Jurisprudência em Destaque
STJ. 4ª T. Responsabilidade civil. Incorporação imobiliária. Construção de edifício. Vícios e defeitos surgidos após a entrega das unidades autônomas aos adquirentes. Solidariedade. Responsabilidade solidária do incorporador e do construtor. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido. Amplas considerações do Min. Raúl Araújo sobre o tema. Lei 4.591/1964, arts. 28, 29, 31 e 43. CCB/2002, arts. 265, 618 e 942, «caput». CDC, art. 25, § 1º. CCB, arts. 1.245 e 1.518, parágrafo único.
A respeito do tema, o d. Juízo sentenciante concluiu que a responsabilidade por vícios advindos da construção de imóvel seria apenas do construtor, e não do incorporador, pois não teria encontrado prova de que este tenha atuado também como construtor. Nesse contexto, entendeu que, conforme as provas trazidas aos autos, a parte ré, ora recorrente, atuando meramente como incorporadora, não poderia ser responsabilizada pelos defeitos da construção (fls. 264/266, e-STJ).
Por outro lado, o colendo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios delineou ter «como certa a responsabilidade do apelado, ainda que não tenha sido o construtor do Edifício, mas por ter agido como incorporador do empreendimento, pelos defeitos nele apresentados por força da negociação que fez sobre as unidades autônomas (fls. 42/102). Ainda que lhe remanesça, em razão da solidariedade, o seu direito de regresso contra aquele que de fato construiu o Edifício, caso se sinta prejudicado por ter que promover os devidos reparos em benefício do apelante». Concluiu que «respondem pelos defeitos de construção surgidos no Edifício tanto o construtor quanto o incorporador em regime de solidariedade, pois este último, ainda que não tenha participado da sua construção, é aquele que aparece na relação contratual perante os adquirentes das unidades autônomas integrantes do empreendimento como o responsável pela entrega do imóvel com garantia de solidez e segurança. A responsabilidade solidária está consagrada no art. 942 do Código Civil vigente (correspondência legislativa: art. 1.518, parágrafo único do CC/16) e na Lei 4.591/1964, em seus artigos 29, 30 e 31» (fls. 291/303, e-STJ).
Para melhor exame da controvérsia, transcreve-se da Lei de Condomínio em Edificações e de Incorporações Imobiliárias ( Lei 4.591/1964) os seguintes dispositivos, por serem mais relevantes para o caso sob exame, in verbis:
«Art. 28. As incorporações imobiliárias, em todo o território nacional, reger-se-ão pela presente Lei.
Parágrafo único - Para efeito desta Lei, considera-se incorporação imobiliária a atividade exercida com o intuito de promover e realizar a construção, para alienação total ou parcial, de edificações ou conjunto de edificações compostas de unidades autônomas.»
«Art. 29. Considera-se incorporador a pessoa física ou jurídica, comerciante ou não, que embora não efetuando a construção, compromisse ou efetive a venda de frações ideais de terreno objetivando a vinculação de tais frações a unidades autônomas, em edificações a serem construídas ou em construção sob regime condominial, ou que meramente aceite propostas para efetivação de tais transações, coordenando e levando a termo a incorporação e responsabilizando-se, conforme o caso, pela entrega, a certo prazo, preço e determinadas condições, das obras concluídas.
Parágrafo único - Presume-se a vinculação entre a alienação das frações do terreno e o negócio de construção, se, ao ser contratada a venda, ou promessa de venda ou de cessão das frações de terreno, já houver sido aprovado e estiver em vigor, ou pender de aprovação de autoridade administrativa, o respectivo projeto de construção, respondendo o alienante como incorporador.»
