Jurisprudência em Destaque
STJ. 3ª T. Propriedade industrial. Marca. Produtos originais. Importação paralela. Conceito. Necessidade de consentimento do titular da marca. Territorialidade nacional exigida na exaustão da marca, mediante o ingresso consentido no território brasileiro. Oposição superveniente, contudo, ao prosseguimento da importação, após longo período de atividade importadora consentida. Recusa de vender pela proprietária da marca. Violação do princípio da livre concorrência. Indenização por lucros cessantes decorrentes da recusa de vender. Liquidação por arbitramento. Considerações do Min. Sidnei Beneti sobre o conceito de importação paralela. CF/88, art. 170, IV. CCB/2002, art. 186. Lei 8.884/1994, art. 20. Lei 9.279/1996, art. 132, II. CPC, art. 475-C.
A importação paralela situa-se no âmago da garantia da exclusividade, decorrente do contrato de distribuição de produtos patenteados ou protegidos por marcas registradas.
PAULA A. FORGIONI elucida que «mediante a aposição de cláusula de exclusividade territorial garante-se ao distribuidor que será o único a comerciar os produtos em determinada região. No entanto, porque terceiros não estão obrigados aos termos do contrato celebrado entre o fornecedor e o seu distribuidor, nele não é possível disciplinar as vendas realizadas por adquirentes de segundo grau, ou seja, a mercadoria entra na área protegida não porque houve venda direta ou atuação invasiva de outro distribuidor, mas porque um adquirente, que comprou o bem de outro concessionário da mesma marca, revendeu-o no território reservado. ([...]) Esse fenômeno costuma ser chamado comercialização paralela de produtos e, quando envolve contratos internacionais de distribuição, importação paralela. Trading cross-borders by intermediaries é a idéia central». («Contrato de Distribuição», São Paulo, Revista dos Tribunais, 2005, p. 215 e 216).
Tornando preciso o conceito de importação paralela, a autora alude a que BERNADETTE GATT explica o que vem a ser importação paralela: First, goods are lawfully marketed in the place of export, the foreign country. These goods are channeled to the place of importation, the domestic country, via an authorized distribution network, usually at a higher price. Taking advantage of the lower price, a third person buys the goods in che cheaper, foreign country and imports them in parallel into the dearer, domestic country («Parallel importation and local business in Malta».). Para estudo da importação paralela, ver também MELANIE FARQUHARSON e VICENT SMITH, Parallel trade in Europe». (PAULA A. FORGIONI, «Contrato de Distribuição», Revista dos Tribunais, São Paulo, 2005, p. 216, nota 23).
a) Sob um primeiro critério, o territorial, a comercialização paralela classifica-se como interna, ou nacional, pela qual terceiro adquire, no país, produtos fora da área de distribuição cuja exclusividade é reservada ao distribuidor contratualmente autorizado pelo titular da patente ou da marca, e a externa, ou internacional, em que os produtos são adquiridos por terceiro, no exterior, fora da área de exclusividade reservada ao distribuidor pelo aludido titular, e comercializados no país cujo território delimita a área do representante.
Às importações paralelas – internacionais – dirige-se HELENA CÂNDIDA LISBOA GAEDE, conceituando-as como «aquelas efetuadas por cidadãos ou sociedades por sua conta ou por conta de terceiros, fora dos circuitos de distribuição exclusiva ou seletiva, por um território nacional, de produtos legitimamente comercializados em outro território, seja pelo titular do direito de propriedade intelectual ou outros direitos associados à fabricação, à comercialização e/ou identificação de produtos, seja por qualquer outra pessoa, com o consentimento ou a autorização do titular. Também conhecida como graygoods ou graymarket, diferencia-se a importação paralela da contrafação de produtos, por se tratar de produtos originais, comercializados legitimamente em outro território, diferenciando-se das importações autorizadas pelo titular dos direitos de Propriedade Intelectual, por ser efetuada fora da rede exclusiva de distribuidores». («Importação paralela e concorrência desleal», Revista da Associação Brasileira de Propriedade Intelectual. 83, jul/ago 2006. p. 45).
b) Sob um segundo critério, o do fundamento jurídico, classifica-se a comercialização paralela em contratual, quando estabelecida por cláusula contratual de reserva de exclusividade, inclusive quanto a parcelas demarcadas do território nacional ou mundial, e em legal, quando instituída pela lei, no caso, a lei do país a que destinados os produtos, o Brasil.
A opção pelo maior ou menor grau de permissão ou restrição no tocante à importação paralela situa-se no âmbito das forças da economia e do mercado nacional, cuja legislação pondera as diversas implicações e consequências da opção, segundo o próprio interesse do Estado. A respeito, PAULA A. FORGIONI explica que «os direitos de propriedade industrial podem ser utilizados de forma a impedir ou dificultar a importação/paralela de produtos. É preciso deixar bem claro, no entanto, que esse uso será ou não permitido por cada ordenamento jurídico conforme a política adotada (i.e., de acordo com o interesse tomado como digno de tutela jurídica». p. 217).
