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STJ. 3ª T. Sentença. Erro material. Fundamentação. Dispositivo. Coisa julgada. Considerações da Minª. Nancy Andrighi sobre o tema. CPC, arts. 463, I, 474 e 469, II.
Os recorrentes aduzem que houve erro material na sentença, passível de correção sem que se cogite em ofensa à coisa julgada. Segundo seu entendimento, embora não conste expressamente no dispositivo da sentença a declaração de nulidade da procuração e do substabelecimento, que foram utilizados para a lavratura da escritura de compra e venda anulada, essa declaração foi requerida na petição inicial e constou da fundamentação da sentença, que deve ser interpretada em conjunto com seu dispositivo.
Com efeito, segundo os recorrentes, a questão da nulidade dos instrumentos de mandato foi decidida e, portanto, fez coisa julgada, não se podendo considerar unicamente a literalidade do dispositivo em detrimento da interpretação sistemática da sentença.
Conforme reconhecido pelo Tribunal de origem, de fato, foi requerida a declaração de nulidade da procuração e do substabelecimento na petição inicial. A questão, todavia, não foi mencionada no dispositivo da sentença, bem como não foi objeto de embargos de declaração.
O art. 463, I, do CPC autoriza ao juiz alterar a sentença, de ofício ou a requerimento da parte, mesmo após encerrada a função jurisdicional, para correção de inexatidões materiais ou erros de cálculo, bem como mediante a interposição de embargos de declaração.
Considerando que os embargos não foram opostos, a única possibilidade de alteração da sentença - na hipótese, já transitada em julgado - seria a constatação de um eventual erro material.
Entende-se por erro material aquele erro evidente, claro, reconhecido primu ictu oculi, consistente em equívocos materiais, sem conteúdo decisório propriamente dito. Como exemplo, mencionem-se os erros de grafia, de nome, valor, etc.
Nesse sentido, CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, ao tratar da correção das inexatidões materiais, nos termos do art. 463, I, do CPC, observa: «Precisamente porque não devem afetar em substância o decisório da sentença, o que mediante elas se faz não altera, não aumenta e não diminui os efeitos desta. Eventual coisa julgada que já se tenha abatido sobre esses efeitos não ficará prejudicada pela mera retificação formal». (Instituições de Direito Processual Civil, 2ª; Ed.; v. III, Malheiros, São Paulo, 2002, p. 686).
Na hipótese, a inserção da declaração de nulidade da procuração e substabelecimento outorgados ao recorrido, não se trata de mero ajuste do dispositivo da sentença ao que realmente foi deliberado pela inteligência e vontade do juiz no momento em que solucionou a questão debatida nestes autos, mas de verdadeira alteração ou ampliação do conteúdo decisório, com a respectiva extensão dos efeitos da coisa julgada.
Aliás, é de se notar que, nem mesmo na fundamentação da sentença, admitiu-se claramente a nulidade da procuração ou do substabelecimento questionados.
Com efeito, o trecho da decisão, mencionado pelo Tribunal de origem, e que, segundo os recorrentes, evidenciaria que a questão foi decidida é o seguinte:
Assim, é nula de pleno jure a escritura de compra e venda lavrada verticalmente pelo ascendente, sem o placet dos demais, como nula, por equivalentes razões, como no caso dos autos, a outorgada obliquamente, via de teste di legno. Nessa última hipótese a intenção de ocultar a verdade, com o aproveitamento de um terceiro que se presta ao papel de comprador e depois de vendedor fantoccio. (e-STJ fl. 323).
A nulidade da escritura é clara e o seu fundamento foi a ausência de autorização dos demais descendentes para que fosse efetivada a venda de pai para o filho. A expressão «outorgada obliquamente», todavia, pode se referir à própria escritura, como também à forma em que se deu o negócio – por interposta pessoa (teste di legno/fantoccio ou «testa de ferro», «fantoche», como se diria coloquialmente em língua portuguesa) -; ou, ainda, pode fazer referência à procuração.
Ocorre que, em nenhum outro momento da fundamentação, a sentença faz referência à nulidade procuração ou ao substabelecimento, nem expõe os eventuais motivos que poderiam levar a essa nulidade. Ressalte-se que a escritura de compra e venda foi anulada com fundamento na simulação e não no eventual vício de representação das partes. Outrossim, como bem observado pelo TJ/ES, a nulidade do ato praticado pelo procurador não implica necessariamente a nulidade da procuração.
Ademais, ainda que, por hipótese, se considere que a nulidade dos instrumentos de mandato decorra da fundamentação da sentença, conforme consignado pelo Tribunal de origem, essa não faz coisa julgada, tanto que, em sede de outra ação de adjudicação compulsória, a mesma procuração foi considerada válida. Novamente, são pertinentes as palavras de CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO:
Até mesmo o fundamento mais importante e indispensável à conclusão a ser tomada na parte dispositiva da sentença permanece livre para nova apreciação judicial, sempre que o objeto do processo seja outro. Expressamente, o Código exclui a imutabilidade dos fundamentos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença». (Op. Cit., p. 313).
Por fim, acerca do dissídio jurisprudencial apontado, esclareça-se que uma coisa é interpretar o dispositivo da sentença de acordo com a fundamentação, nas hipóteses em que se constate alguma incongruência, como ocorreu no acórdão mencionado como paradigma pelos recorrentes. Afinal, de fato, o dispositivo não pode ser considerado isoladamente. Outra coisa bem distinta é estender os efeitos da coisa julgada aos fundamentos da sentença, com o pretexto de se corrigir erro material.
Diante do exposto, não se pode considerar que há mero erro material, cognoscível primu ictu oculi e passível de ser corrigido a qualquer tempo. Na hipótese, o suposto erro material, consistente na omissão do dispositivo da sentença no que respeita ao pedido de declaração de nulidade da procuração e do substabelecimento, converte-se em erro de julgamento, que deveria ter sido impugnado mediante o recurso cabível ou ação rescisória.
Ausente, portanto, qualquer violação dos arts. 463, I; 474 e 469, I, do CPC. ...» (Minª. Nancy Andrighi).»
Doc. LegJur (136.2630.7000.1800) - Íntegra: Click aqui
Referência(s):
▪ Sentença (Jurisprudência)
▪ Erro material (v. ▪ Sentença) (Jurisprudência)
▪ Fundamentação (v. ▪ Sentença) (Jurisprudência)
▪ Dispositivo (v. ▪ Sentença) (Jurisprudência)
▪ Coisa julgada (v. ▪ Sentença) (Jurisprudência)
▪ CPC, art. 463, I
▪ CPC, art. 474
▪ CPC, art. 469, II.
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