«Art. 31. A iniciativa e a responsabilidade das incorporações imobiliárias caberão ao incorporador, que somente poderá ser:
a) o proprietário do terreno, o promitente comprador, o cessionário deste ou promitente cessionário com título que satisfaça os requisitos da alínea a do art. 32;
b) o construtor (Decreto número 23.569, de 11-12-33, e 3.995, de 31 de dezembro de 1941, e Decreto-lei número 8.620, de 10 de janeiro de 1946) ou corretor de imóveis (Lei 4.116, de 27-8-62).
c) o ente da Federação imitido na posse a partir de decisão proferida em processo judicial de desapropriação em curso ou o cessionário deste, conforme comprovado mediante registro no registro de imóveis competente.
§ 1º No caso da alínea b, o incorporador será investido, pelo proprietário de terreno, o promitente comprador e cessionário deste ou o promitente cessionário, de mandato outorgado por instrumento público, onde se faça menção expressa desta Lei e se transcreva o disposto no § 4º, do art. 35, para concluir todos os negócios tendentes à alienação das frações ideais de terreno, mas se obrigará pessoalmente pelos atos que praticar na qualidade de incorporador.
§ 2º Nenhuma incorporação poderá ser proposta à venda sem a indicação expressa do incorporador, devendo também seu nome permanecer indicado ostensivamente no local da construção.
§ 3º Toda e qualquer incorporação, independentemente da forma por que seja constituída, terá um ou mais incorporadores solidariamente responsáveis, ainda que em fase subordinada a período de carência, referido no art. 34.»
«Art. 43. Quando o incorporador contratar a entrega da unidade a prazo e preços certos, determinados ou determináveis, mesmo quando pessoa física, ser-lhe-ão impostas as seguintes normas:
I - informar obrigatoriamente aos adquirentes, por escrito, no mínimo de seis em seis meses, o estado da obra;
II - responder civilmente pela execução da incorporação, devendo indenizar os adquirentes ou compromissários, dos prejuízos que a êstes advierem do fato de não se concluir a edificação ou de se retardar injustificadamente a conclusão das obras, cabendo-lhe ação regressiva contra o construtor, se fôr o caso e se a êste couber a culpa;
III - em caso de falência do incorporador, pessoa física ou jurídica, e não ser possível à maioria prossequir na construção das edificações, os subscritores ou candidatos à aquisição de unidades serão credores privilegiados pelas quantias que houverem pago ao incorporador, respondendo subsidiariamente os bens pessoais dêste;
IV - é vedado ao incorporador alterar o projeto, especialmente no que se refere à unidade do adquirente e às partes comuns, modificar as especificações, ou desviar-se do plano da construção, salvo autorização unânime dos interessados ou exigência legal;
V - não poderá modificar as condições de pagamento nem reajustar o preço das unidades, ainda no caso de elevação dos preços dos materiais e da mão-de-obra, salvo se tiver sido expressamente ajustada a faculdade de reajustamento, procedendo-se, então, nas condições estipuladas;
VI - se o incorporador, sem justa causa devidamente comprovada, paralisar as obras por mais de 30 dias, ou retardar-lhes excessivamente o andamento, poderá o Juiz notificá-lo para que no prazo mínimo de 30 dias as reinicie ou torne a dar-lhes o andamento normal. Desatendida a notificação, poderá o incorporador ser destituído pela maioria absoluta dos votos dos adquirentes, sem prejuízo da responsabilidade civil ou penal que couber, sujeito à cobrança executiva das importâncias comprovadamente devidas, facultando-se aos interessados prosseguir na obra (VETADO).
VII - em caso de insolvência do incorporador que tiver optado pelo regime da afetação e não sendo possível à maioria prosseguir na construção, a assembléia geral poderá, pelo voto de 2/3 (dois terços) dos adquirentes, deliberar pela venda do terreno, das acessões e demais bens e direitos integrantes do patrimônio de afetação, mediante leilão ou outra forma que estabelecer, distribuindo entre si, na proporção dos recursos que comprovadamente tiverem aportado, o resultado líquido da venda, depois de pagas as dívidas do patrimônio de afetação e deduzido e entregue ao proprietário do terreno a quantia que lhe couber, nos termos do art. 40; não se obtendo, na venda, a reposição dos aportes efetivados pelos adquirentes, reajustada na forma da lei e de acordo com os critérios do contrato celebrado com o incorporador, os adquirentes serão credores privilegiados pelos valores da diferença não reembolsada, respondendo subsidiariamente os bens pessoais do incorporador. (Incluído pela Lei 10.931, de 2004)»
«Art. 44. Após a concessão do habite-se pela autoridade administrativa, o incorporador deverá requerer, a averbação da construção das edificações, para efeito de individualização e discriminação das unidades, respondendo perante os adquirentes pelas perdas e danos que resultem da demora no cumprimento dessa obrigação.