O art. 132, III, da Lei da Propriedade Industrial insere-se nessa segunda modalidade de restrição à comercialização – combinando o critério territorial e o critério do fundamento jurídico, ou seja, estabelece, «ex-vi legis», a restrição à comercialização no país via importação paralela.
Com efeito, dispõe o art. 132, III, da Lei da Propriedade Industrial ( Lei 9.279/96), que o titular da marca não poderá:
III – impedir a livre circulação do produto colocado no mercado interno, por si ou por outrem, com seu consentimento, ressalvado o disposto nos §3º e 4º do art. 68..
Atente-se a que, no âmbito do regramento da importação paralela pela lei – não pelas partes, isto é, não por negócio jurídico contratual – não se pode argumentar com a impossibilidade de submissão de terceiro por ato de vontade contratual de celebrantes de contrato de distribuição, de que o terceiro não participa. No caso da restrição legal, é a lei que dispõe e submete, aplicando-se a todo e qualquer agente da comercialização, no território nacional, de produtos de marca importada.
CLÁUDIA MARINS ALDIERS explica as restrições com clareza e segurança («As Importações Paralelas à Luz do Princípio de Exaustão do direito de Marca e seus Reflexos nos direitos Contratual e concorrencial», Rev da ABPI, 64, mai/jun 2003, p.29-54), o mesmo ocorrendo com ELIZABETH KASZNAR FEKETE («Importações Paralelas: a Implementação do princípio da Exaustão de Direitos no Mercosul, no Contexto da Globalização», em Rev. de Dir Mercantil, 113, p. 154-187 .
A variedade de regramentos é forçosa na comparação internacional. No âmbito da União Européia, segue-se a exaustão regional, isto é, a partir da colocação do produto pelo titular ou com seu consentimento dentro de um dos Estados integrantes da União Européia (consectário lógico, aliás, da própria europeização do sistema patentário, jurisprudencialmente submetido ao Tribunal Europeu de Patentes, o «Europäisches Patentamt», de Munique). No geral predomina o sistema da exaustão nacional. Nos Estados Unidos, a exaustão tem se restringido às vendas nacionais (p. ex., Caso Fuji-Foto Philm Co x Jazz Photo corp, Federal Circuit 394 F.3d 1368 - Fed. Cir. 2005). Vem, entretanto, o princípio sendo mitigado em algumas circunstâncias (p. ex., no Caso Quality King Distributors Inc., v. Lanza Research International Inc., 523 U.S. 135 (1998), em que produtos fabricados nos Estados Unidos foram primeiramente exportados para Malta)
Registra-se, por outro lado, a recusa do sistema da exaustão internacional (adotado antes por alguns Estados, como a Alemanha, mas rechaçados pelo Tribunal de Justiça da União União Européia).
Ressalvem-se situações específicas cujo regramento ainda pende de determinar, como o debate a respeito da importação paralela de medicamentos – que, no âmbito da União Européia, os preços de medicamentos não podem ser determinados livremente pelo fabricante e os governos podem interferir na fixação do preço cobrado – o que, pela especificidade do produto, forçosamente trará conseqüências para o conceito de exaustão nacional, regional ou internacional.
Certos casos, como o dos medicamentos, podem, ainda, vir a receber tratamento legal diferenciado, imposto por necessidades de Estados determinados, cuja legislação dosa as premências e conveniências nacionais, especialmente a necessidade de fornecimento de determinados produtos à população, de estímulo à concorrência para evitar a formação de monopólios ou cartéis, de atendimento privilegiado de determinadas áreas do consumo – mas de nenhuma dessas hipóteses se cogita no caso presente, em que se está diante de importação de «whiskies», produto desprovido de fornecimento imprescindível e, ademais, com farto fornecimento por diversos produtores e marcas em salutar concorrência no mercado nacional. ...» (Min. Sidnei Beneti).»
Doc. LegJur (132.5182.7001.1800) - Íntegra: Click aqui
Referência(s):
▪ Propriedade industrial (Jurisprudência)
▪ Marca (Jurisprudência)
▪ Importação (v. ▪ Marca) (Jurisprudência)
▪ Produtos originais (v. ▪ Marca) (Jurisprudência)
▪ Conceito (v. ▪ Importação paralela) (Jurisprudência)
▪ Consentimento do titular (v. ▪ Marca) (Jurisprudência)
▪ Territorialidade nacional (v. ▪ Marca) (Jurisprudência)
▪ Liquidação por arbitramento (Jurisprudência)
▪ CF/88, art. 170, IV
▪ CCB/2002, art. 186
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▪ CPC, art. 475-C
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