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STJ. 4ª T. Propriedade industrial. Marca. Uso indevido de marca alheia anteriormente registrada. Impossibilidade de coexistência. Prescrição. Prazo prescricional para reparação de danos. Termo a quo. Dano permanente. Considerações do Min. Luis Felipe Salomão sobre a distintividade relativa, ou diferencial. Lei 9.279/1996, arts. 124, XIX, 129, 208, 209 e 225. CF/88, art. 5º, XXIX. CDC, art. 4º, VI.

Postado por legjur.com em 06/02/2014
«... 3.3. Da distintividade relativa, ou diferencial


A questão aqui é a do valor das marcas entre si - sua distintividade relativa. Uma marca deve diferenciar-se das marcas que disputam mesmo mercado de forma tal que lhe garanta a unicicidade: o reconhecimento de que a origem indicada por uma marca se distingue da outra. Ou seja, que, entre uma e outra, não exista confundibilidade em tese e, a fortiori, confusão.


[...]


3.3.1. A análise de mercado


Para se determinar a confusão marcária verifica-se, em primeiro lugar, se existe, entre as mesmas marcas, um único e só mercado real (produto ou serviço idêntico ou semelhante), pois, como assinala a recente obra oficial da Organização Mundial da Propriedade Intelectual sobre o assunto, similaridade de bens e serviços é item distinto, e prejudicial, da análise de confusão entre marcas.


3.3.1.1. Simultaneidade no mercado real


A simultaneidade a que se refere o inciso XIX do art. 124 do Código não é formal, ou de parecenças lógicas, mas pertinência das duas marcas ao mesmo mercado. Ou seja, se os produtos ou serviços a que se referem as marcas (e não as marcas em si mesmo) forem competidores num mesmo espaço de mercado.


A concorrência, para ser relevante para a propriedade intelectual [...] é preciso que se faça sentir em relação a um mesmo produto ou serviço.


A identidade objetiva pressupõe uma análise de utilidade do bem econômico: haverá competição mesmo se dois produtos forem dissimilares, desde que, na proporção pertinente, eles atendam a algum desejo ou necessidade em comum. Assim, e utilizando os exemplos clássicos, a manteiga e a margarina, o café e a chicória, o álcool e a gasolina. É necessário que a similitude objetiva seja apreciada em face do consumidor relevante.


[...]


O inciso XIX do art. 124 do Código preceitua que (uma vez se determine a similitude de mercado ou afinidade) deve-se proceder à comparação entre as marcas, para se verificar se a reprodução (no todo ou em parte, ainda que com acréscimo) ou imitação (nas mesmas condições), é efetivamente suscetível de causar confusão ou associação com a marca alheia.


Esse procedimento é, assim, um segundo estágio da análise, após se determinar que há competição real ou simbólica efetiva ou potencial, entre os produtos e serviços assinalados.


Haverá confusão «quando não podemos reconhecer as distinções, as diferenças; quando as coisas se tomam uma pelas outras; quando se misturam umas com as outras»


Haverá associação nas hipóteses em que, mesmo não cabendo confusão - o consumidor não toma um signo por outro - há intensa relação simbólica entre uma marca e outra, ou assimilação entre a marca e a linguagem comum de um segmento de mercado, com risco de que o público possa entender que o signo tem como referência um produto ou serviço distinto do real, ou uma origem diversa da verdadeira.


[...]


3.3.2.1. Análise em abstrato


Tanto no exame prévio ao registro quanto, pelas mesmas razões, na revisão dos atos da administração e juízo de argüição de nulidade, a análise é do potencial de confusão ou associação. Com efeito, não se tem aí juízo de concorrência desleal, que sempre exige análise ad hoc e fática, nem mesmo juízo de contrafação.


Neste contexto de exame ou de nulidade - e só neste - aplica-se com precisão o que diz Mauricio Lopes Oliveira:


Não é necessário que a confusão efetivamente se dê, basta a possibilidade, a qual entende-se existir sempre que as diferenças não se percebam sem minucioso exame e confrontação da marca legítima com a semelhante, conforme destacou Affonso Celso, in Marcas industriaes e nome commercial, Imprensa Nacional, 1888, pp. 55-56. Idêntico é o entendimento de Clóvis Costa Rodrigues: «Bastará, tão-só, existir possibilidade de confusão, caracterizada pela dúvida, pela incerteza, pela iminência de fraude."[...]


[...]


Dois princípios são capitais para a determinação da colidência. Em primeiro lugar, a colidência ou anterioridade deve ser apreciada levando em conta as semelhanças do conjunto, em particular dos elementos mais expressivos, e não as diferenças de detalhe:


[...]


Em segundo lugar, deve-se verificar a semelhança ou diferença à luz do público a quem a marca é destinada, em sua função própria. Tal critério que é particularmente valioso no caso de contrafação, não pode deixar de ser levado em conta no parâmetro da registrabilidade. (BARBOSA, Denis Borges. Proteção das Marcas: uma perspectiva semiológica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 85-89)

De fato, o artigo 124, XIX, da Lei da Propriedade Industrial expressamente veda o registro de marca que imite outra preexistente, ainda que em parte e com acréscimo, «suscetível de causar confusão ou associação com marca alheia»

Nessa toada, conforme decidido no REsp 1.105.4222 - MG, relatado pela Ministra Nancy Andrighi, a finalidade da proteção ao uso das marcas é dupla: por um lado protegê-la contra usurpação, proveito econômico parasitário e o desvio desleal de clientela alheia e, por outro, evitar que o consumidor seja confundido (art.4º, VI, do CDC):

  • 1.105.422/STJ (Propriedade industrial. Marca. Medicamento. Radical «Sor». Ação de abstenção de uso de marca cumulada com pedido de indenização por danos materiais e compensação por danos morais. Utilização de termo designativo do componente principal do medicamento. Coexistência. Possibilidade. Consumidor. Concorrência desleal. Inexistência na hipótese. Lei 9.279/1996, arts. 18, II, 124, VI, 129 e 195, III. CDC, art. 4º, VI. CF/88, art. 5º, XXIX).



PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. AÇÃO DE ABSTENÇÃO DE USO DE MARCA CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. UTILIZAÇÃO DE TERMO DESIGNATIVO DO COMPONENTE PRINCIPAL DO MEDICAMENTO. COEXISTÊNCIA. POSSIBILIDADE. CONCORRÊNCIA DESLEAL. INEXISTÊNCIA.


[...]


4. A finalidade da proteção ao uso das marcas - garantida pelo disposto no art. 5º, XXIX, da CF/88 e regulamentada pelo art. 129 da LPI - é dupla: por um lado protegê-la contra usurpação, proveito econômico parasitário e o desvio desleal de clientela alheia e, por outro, evitar que o consumidor seja confundido quanto à procedência do produto (art.4º, VI, do CDC).


[...]


8. Recurso especial não provido.


(REsp Acórdão/STJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/05/2011, DJe 18/05/2011)

  • 1.105.422/STJ (Propriedade industrial. Marca. Medicamento. Radical «Sor». Ação de abstenção de uso de marca cumulada com pedido de indenização por danos materiais e compensação por danos morais. Utilização de termo designativo do componente principal do medicamento. Coexistência. Possibilidade. Consumidor. Concorrência desleal. Inexistência na hipótese. Lei 9.279/1996, arts. 18, II, 124, VI, 129 e 195, III. CDC, art. 4º, VI. CF/88, art. 5º, XXIX).


Ademais, sem perder de vista o enfoque pelo ângulo do direito marcário, a possibilidade de confusão e/ou associação entre as marcas fica nítida no caso em que, como é notório, LARA e DELARA possuem intensa similaridade gráfica e fonética e ambas se destinam ao segmento mercadológico de transportes.

Nesse sentido, vale lembrar o já citado João da Gama Cerqueira quando discorre quanto ao critério adequado para a análise da possibilidade de coexistência de marcas:


Ao nosso ver, o único critério adequado à solução dessas questões é mais simples, devendo-se considerar existente a reprodução proibida sempre que a marca incorporada na denominação conservar a sua individualidade e for claramente perceptível na nova marca. (CERQUEIRA, op. cit., p. 62)

Resta claro que a marca LARA está inserida na marca que a recorrida pretende obter registro DELARA, conservando a sua individualidade.

Assim, é inviável admitir a coexistência de tais marcas.

Dessarte, correta a incidência dos arts. 208 e 209 da Lei 9279/1996, com a seguinte redação:


Art. 208. A indenização será determinada pelos benefícios que o prejudicado teria auferido se a violação não tivesse ocorrido.


Art. 209. Fica ressalvado ao prejudicado o direito de haver perdas e danos em ressarcimento de prejuízos causados por atos de violação de direitos de propriedade industrial e atos de concorrência desleal não previstos nesta Lei, tendentes a prejudicar a reputação ou os negócios alheios, a criar confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais ou prestadores de serviço, ou entre os produtos e serviços postos no comércio.


§ 1º Poderá o juiz, nos autos da própria ação, para evitar dano irreparável ou de difícil reparação, determinar liminarmente a sustação da violação ou de ato que a enseje, antes da citação do réu, mediante, caso julgue necessário, caução em dinheiro ou garantia fidejussória.


§ 2º Nos casos de reprodução ou de imitação flagrante de marca registrada, o juiz poderá determinar a apreensão de todas as mercadorias, produtos, objetos, embalagens, etiquetas e outros que contenham a marca falsificada ou imitada.

4. Diante do exposto, nego provimento ao recurso especial. ...» (Min. Luis Felipe Salomão).»

Doc. LegJur (138.0991.5000.0000) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
▪ Propriedade industrial (Jurisprudência)
▪ Marca (Jurisprudência)
▪ Uso indevido (v. ▪ Marca) (Jurisprudência)
▪ Marca alheia anteriormente registrada (v. ▪ Marca) (Jurisprudência)
▪ Impossibilidade de coexistência (v. ▪ Marca) (Jurisprudência)
▪ Prescrição (v. ▪ Marca) (Jurisprudência)
▪ Prazo prescricional (v. ▪ Marca) (Jurisprudência)
▪ Reparação de danos (v. ▪ Marca) (Jurisprudência)
▪ Dano permanente (v. ▪ Marca) (Jurisprudência)
Lei 9.279/1996, art. 124, XIX (Legislação)
Lei 9.279/1996, art. 129 (Legislação)
Lei 9.279/1996, art. 208 (Legislação)
Lei 9.279/1996, art. 209 (Legislação)
Lei 9.279/1996, art. 225 (Legislação)
▪ CF/88, art. 5º, XXIX
▪ CDC, art. 4º, VI.
▪  1.105.422/STJ (Propriedade industrial. Marca. Medicamento. Radical «Sor». Ação de abstenção de uso de marca cumulada com pedido de indenização por danos materiais e compensação por danos morais. Utilização de termo designativo do componente principal do medicamento. Coexistência. Possibilidade. Consumidor. Concorrência desleal. Inexistência na hipótese. Lei 9.279/1996, arts. 18, II, 124, VI, 129 e 195, III. CDC, art. 4º, VI. CF/88, art. 5º, XXIX).

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