§ 1º Se o incorporador não requerer a averbação o construtor requerê-la-á, sob pena de ficar solidariamente responsável com o incorporador perante os adquirentes.» (grifou-se)
De tais normas depreende-se que, para a caracterização da atividade de incorporação imobiliária, basta que a pessoa, física ou jurídica, assuma o compromisso de alienação ou efetive a venda de frações ideais de terreno vinculadas a unidades imobiliárias que integrarão, em condomínio, uma edificação coletiva, atuando, assim, na condição de incorporador.
Conforme delineia MELHIM NAMEM CHALHUB, «o texto legal fornece elementos para a caracterização da atividade de incorporação, permitindo conceituá-la como a atividade de coordenação e consecução de empreendimento imobiliário, compreendendo a alienação de unidades imobiliárias em construção e sua entrega aos adquirentes, depois de concluídas, com a adequada regularização no Registro de Imóveis competente (art. 44). Traço característico dessa atividade é a venda antecipada de apartamentos de um edifício a construir, que, do ponto de vista econômico e financeiro, constitui o meio pelo qual o incorporador promove a captação dos recursos necessários à consecução da incorporação» (in Da Incorporação Imobiliária, 3ª ed., rev. e atual., Rio de Janeiro: Revonar, 2010, pp. 11).
Salienta, ademais, HELY LOPES MEIRELLES, que o «contrato de incorporação de condomínio é o ajuste pelo qual o incorporador se compromete a construir diretamente ou por terceiros e, ao final, transferir a propriedade horizontal de unidades autônomas ou um mesmo edifício de dois ou mais pavimentos, assim como as partes ideais do terreno das áreas de utilização comum, aos tomadores de apartamento, mediante preço fixo, ou ajustável ao custo da construção nas condições estabelecidas na convenção de condomínio (...). O incorporador é o elemento realizador do condomínio, donde lhe advém a designação, por analogia com o organizador das sociedades. Pode o incorporador ser o próprio dono do terreno, mas geralmente é o terceiro compromissário comprador ou simples titular da opção de compra e venda - que procura os interessados na aquisição de apartamentos; com eles combina o empreendimento, obtém os recursos financeiros necessários, contrata a construção e, a final, concretiza o negócio simultaneamente com o proprietário do terreno, com os tomadores de apartamentos, com o financiador da obra e com o construtor, num ajuste único, ou em sucessivos complementares de incorporação» (in Direito de Construir. 10ª ed., São Paulo: Malheiros, 2011, pp. 278/279).
A incorporação efetiva-se, assim, pela necessária atuação de um incorporador, sendo bastante que realize atos de coordenação e consecução do empreendimento imobiliário, consubstanciados no compromisso ou na venda de frações ideais do terreno objetivando a vinculação a unidades autônomas a serem entregues ao adquirente após concluída a construção.
O incorporador é, desse modo, a figura principal das relações jurídicas surgidas em decorrência da incorporação que promove. Embora o proprietário do terreno, o incorporador e o construtor da edificação possam ser pessoas distintas, a incorporação sempre terá no incorporador o responsável pelo papel principal no empreendimento.
