Jurisprudência em Destaque

STJ. 4ª T. Responsabilidade civil. Consumidor. Médico. Cirurgia plástica. Profissional liberal. Obrigação de resultado. Alergia. Superveniência de processo alérgico. Caso fortuito. Rompimento do nexo de causalidade. Inversão do ônus da prova. Ausência de advertência. Recurso especial. Matéria de fatos e provas. Especial não conhecido. Considerações do Min. Luis Felipe Salomão sobre a responsabilidade médica, sob a perspectiva de procedimento estético. Precedentes do STJ. CF/88, art. 105, III. CPC, art. 541. Lei 8.038/1990, art. 26. CCB/2002, art. 186. CDC, arts. 6º, VII e 14, § 4º.

Postado por legjur.com em 19/07/2013
«... 4.1. Sob essa perspectiva, no procedimento cirúrgico para fins estéticos, conquanto a obrigação seja de resultado, não se vislumbra uma responsabilidade objetiva pelo insucesso da cirurgia, mas mera presunção de culpa médica, o que importa a inversão do ônus da prova, cabendo ao profissional elidi-la, de modo a exonerar-se da responsabilidade contratual pelos danos causados ao paciente em razão do ato cirúrgico.

Não é outro o teor do art. 14, § 4º, do CDC:


Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.


[...]


§ 4º A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

Nessa linha de intelecção, são passíveis de alegação e comprovação pelo médico as tradicionais causas excludentes da responsabilidade, quais sejam, o caso fortuito, a força maior e a culpa exclusiva da vítima.

4.2. Com efeito, somente eventual intercorrência de fatores e reações estranhas à cirurgia, embora não infirme a tese da obrigação de resultado do cirurgião plástico, consubstancia causa eficiente e autônoma que, por si só, seria capaz de romper o nexo de causalidade entre o dano e a conduta médica.

Assim leciona Rui Stoco:


Há, porém, casos em que o cirurgião, embora aplicando corretamente as técnicas que sempre utilizou em outros pacientes com absoluto sucesso, não obtém o resultado esperado.


Se o insucesso parcial ou total da intervenção ocorrer em razão de peculiar característica inerente ao próprio paciente e se essa circunstância não for possível de ser detectada antes da cirurgia, estar-se-á diante de verdadeira escusa absolutória ou causa excludente da responsabilidade. (Op. Cit. p. 646)

É bem verdade que, conquanto o Código de Defesa do Consumidor não faça referência expressa ao caso fortuito como excludente da responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço, Ada Pelegrini Grinover destaca que:


[...] é certo que «a eximente do caso fortuito ou da força maior coloca-se no mundo fenomênico e não será nenhuma disposição normativa que irá suprimi-la do universo jurídico.


[...] Na verdade, diante do impacto do acontecimento, a vítima sequer pode alegar que o produto se ressentia de defeito, vale dizer, fica afastada a responsabilidade do fornecedor pela inocorrência dos respectivos pressupostos.». (Grinover, Ada Pellegrini et al. Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 7a. Ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001, p. 171).

Zelmo Denari corrobora esse posicionamento:


Por outro lado, quando o caso fortuito ou força maior se manifesta após a introdução do produto no mercado de consumo, ocorre uma ruptura do nexo de causalidade que liga o defeito ao evento danoso. Nem tem cabimento a qualquer alusão ao defeito do produto, uma vez que aqueles acontecimentos, na maior parte das vezes imprevisíveis, criam obstáculos de tal monta que a boa vontade do fornecedor não pode suprir. Na verdade, diante do impacto do acontecimento, a vítima sequer pode alegar que o produto se ressentia de defeito, vale dizer, fica afastada a responsabilidade do fornecedor pela inocorrência dos respectivos pressupostos. (Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2011, p. 207)

A Terceira Turma desta Corte, por ocasião do julgamento do REsp Acórdão/STJ, de relatoria do Min. Eduardo Ribeiro, publicado no DJ de 15/5/2000, posicionou-se da mesma forma, assentando que «o fato de o art. 14, § 3º do Código de Defesa do Consumidor não se referir ao caso fortuito e à força maior, ao arrolar as causas de isenção de responsabilidade do fornecedor de serviços, não significa que, no sistema por ele instituído, não possam ser invocadas. Aplicação do art. 1.058 do Código Civil.»

