia sobre os credores habilitados no processo falimentar, que figuram como terceiros alheios à infração.


2. Aplicação dos enunciados nº 192 e 565 da Súmula/STF.


3. Embargos de divergência acolhidos (EREsp 332721/PR, Rel. Min. Denise Arruda, Primeira Seção, DJ 01/02/2005);


RECURSO ESPECIAL. ALÍNEA «A». MASSA FALIDA. JUROS DE MORA E MULTA FISCAL. NÃO-INCIDÊNCIA. ALEGADA VIOLAÇÃO DOS ARTS 22, §1º, DA Lei 8.036/90, BEM COMO 23 E 25 DO DECRETO-Lei 7.661/45. NÃO-OCORRÊNCIA. SÚMULAS 192 E 565/STF. ITERATIVOS PRECEDENTES. ACÓRDÃO RECORRIDO MANTIDO PELOS SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.


É firme a orientação deste Sodalício no sentido de que não incidem juros sobre a massa falida, bem como o entendimento de que não se inclui a multa fiscal moratória sobre crédito habilitado em falência, por constituir pena administrativa. Súmula 192 do STF: «Não se inclui no crédito habilitado em falência a multa fiscal com efeito de pena administrativa». Súmula 565 do STF: «A multa fiscal moratória constitui pena administrativa, não se incluindo no crédito habilitado em falência».Recurso especial improvido (REsp 572.644/PR, Rel. Min. Franciulli Netto, Segunda Turma, DJ 01/02/2005);


PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. MULTA FISCAL MORATÓRIA. FALÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA. IMPROVIMENTO.


Inviável o recurso especial que pretende discutir matéria pacificada no âmbito desta Corte, no sentido de que a multa fiscal moratória, por ser pena administrativa, não se inclui no crédito habilitado em falência.


Os acórdãos trazidos à colação como paradigmas pelo agravante não guardam similitude com a hipótese dos autos.


Agravo regimental improvido (AgRg no Ag 425.845/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ 09/09/2002);


TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. FALÊNCIA. MULTA E JUROS DE MORA. SÚMULA Nº 565/STF. PRECEDENTES.


1. A multa moratória, por constituir pena administrativa, não incide contra a massa falida. Aplicabilidade das Súmulas 192 e 565/STF.


2. Após a data da decretação da falência, os juros moratórios apenas serão devidos se houver sobra do ativo apurado para o pagamento do principal. Precedentes.


3. Recurso especial provido (REsp 1029150/SP, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, DJe 25/05/2010).

Reitere-se que os credores mais afetados pelo estado de insolvência da entidade são os participantes e os assistidos que injetaram seu patrimônio na expectativa de receber benefícios que lhes proporcionassem melhores condições de vida.

A norma retira do passivo da entidade um crédito que seria devido à Fazenda Pública, para tutelar outros interesses públicos, um mediato, consistente na «preservação da solidez e segurança do mercado financeiro e de capitais (Lei 6.024/74, art. 15, § 1º), a economia pública, a poupança privada e a segurança nacional (art. 31)» e outro imediato, ligado ao «interesse dos credores» (ZAVASCKI, Teori Albino. Liquidação Extrajudicial e Correção Monetária. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, nova série, v.24, 57, p. 30-34, jan./mar. 1985. Disponível em: ).

O outro fundamento da norma que autoriza ou determina que as penalidades por infração das leis administrativas sejam desconsideradas na liquidação extrajudicial da sociedade empresária é a natureza social da previdência complementar.

Com efeito, não se afiguraria plausível o Estado fomentar a atividade de previdência complementar e, em casos de crise, como o presente, cobrar dos participantes e beneficiários a multa por ilicitudes cometidas na gestão da sociedade, evitando-se agravar a situação dos demais credores.

Conclui-se que a norma do artigo 49, VII, da Lei Compl. 109/2001 é perfeitamente compatível com o ordenamento jurídico e aplicável ao presente caso.

A extinção da execução fiscal.

A inexigibilidade da obrigação afeta diretamente o título executivo e obsta o prosseguimento da execução, pois a obrigação qualificada como perfeita passou a ser natural, despida de coerção (como ocorre nos casos de prescrição).

Nesse contexto, os doutrinadores ensinam que a obrigação possui dois elementos essenciais, o débito (schuld) que pode ser traduzido como a prestação a ser cumprida espontaneamente pelo devedor e a responsabilidade (haftung) sujeição do patrimônio do devedor ao ataque do credor para satisfazer o inadimplemento do débito. No caso, a norma jurídica retirou um dos elementos essenciais da obrigação, a responsabilidade (haftung), tornando impossível compelir o devedor ao pagamento, implicando, necessariamente, na extinção do feito.

A propósito, Sérgio Carlos Covello menciona:


[A]obrigação natural constitui, tanto quanto a obrigação civil, relação pré-constituída de crédito e débito que, por alguma razão de ordem legislativa, não se elevou ao nível das obrigações civis, ou então, tendo sido obrigação civil, perdeu, por força de lei, sua exigibilidade» (apud FARIAS, Cristiano Chaves de e ROSENVALD, Nelson. Direito das Obrigações. Rio de Janeiro:LumenJuris, 2006. p. 170).

O decreto de liquidação extrajudicial produziu imediatamente seus efeitos e alterou profundamente a natureza da obrigação, modificando-a de civil para natural. Essa nova feição jurídica da relação obrigacional somente poderia ser alterada por expressa disposição de lei ou anulando-se os efeitos do decreto (ato jurídico), o que não ocorre.