Sendo o incorporador o principal responsável pela incorporação, está presente na relação jurídica com o proprietário do terreno, na venda das unidades autônomas correspondentes às frações ideais do terreno, diretamente ou por corretor de imóvel, nos licenciamentos perante os órgãos e entidades da administração pública e nos atos necessários à edificação da obra, diretamente ou por terceiro construtor. Estando presente em todas essas etapas da incorporação, resulta envolver o incorporador sua responsabilidade em todos os atos que coordena ou contrata. Embora a atividade de incorporação, em si, não se confunda com as demais, inclusive com a de construção da obra, com todas elas se vincula.
Há casos em que o incorporador é o próprio proprietário do terreno destinado ao empreendimento e até mesmo pratica a atividade de corretagem. Em outras hipóteses, o incorporador, além da atividade típica de incorporação, assume a responsabilidade pela execução direta da obra. Como esclarece HELY LOPES MEIRELLES, na «verdade, a figura do incorporador apresenta-se multiforme, ora mediando o negócio, ora financiando o empreendimento, ora construindo o edifício, ora adquirindo apartamentos para revenda futura - mas, em todas essas modalidades, a sua constante é ser o elemento propulsor do condomínio.» (in Direito de Construir. 10ª ed., São Paulo: Malheiros, 2011, p. 279)
Na hipótese dos autos, a eg. Corte Distrital entendeu irrelevante saber ao certo se o réu fora ou não diretamente o construtor do edifício, pois sua atuação como proprietário do terreno, idealizador e incorporador do empreendimento cuja construção veio a ser concluída - inclusive com os devidos registros imobiliários relativos à convenção de condomínio, à averbação da construção e individualização e discriminação das unidades - e alienante das unidades condominiais após concluída a construção era suficiente para caracterizar sua responsabilidade solidária com a do construtor.
Nesse contexto, em que o incorporador percorreu todas as etapas alusivas ao empreendimento como principal responsável pela efetivação do condomínio, sendo a figura central desde sua condição de proprietário do terreno disponível até a venda final das unidades já edificadas, concluídas, individualizadas e registradas, não parece mesmo haver razão plausível para afastar-se sua responsabilidade solitária pelos defeitos da construção que, se não realizou diretamente, pelo menos contratou, máxime se nenhum dispositivo legal é violado com tal entendimento.
O incorporador, como impulsionador do empreendimento imobiliário em condomínio, em todas as suas etapas, atrai para si a responsabilidade pelos danos que possam resultar da inexecução ou da má execução do contrato de incorporação, incluindo-se aí os danos advindos de construção defeituosa.
A propósito do tema, JOSÉ DE AGUIAR DIAS, interpretando a Lei 4.591/1964, acolhe a solidariedade entre o incorporador e o construtor por eventuais defeitos na construção. Afirma que o incorporador, ao contratar o construtor, por este se faz substituir na relação jurídica estabelecida com o adquirente da unidade construída e da fração ideal de um terreno, de maneira que deve ser responsabilizado pela má execução ou pelos defeitos da obra incorporada, ainda que decorrentes da atuação do substituído. Assinala, in verbis:
«(...) o contrato de incorporação, em face da Lei 4.591, contém todos os elementos para imposição de obrigação de reparar ao incorporador. Ele é contratante, é ele que assume a obrigação de fazer, cujo último ato é a entrega de uma ou várias unidades construídas e correspondentes a frações ideais do terreno em que se erguem e assentam.
Não há distinguir entre as várias espécies de dano que podem surgir da inexecução ou da má execução do contrato da incorporação. Trata-se de entrega retardada, de construção defeituosa, de inadimplemento total, o incorporador é o responsável , pois é ele quem figura no pólo da relação contratual oposto a em que se coloca o adquirente da unidade ou das unidades autônomas.
Nem tem influência, igualmente, para o caso, o fato de ser a construção incumbida a terceiro, o construtor (...). Quando a inexecução ou execução defeituosa resulta da falta de terceiro, por quem o contratante se fez substituir, a responsabilidade decorre da simples substituição.
(...)