Dessarte, a presunção de culpa do cirurgião por insucesso na cirurgia plástica pode ser afastada mediante prova contundente de ocorrência de fator imponderável, apto a eximi-lo do dever de indenizar.

A jurisprudência deste Tribunal Superior desse entendimento não se afasta:


ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. OBRIGAÇÃO DE MEIO. NATUREZA ESTÉTICA. REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 07/STJ.


CASO FORTUITO. EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE.


1. A instância ordinária valeu-se da detida avaliação dos elementos fático-probatórios acostados aos autos para atingir a conclusão de que a cirurgia a que se submeteu a ora recorrente não encerrava natureza estética - cirurgia plástica destinada a melhorar a aparência física do paciente -, não sendo viável a alteração do entendimento estampado no acórdão combatido em obséquio à vedação insculpida na Súmula 07/STJ.


2. Mesmo que se admitisse, a título de argumentação, que o procedimento cirúrgico promovido pelo recorrido ostentou caráter estético, é curial que na obrigação de resultado a responsabilidade do médico remanesce subjetiva, cabendo-lhe, todavia, comprovar que os danos suportados pelo paciente advieram de fatores externos e alheios a sua atuação profissional.


3. Demonstrado o caso fortuito, afasta-se o dever de indenizar na medida em que se elimina o nexo causal entre o pretenso prejuízo e o serviço desempenhado pelo médico. Precedente: REsp Acórdão/STJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 26.08.10.




4. Recurso especial não conhecido. (REsp 1269832/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/09/2011, DJe 13/09/2011)




RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. ART. 14 DO CDC. CIRURGIA PLÁSTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. CASO FORTUITO. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE.


1. Os procedimentos cirúrgicos de fins meramente estéticos caracterizam verdadeira obrigação de resultado, pois neles o cirurgião assume verdadeiro compromisso pelo efeito embelezador prometido.


2. Nas obrigações de resultado, a responsabilidade do profissional da medicina permanece subjetiva. Cumpre ao médico, contudo, demonstrar que os eventos danosos decorreram de fatores externos e alheios à sua atuação durante a cirurgia.


3. Apesar de não prevista expressamente no CDC, a eximente de caso fortuito possui força liberatória e exclui a responsabilidade do cirurgião plástico, pois rompe o nexo de causalidade entre o dano apontado pelo paciente e o serviço prestado pelo profissional.


4. Age com cautela e conforme os ditames da boa-fé objetiva o médico que colhe a assinatura do paciente em «termo de consentimento informado», de maneira a alertá-lo acerca de eventuais problemas que possam surgir durante o pós-operatório.


RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.


(REsp Acórdão/STJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/08/2010, DJe 26/08/2010)



Em verdade, considera-se caso fortuito o acontecimento que escapa a toda diligência, inteiramente estranho à vontade do devedor da obrigação, ou seja, trata-se de evento imprevisível.

Quanto ao conceito de imprevisibilidade aplicado à responsabilidade civil, recorremos mais uma vez às lições de Sergio Cavalieri:


Não sendo previsto, o resultado terá que, pelo menos, ser previsível. Este é o limite mínimo da culpa - a previsibilidade, entendendo-se como tal a possibilidade de previsão. Embora não previsto, não antevisto, não representado mentalmente, o resultado poderia ter sido previsto e, consequentemente, evitado.


Só se pode evitar o que se pode prever. E previsível é aquilo que tem certo grau de probabilidade, de forma que, segundo as regras da experiência, é razoável prevê-lo. Só há o dever de evitar o dano que for razoável prever.