A consequência, pois, da inexigibilidade é a extinção do feito executivo, não se cuidando de mera suspensão da execução, como quer a recorrente.

Argumenta-se no recurso especial que a execução deveria ser suspensa por dois fundamentos: Em primeiro lugar, porque a liquidação extrajudicial poderia ser revertida, podendo a empresa «prosseguir suas atividades econômicas» (fl. 83), fato que legitimaria a cobrança da dívida. O segundo argumento baseia-se na disciplina dada à matéria pela nova legislação falimentar, considerando que o artigo 83, VII, da Lei 11.101/2005 elencou «as multas contratuais e as penas pecuniárias por infração das leis penais ou administrativas, inclusive as multas tributárias» na classe dos créditos subquirografários, exigindo-os. Na sua visão, essa regra legal deveria ser observada no caso em exame.

Esssas razões, entretanto, não prosperam.

De início, observe-se que o fato de existir possibilidade do levantamento da liquidação extrajudicial (artigo 52 da Lei Compl. 109/2001) não ilide os efeitos do decreto de liquidação estabelecidos pela lei, transformando tais obrigações civis em naturais.

Como já mencionado, o decreto operou regularmente seus efeitos, afastando as dívidas impostas por penalidades administrativas do montante a ser partilhado. Não há, no caso, suspensão da exigibilidade, como pode ocorrer com as obrigações de natureza tributária (artigo 151 do CTN), mas o afastamento da exigibilidade ( possibilidade de coação do credor em face do patrimônio do devedor).

A pretendida «ressuscitação» do atributo da responsabilidade (exigibilidade) somente poderia ocorrer por intermédio de norma legal expressa ou da supressão dos efeitos do decreto, o que não se verifica. Ainda que se tenha por razoável a cobrança de tais débitos a posteriori, condicionada à força dos ativos financeiros, não foi essa a determinação legal que afastou, por completo, a exigibilidade.

O segundo argumento da tese também deve ser rejeitado.

A lei falimentar tratou a matéria de forma diferente, e até mesmo, mais eficaz. Isso porque ao contrário da Lei Compl. 109/2001, que determinou a inexigibilidade, a Lei 11.101/2005 apenas inseriu tais créditos na classe dos subquirografários. Isso implica a possibilidade de cobrança se a massa falida possuir ativos para tanto.

A princípio, deve-se atentar que a regra geral afasta as entidades de previdência complementar da legislação de falência (art. 2º, inciso II, da Lei 11.101/2005). Excepcionalmente, como já referido, as entidades de previdência complementar, de natureza aberta, poderão ter sua falência decretada.

Todavia, as disposições falimentares foram concebidas para regular situações diversas daquelas existentes na seara das entidades de previdência complementar. Consequentemente, a interpretação das normas deve ser compatível com a estrutura e os princípios da entidade em liquidação.

Portanto, apenas se decretada a falência é que as normas da Lei 11.101/2005 poderão ser utilizadas, e somente naquilo que não colida com as normas específicas das entidades de previdência complementar.

No caso, reitere-se que a Lei Compl. 109/2001 previu expressamente a inexigibilidade das obrigações. Muito embora, a Lei de Falência estabeleça em outro sentido, deve ser aplicada a norma específica que assim preconiza:


Art. . 34. Aplicam-se a liquidação extrajudicial no que couberem e não colidirem com os preceitos desta Lei, as disposições da Lei de Falências (Decreto-Lei 7.661, de 21 de junho de 1945), equiparando-se ao síndico, o liquidante, ao juiz da falência, o Banco Central do Brasil, sendo competente para conhecer da ação refocatória prevista no artigo 55 daquele Decreto-lei, o juiz a quem caberia processar e julgar a falência da instituição liquidanda (dispositivo aplicável às entidades de previdência complementar por força do artigo 3º da Lei 10.190/2001).

Havendo colisão frontal sobre esse ponto entre a Lei Complementar 109/2001 e a Lei de Falências, deve prevalecer a norma que regular as entidades de previdência, que tornou inexigíveis as multas administrativas.

Apenas como reforço, anoto que, embora exigíveis na falência, as multas administrativas são irrelevantes para a extinção das obrigações do falido, pois a lei falimentar considera que o pagamento de metade dos credores quirografários basta para a extinção do feito, relegando a segundo plano as obrigações subquirografárias, que na prática não serão quitadas.

Em suma, a Lei Compl. 109/2001, que rege, inicialmente, a liquidação extrajudicial das entidades de previdência complementar, estabeleceu como efeito imediato do decreto de liquidação extrajudicial a inexigibilidade das obrigações relativas à multa administrativa. Em consequência, deve ser extinto o presente feito, nos termos determinados pelo aresto recorrido. ...» (Min. Castro Meira).»

Doc. LegJur (131.8663.4000.3400) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
▪ Tributário (Jurisprudência)
▪ Execução fiscal (Jurisprudência)
▪ Certidão de Dívida Ativa – CDA (Jurisprudência)
▪ Multa administrativa (v. ▪ Execução fiscal) (Jurisprudência)
▪ Liquidação extrajudicial (Jurisprudência)
▪ Previdência privada (Jurisprudência)
▪ Entidade de previdência complementar (v. ▪ Liquidação extrajudicial) (Jurisprudência)
▪ Previdência complementar (v. ▪ Previdência privada) (Jurisprudência)
▪ Hermenêutica (Jurisprudência)
▪ Interpretação lógico-sistemática (v. ▪ Hermenêutica) (Jurisprudência)
▪ Suspensão do feito executivo (v. ▪ Execução fiscal) (Jurisprudência)
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