Em resumo: quem se faz substituir na execução de uma tarefa é responsável pelos danos causados pelo substituto, quer decorram de falta contratual, quer de falta delitual, desde que relacionados com o exercício da substituição. A figura chamada no direito francês de terceiro cúmplice na inexecução do contrato, que preferimos chamar, por preocupação de melhor propriedade da expressão, de terceiro participante na execução, se confunde, por força da substituição, quando esta ocorre, com a figura do substituído, gerando a solidariedade, consagrada, entre outros textos, no paragrafo único do artigo 1.518 do Código Civil, aplicável, em matéria de reparação de dano, ao caso de responsabilidade contratual, dada a unidade da culpa, para esse efeito, sendo certo, por isso tudo, que o incorporador de edifício constituído de unidades autônomas responde civilmente pelos danos resultantes da má execução ou defeitos da obra incorporada, embora executada por terceiro, construtor, solidariamente responsável com aquele pela obrigação de ressarcir.
Ao incorporador, nos termos da Lei 4.591, cabe a contratação da edificação do imóvel constituído de unidades autônomas e é exatamente por lhe caber essa tarefa que responde pela má ou defeituosa execução da obra, traduzida, na sua ruína ou ameaça de ruína, exigindo reparações de vulto ou reconstrução. É certo que, em caso de paralização injustificada da obra ou de retardamento excessivo, pode ser destituído, com intervenção subseqüente dos adquirentes para darem prosseguimento àquela, o que é faculdade comum às obrigações de fazer. Isso, porém, não prejudica o direito à exigência de perdas e danos por parte dos prejudicados, direito decorrente dos princípios da responsabilidade civil, que impõem a restituição do lesado à situação anterior ao dano, à custa do ofensor.
É induvidosa a admissão, direi, mesmo, a procedência da ação contra o incorporador e o construtor, por danos resultantes de erro, negligência ou imperícia de terceiro, encarregado das fundações, do cálculo arquitetônico ou de concreto ou de qualquer tarefa exigida pela construção e a ele entregue pelo incorporador ou construtor (...). O mecanismo da substituição, que explica jurid camen e a sua responsabilidade estabelece verdadeira identificação entre o cérebro e a direção, que orienta, e o braço que executa. O ato do preposto é ato do preponente. O ato do dirigido é ato do dirigente. O ato do substituto é ato do substituído. Daí, a conseqüência irremovível: a obrigação de reparar a cargo daquele que se faz substituir. É evidente que, além dessa explicação da responsabilidade civil por fato de terceiro (seja porque a este foi delegada uma tarefa, seja porque ele pertence ao número das pessoas por fatos de quem legalmente nos é imposta a obrigação de reparar, seja o dano produzido no curso da execução de um contrato, seja por via extracontratual), milita no mesmo sentido a consideração, de fundo objetivo, mas sempre decisiva em matéria de responsabilidade civil, conforme a qual àquele que recolhe os proveitos de determinada atividade corresponde o dever de compensá-los com a obrigação de reparar os danos dela decorrentes. A Lei 4.591 especificou, não criou direito novo. Seu sistema de responsabilidade está conforme aos princípios consagrados, aos quais nada acrescentou, tendo o mérito, todavia, de dissipar qualquer dúvida eventual, levantada por interessados, se não tivesse o cuidado de reiterar o jus receptum.» (Responsabilidade civil em debate. 1ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1983, pp. 54/59, grifou-se)
De forma geral, a doutrina tem reconhecido a solidariedade entre o incorporador e o construtor para responder pelos vícios e defeitos da obra, assim como por sua solidez e segurança.
Na lição de EVERALDO AUGUSTO CAMBLER:
«No contrato de construção, firmado entre o incorporador e a construtora, a contratada compromete-se, sob sua exclusiva responsabilidade profissional, a executar as obras ali especificadas, estando aí incluídos os cuidados quanto à natureza dos materiais, equipamentos, máquinas, ferramentas e pessoal necessários e tudo aquilo que possa afetar o bom andamento das obras.
