Jurisprudência em Destaque
STJ. 3ª T. Desistência da ação. Concordância do réu. Necessidade. Julgamento da ação para formação da coisa julgada. Fundamentação razoável. Extinção do processo. Impossibilidade. Ação de revisão contratual. Considerações da Minª. Nancy Andrighi sobre o tema. CPC, art. 267, VIII, e § 4º.
I – Da desistência da ação (violação do art. 267, §4º, do CPC).
Na hipótese, a recorrente AYMORÉ CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S/A, após ter apresentado defesa e requerido o julgamento do mérito da ação, manifestou expressa discordância em relação ao pedido de desistência, feito por VIEIRA E SILVA COMERCIAL DE GÁS LTDA, alegando, em síntese, que tinha o direito ao julgamento de improcedência do pedido e, consequentemente, a ter a seu favor uma sentença de mérito, a qual, por fazer coisa julgada, impediria que a autora promovesse outra ação idêntica, em seu desfavor.
Não obstante isso, o juiz de primeiro grau homologou a desistência requerida pela autora e extinguiu o processo sem resolução do mérito, por entender que a discordância da ré era desprovida de fundamentação razoável, caracterizando abuso de direito, o que foi confirmado pelo Tribunal de origem.
Após a contestação, a desistência da ação pelo autor depende do consentimento do réu porque ele também tem direito ao julgamento de mérito da lide. De fato, o conceito de tutela jurisdicional deve levar em conta não apenas o ponto de vista do autor, que movimentou a máquina judiciária, mas também o do réu que, quando contesta a ação, também está buscando essa tutela, só que em sentido contrário daquela que busca o autor.
Assim, o processo não pode ser entendido simplesmente como um modo de exercício de direitos pelo autor, mas como um instrumento do Estado para o exercício de uma função sua, qual seja, a jurisdiçãoDINAMARCO, Cândido Rangel. Tutela jurisdicional, RePro 81/55-56.
Sobre o tema não há divergência na doutrina. É pacífico o entendimento de que «a tutela jurisdicional não é privilégio do autor: ela será conferida àquele que tiver razão segundo o entendimento do juiz». (CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, Instituições de Direito Processual Civil, v. II, São Paulo: Malheiros, 2002, p. 140). No mesmo sentido, CASSIO SCARPINELLA BUENO observa:
a rejeição do pedido do autor significa prestação de tutela jurisdicional para o réu. Tutela jurisdicional é certo, que pode ser de qualidade diversa daquela pretendida originalmente pelo autor, mas de qualquer sorte, o proferimento de sentença nos moldes do art. 269, I, de «rejeição do pedido do autor». acrescenta ao patrimônio jurídico do réu, um quid suficiente que impõe a sua prévia oitiva. O réu, com efeito, tem inegável interesse no proferimento de uma decisão que lhe favoreça e que, sendo de mérito, inviabiliza que o autor volte a formular aquele mesmo pedido pelo mesmo fundamento em seu detrimento (Curso Sistematizado de Direito Processual Civil, v. 2;, 4ªed., São Paulo: Saraiva, 2011, p. 379) (sem destaque no original).
Com efeito, a sentença de improcedência interessa muito mais ao réu do que a sentença de extinção do processo sem resolução do mérito, haja vista que, na primeira hipótese, em decorrência da formação da coisa julgada material, o autor estará impedido de ajuizar outra ação, com o mesmo fundamento, em face do mesmo réu.
Na hipótese, além desse fundamento, ligado ao interesse na sentença de mérito, a recorrente ainda sustenta que, para que a desistência da ação não fosse homologada pelo juiz, bastaria a sua discordância quanto ao pedido da autora, sendo despicienda a explicitação de motivos. Contudo, é importante consignar que esse segundo argumento não procede.