Devemos ter em mente, todavia, que a previsibilidade necessária para a configuração da culpa não é a previsibilidade genérica, abstrata, sobre aquilo que um dia pode acontecer; mas sim a previsibilidade específica, presente, atual, relativa às circunstâncias do momento da realização da conduta. [...] Não basta essa previsibilidade (abstrata), como já se disse, para configurar a culpa. Será necessário que determinado acontecimento, concretamente considerado, pudesse ter sido previsto pelo agente, e consequentemente evitado, mas não o foi por falta de cuidado. Se, embora genericamente previsível, não foi possível prever a efetiva ocorrência do fato danoso, não que se falar em previsibilidade.


[...]


Não havendo previsibilidade, estaremos fora dos limites da culpa, já no terreno do caso fortuito ou da força maior. [...] Ninguém pode responder por fato imprevisível porque, na realidade, não lhe deu causa. (Op. Cit., p. 55-56)

5. No caso em julgamento, o acórdão recorrido estabeleceu, com base nas provas produzidas, duas premissas: a) não houve consentimento informado; b) o médico não logrou comprovar o caso fortuito.

Confira-se:


«Não se observa tenha o requerido, em momento algum, advertido a paciente sobre os riscos da cirurgia. A redução efetuada foi muito grande. Subentende-se que fosse essa a intenção da paciente. Assim, deveria ser advertida da complexidade e do risco de tamanha intervenção.


Em que pese ter o réu sustentado a ocorrência de caso fortuito, ele não se desincumbiu de prová-lo. Embora a perícia afirme não ser comum a ocorrência de processo alérgico nesse tipo de procedimento, não há como se afirmar que esse fato fosse imprevisível. E ainda que não fosse evitável, poderia ser corrigido, atenuado.


Não há como se aceitar o quadro exposto nas fotos de fls. 43-44 » (e-STJ fls. 249-250)

Como visto, no particular, o Tribunal de origem firmou a sua conclusão, no sentido de que não houve advertência à paciente quanto aos riscos da cirurgia e também que o médico não provou a ocorrência de caso fortuito, amparado na análise dos elementos fático-probatórios contidos nos autos.

Rever os fundamentos do acórdão recorrido importaria necessariamente o reexame de provas, o que é defeso nesta fase recursal ante a incidência da Súmula 7/STJ.

6. Ante o exposto, não conheço do recurso especial. ...» (Min. Luis Felipe Salomão).»

Doc. LegJur (134.3833.2000.6200) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
▪ Responsabilidade civil (Jurisprudência)
▪ Consumidor (Jurisprudência)
▪ Médico (v. ▪ Cirurgia plástica) (Jurisprudência)
▪ Cirurgia plástica (v. ▪ Médico) (Jurisprudência)
▪ Profissional liberal (v. ▪ Médico) (Jurisprudência)
▪ Obrigação de resultado (v. ▪ Profissional liberal) (Jurisprudência)
▪ Alergia (v. ▪ Cirurgia plástica) (Jurisprudência)
▪ Processo alérgico (v. ▪ Cirurgia plástica) (Jurisprudência)
▪ Caso fortuito (v. ▪ Médico) (Jurisprudência)
▪ Rompimento do nexo de causalidade (v. ▪ Cirurgia plástica) (Jurisprudência)
▪ Ônus da prova (v. ▪ Consumidor) (Jurisprudência)
▪ Inversão do ônus da prova (v. ▪ Consumidor) (Jurisprudência)
▪ Advertência (v. ▪ Cirurgia plástica) (Jurisprudência)
▪ Recurso especial (Jurisprudência)
▪ Matéria de fatos e provas (v. ▪ Recurso especial) (Jurisprudência)
▪ Procedimento estético (v. ▪ Cirurgia plástica) (Jurisprudência)
▪ CF/88, art. 105, III
▪ CPC, art. 541
Lei 8.038/1990, art. 26 (Legislação)
▪ CCB/2002, art. 186
▪ CDC, art. 6º, VII
▪ CDC, art. 14, § 4º

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