Com efeito, não obstante sejam os projetos, especificações e demais informações e instruções fornecidos pelo incorporador-contratante, a construtora invariavelmente responsabiliza-se pela qualidade, exatidão de execução dos projetos e segurança das obras contratadas, devendo, inclusive, formalizar o pedido de providências necessárias para que sejam corrigidos os erros ou discrepâncias encontrados nos elementos fornecidos pelo incorporador.
Isto não obstante, tivemos a oportunidade de mencionar (cf. tópico 1.2.2.1 - Livro I, Parte I) que o incorporador, como parte da relação jurídica incorporativa, tem a obrigação e o dever de movimentar a obra e manter a construção em ritmo normal, sendo-lhe facultado, inclusive, substituir o construtor na execução da construção, caso essa providência se faça necessária para que o cronograma originariamente traçado seja integralmente cumprido.
Ao celebrar o contrato de construção, o incorporador estende a obrigação assumida junto aos adquirentes ao construtor, fazendo-se substituir por este passando ambos a responder pela obrigação de resultado perante o contratante. Em razão da substituição havida, quem se faz substituir é responsável, juntamente com o substituto, pelos danos decorrentes quer da falta contratual, quer de falta delitual, desde que relacionados com o exercício da substituição, gerando a solidariedade consagrada no art. 1.518, parágrafo único, do CC, aplicável também em matéria de reparação de dano contratual em face do princípio da unidade da culpa.
Assim, verificada a ofensa ou violação do direito do adquirente da unidade condominial, ou impossibilitando-se a prestação por culpa de um dos devedores solidários ligados à atividade incorporativa, subsiste para todos o encargo de reparar o dano ou pagar o equivalente acrescido das perdas e danos, pelos quais responderá aquele que for diretamente culpado pelo dano (art. 908 do CC).
Em ocorrendo vícios (redibitórios) ocultos ou vícios construtivos referentes à solidez e segurança no empreendimento incorporado, estes deverão ser imputados ao construtor e ao incorporador dentro dos prazos especificados no Código Civil (...).
Ao lado do Código e Defesa do Consumidor, a LCI (arts. 48 a 62) e, subsidiariamente, os arts. 1.237 a 1.247 do CC regem o contrato de incorporação de edifícios em condomínio, de maneira que o construtor-empreiteiro e o incorporador respondem pelos danos oriundos da execução do projeto construtivo e das especificações contratualmente estabelecidas em face dos adquirentes finais e, eventualmente, perante o dono do terreno.» (Responsabilidade Civil na Incorporação Imobiliária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, pp. 219/222, grifou-se)
Também leciona SÉRGIO CAVALIERI FILHO:
«Em nada altera esta conclusão o fato de ter sido a construção cometida ao construtor. O incorporador continua responsável porque é o contratante. Responde também o construtor, porque é o causador direto do dano, e tem responsabilidade legal, de ordem pública, de garantir a solidez e segurança da obra em benefício do seu dono e da incolumidade coletiva, conforme já demonstrado.
Pondere-se, ainda, que o fim do contrato de incorporação é a edificação, e esta pertence, real e efetivamente, aos adquirentes de unidades autônomas e ao condomínio. Tanto é assim que, se a obra não é executada a contento, ou completamente, quem sofre os prejuízos, direta e imediatamente, são os adquirentes das unidades autônomas, e não o incorporador.
Desta forma, quando o incorporador celebra contrato com o construtor, nada mais faz que estender-lhe a sua obrigação, passando ambos a ser responsáveis pela construção. O incorporador, na realidade, está apenas se fazendo substituir pelo construtor.
(...)