Isso porque, apesar da existência de entendimentos doutrinários no sentido de que a recusa do réu independe de fundamentação, não cabendo ao juiz, portanto, examinar os motivos pelos quais o réu opta por prosseguiDINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil, v. III, 2ª ed., São Paulo: Malheiros, 2002, p. 131., segundo a jurisprudência desta Corte, essa recusa deve ser fundamentada e justificada, não bastando apenas a simples alegação de discordância, sem a indicação de qualquer motivo relevante. Nesse sentido: Resp 864.432/PR, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJ de 27.03.2008; REsp Acórdão/STJ, Rel. Min. Salvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 21.09.1998; REsp 976.861/SP, Rel. Min. Castro Meira, 2ª Turma, DJ de 19.10.2007.
Também NELSON NERY JR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY: «O réu, depois de citado, tem de ser ouvido sobre o pedido de desistência formulado pelo autor. Somente pode opor-se a ele, se fundada a sua oposição. A resistência pura e simples, destituída de fundamento razoável, não pode ser aceita porque importa em abuso de direito». (Código de Processo Civil Comentado, 9ªed., São Paulo: RT, 2006, p. 437) (sem destaque no original).
Por outro lado, verifica-se que, na hipótese, a recorrente não ofereceu resistência pura e simples, destituída de fundamento razoável. A discordância veio fundada no direito ao julgamento de mérito da demanda, que possibilitaria a formação da coisa julgada material, impedindo a propositura de nova ação com idênticos fundamentos.
E, no meu entendimento, essa argumentação não caracteriza abuso de direito por parte da ré, sendo, por conseguinte, relevante o primeiro argumento apontado pela recorrente e que fundamentou sua recusa.
Note-se que, desde sua primeira manifestação no processo, a recorrente pleiteia o julgamento de improcedência do pedido. Com efeito, na contestação, a defesa é unicamente de mérito, não tendo sido aduzidas preliminares que ensejariam o pedido de extinção do processo, com fulcro no art. 267 do CPC.
Observe-se que, se a recorrente tivesse pleiteado a extinção do processo sem resolução do mérito, em sede de contestação, até se poderia entender que a recusa apresentada posteriormente seria destituída de fundamentação razoável porque contraditória em relação à sua manifestação anterior.
Nesse sentido, a lição de CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO: «só não é dado ao réu impedir a extinção por desistência, quando em sua defesa ele próprio houver pedido a extinção do processo por outros motivos – porque nesse caso o autor estar-lhe-á oferecendo precisamente aquilo que ele pleiteava (Op. Cit., v. III, p. 131).
Todavia, conforme já mencionado, não foi o que ocorreu na hipótese, em que, aliás, após o oferecimento de réplica, o processo já estava pronto para julgamento, tendo o juiz de primeiro grau, inclusive, indeferido a produção de provas e afirmado que a questão era unicamente de direito, devendo os autos irem conclusos para a sentença (e-STJ fl. 110).
Diante do exposto e considerando o direito do réu à tutela jurisdicional de mérito, em sentido contrário daquela pleiteada pelo autor, verifica-se que a discordância da recorrente quando ao pedido de homologação da desistência da ação, formulado pela recorrida, na hipótese, está fundada em argumentação razoável, não sendo possível a extinção do processo com fulcro no art. 267, VIII e §4º, do CPC.
Forte nessas razões, DOU PROVIMENTO ao recurso especial, para anular o acórdão recorrido, determinando o retorno dos autos à origem para regular prosseguimento do feito, com a prolação da sentença de mérito. ...» (Minª. Nancy Andrighi).»
Doc. LegJur (140.2980.6000.0000) - Íntegra: Click aqui
Referência(s):
▪ Desistência da ação (Jurisprudência)
▪ Concordância do réu (v. ▪ Desistência da ação) (Jurisprudência)
▪ Coisa julgada (Jurisprudência)
▪ Fundamentação (v. ▪ Desistência da ação) (Jurisprudência)
▪ Extinção do processo (Jurisprudência)
▪ CPC, art. 267, VIII, e § 4º
▪ CPC, art. 467.
▪ 1.184.935/STJ (Processo civil. Pedido de desistência da ação posterior à citação. Imprescindibilidade de oitiva do réu. Interpretação teleológica do CPC, art. 267, § 4º. Discordância do réu. Lei 9.469/1997, art. 3º. Motivo relevante).
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