Em conclusão: nas incorporações de imóveis, respondem solidariamente pelos defeitos da construção o incorporador e o construtor. O primeiro por ser o contratante; o segundo, não só em razão da garantia legal imposta por questões de ordem pública, mas, também, por ser o substituto do incorporador na execução do contrato de construção. Têm legitimidade para reclamar o ressarcimento os condôminos, em relação aos defeitos que se apresentarem em suas respectivas unidades, e o condomínio, no que respeita aos defeitos verificados nas partes comuns.» (Programa de Responsabilidade Civil. 9ª ed., rev. e ampl., São Paulo: Atlas, 2010, pp. 373/374, grifou-se)
De fato, não se pode entender, em leitura isolada da norma do art. 44 da Lei de Incorporações, que a responsabilidade do incorporador limite-se à averbação da construção das edificações, após a concessão do «habite-se», somente respondendo até esse momento, não após a entrega da obra.
A Lei 4.591/1964 estabelece, em seu art. 31, que a «iniciativa e a responsabilidade das incorporações imobiliárias caberão ao incorporador». Acerca do envolvimento da responsabilidade do incorporador pela construção, dispõe que «nenhuma incorporação poderá ser proposta à venda sem a indicação expressa do incorporador, devendo também seu nome permanecer indicado ostensivamente no local da construção», acrescentando, ainda, que «toda e qualquer incorporação, independentemente da forma por que seja constituída, terá um ou mais incorporadores solidariamente responsáveis» (art. 31, §§ 2º e 3º). Portanto, é o incorporador o principal garantidor do empreendimento no seu todo, solidariamente responsável com outros envolvidos nas diversas etapas da incorporação.
Então, ainda que o incorporador não realize a execução direta da obra, contratando terceiro - construtor - para fazê-la, não se pode eximir da obrigação de entrega do edifício de acordo com o projeto de construção e o memorial descritivo das especificações da obra projetada, devidamente arquivados no competente registro de imóveis (Lei 4.591/1964, art. 32). A obrigação assumida pelo incorporador está consubstanciada, em última análise, na entrega ao adquirente de fração ideal do terreno da correspondente unidade imobiliária construída, garantindo a segurança, a solidez, a idoneidade e a qualidade da obra.
Destaca-se, pois, a responsabilidade solidária do incorporador pelos vícios surgidos na construção, após a entrega do empreendimento, consistentes em rachaduras nas lajes e paredes do imóvel, infiltrações e outros defeitos estruturais. Mesmo quando o incorporador não é o executor direto da construção do empreendimento imobiliário, mas contrata construtor para execução da obra, fica, juntamente com este, solidariamente responsável pela solidez e segurança da edificação, tanto em razão dos materiais como do solo (CC/2002, art. 618). Trata-se de uma verdadeira obrigação de garantia assumida solidariamente com o construtor. Entende-se, assim, aplicável ao incorporador, e não apenas ao empreiteiro/construtor direto, a regra do mencionado art. 618 do Código Civil de 2002.
Nesse sentido, de um lado, o «caput» do art. 942 do Código Civil de 2002 (que reproduziu a norma do art. 1.518 do Código Civil de 1916) estabelece que «os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação». De outro lado, o art. 25, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor - e aqui tem-se relação de consumo - dispõe que, «havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão solidariamente pela reparação prevista nesta e nas seções anteriores».
Quando o consumidor celebra contrato de compra e venda de apartamento com o incorporador - e aqui considere-se que a atividade de incorporação e construção encerra relação de consumo quando o adquirente do imóvel é o destinatário final - e este celebra outro contrato com construtor, visando à execução da obra, a relação que se estabelece é de confiança. O consumidor, certamente, espera que o incorporador cuide para que a obra seja executada, ainda que por construtor diverso, de maneira a garantir solidez e a segurança da edificação. Há aqui uma extensão, perante o consumidor, da responsabilidade do incorporador pelo resultado da construção. Na hipótese, o incorporador se faz substituir pelo construtor, tornando-se, assim, responsável pelo resultado dessa substituição. Por essa razão, fica caracterizada a responsabilidade solidária de ambos - construtor e incorporador - por eventuais defeitos surgidos na obra.
Como se vê, essa solidariedade decorre tanto da natureza da relação jurídica estabelecida entre o incorporador e o adquirente de unidades autônomas quanto de previsão legal, já que a solidariedade não pode ser presumida, devendo derivar de lei ou de vontade das partes (CC/2002, art. 265).
Os Códigos Civil e de Defesa do Consumidor consagram normas gerais a respeito da responsabilidade civil solidária daqueles que causam danos a outrem. Por outro lado, a referida lei especial - que trata da incorporação imobiliária ( Lei 4.591/1964) - traz normas que invocam a responsabilidade do incorporador pela promoção do empreendimento imobiliário que resultará, ao final, na entrega do imóvel pronto, na forma contratada e com a qualidade e solidez esperada. Há determinação expressa de solidariedade do responsável pelos atos de incorporação.
Com base nessas reflexões, infere-se que o incorporador e o construtor são solidariamente responsáveis por eventuais vícios ou defeitos de construção surgidos no empreendimento imobiliário, de modo que o incorporador responde, ainda que não tenha assumido diretamente a execução da obra. ...» (Min. Raúl Araújo).»
Doc. LegJur (135.1741.3000.5400) - Íntegra: Click aqui
Referência(s):
▪ Responsabilidade civil (Jurisprudência)
▪ Incorporação imobiliária (Jurisprudência)
▪ Construção (v. ▪ Incorporação imobiliária) (Jurisprudência)
▪ Construção de edifício (v. ▪ Incorporação imobiliária) (Jurisprudência)
▪ Vícios e defeitos (v. ▪ Incorporação imobiliária) (Jurisprudência)
▪ Solidariedade (v. ▪ Incorporação imobiliária) (Jurisprudência)
▪ Responsabilidade solidária (v. ▪ Incorporação imobiliária) (Jurisprudência)
▪ Incorporador (v. ▪ Incorporação imobiliária) (Jurisprudência)
▪ Construtor (v. ▪ Incorporação imobiliária) (Jurisprudência)
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▪ CCB/2002, art. 265
▪ CCB/2002, art. 618
▪ CCB/2002, art. 942, «caput»
▪ CDC, art. 25, § 1º
▪ CCB, art. 1.245
▪ CCB, art. 1.518, parágrafo único.
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Você já pensou sobre o tempo e os recursos que gasta pesquisando leis, jurisprudências e doutrinas para os seus casos? Já se imaginou otimizando esse processo de forma eficiente e segura?
Então, temos algo em comum. O LegJur foi criado pensando em você, no advogado moderno que não pode se dar ao luxo de perder tempo em um mercado tão competitivo.
Por que o LegJur é a solução que você precisa?
1. Conteúdo Atualizado: Nosso banco de dados é atualizado constantemente, oferecendo as informações mais recentes sobre legislações, súmulas e jurisprudências.
2. Fácil Acesso: Uma plataforma simples e intuitiva que você pode acessar de qualquer dispositivo, a qualquer momento. Seu escritório fica tão flexível quanto você.
3. Busca Inteligente: Nosso algoritmo avançado torna sua pesquisa rápida e eficaz, sugerindo temas correlatos e opções para refinar sua busca.
4. Confiabilidade: Nosso time de especialistas trabalha incansavelmente para garantir a qualidade e a confiabilidade das informações disponíveis.
5. Economia de Tempo: Deixe de lado as horas de pesquisa em múltiplas fontes. Aqui, você encontra tudo o que precisa em um só lugar.
Invista no seu maior capital: o tempo
Você já deve saber que o tempo é um dos ativos mais preciosos na advocacia. Utilize o LegJur para maximizar sua eficiência, oferecendo ao seu cliente uma consultoria de alto nível fundamentada em informações confiáveis e atualizadas.
Depoimentos
"O LegJur transformou a forma como faço minha pesquisa jurídica. Agora, posso concentrar-me mais no desenvolvimento de estratégias para meus casos e menos na busca de informações."
— Maria L., Advogada
Não perca mais tempo! Torne-se membro do LegJur e eleve sua prática jurídica a um novo patamar.
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