Jurisprudência em Destaque

Consumidor. Crédito bancário. Taxa de Abertura de Crédito - TAC. Taxa de Emissão de Carnê - TEC. Expressa previsão contratual. Legitimidade da cobrança. Princípio da boa-fé objetiva.

Postado por legjur.com em 15/05/2013
Tratas-se de decisão tomada pela 2ª Seção do STJ, foi relatada pela Minª. Maria Isabel Gallotti, J. em 10/10/2012, DJ 05/11/2012 - Doc. LegJur 130.7174.0000.4900.

A controvérsia cinge-se em definir se são, ou não, legítimas, as Tarifas de Abertura de Crédito - CTAC e Taxa de Emissão de Carnê – TEC cobradas dos consumidores pelas instituições financeiras. A 2ª Seção do STJ reconheceu a legitimidade da cobrança, para tanto entendeu que as Tarifas de Abertura de Crédito - TAC e Emissão de Carnê (TEC), por não estarem encartadas nas vedações previstas na legislação regente (Resoluções 2.303/1996 e 3.518/2007 do CMN), e ostentarem natureza de remuneração pelo serviço prestado pela instituição financeira ao consumidor, quando efetivamente contratadas, consubstanciam cobranças legítimas, sendo certo que somente com a demonstração cabal de vantagem exagerada por parte do agente financeiro é que podem ser consideradas ilegais e abusivas, o que não ocorreu no caso presente. A Corte debateu amplamente a matéria há votos vencidos e vencedores cujos fundamentos merecem ser considerados, por esta e por outras razões esta é uma jurisprudência de qualidade. Consulte-a e pense sobre ela.

Contudo a hipótese merece algumas considerações para um melhor debate. Antes é necessário ressaltar que os bancos são instituições seculares e o seu arsenal criativo de maldades e espertezas parece não ter fim, e esta cobrança é apenas mais uma dessas maldades, e em nosso país este problema é agudizado, embora os bancos estrangeiros que por aí aportaram começam a tratar melhor o seu consumidor e ver nele um potencial de negócios que os bancos nacionais e principalmente governamentais jamais reconheceram, o que é bom.

A matéria parece complexa porque suscita muitas questões, mas ela é simples e as questões suscitadas não oferecem dificuldades interpretativas. Eis alguns pontos que merecem reflexão:

a) NATUREZA JURÍDICA DA RELAÇÃO ENTRE AS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS E OS TOMADORES DOS SEUS SERVIÇOS.

Sobre de ser de consumo a relação entre as instituições financeiras e os tomadores dos serviços financeiros o Supremo Tribunal Federal já reconheceu ser esta relação uma relação de consumo (CDC, arts. 2º e 3º). A 2ª Seção do STJ ao aplicar as Resoluções do Conselho Monetário Nacional, negou esta natureza privada e consumerista para atribuir uma natureza pública e monetária, e obviamente que ela não é. Eis a decisão do STF tomada em ação direta de inconstitucionalidade que parece portar uma certa definitividade sobre o tema:

2.591/STF (Consumidor. Banco. Instituição financeira. Aplicabilidade das normas consumeristas. CF/88, art. 5º, XXXII. CDC, art. 3º, § 2º. «As instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor.»).

Conclusão: É de consumo a relação entre as instituições financeiras e tomadores dos seus serviços. Incide o Código de Defesa do Consumidor.

b) RESOLUÇÕES DO CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL

Parte substantiva da fundamentação desta decisão que atribuiu legitimidade a cobrança da Tarifa de Abertura de Crédito - CTAC e da Taxa de Emissão de Carnê – TEC está no fato do Conselho Monetário Nacional não ter proibido a cobrança dos consumidores de tais taxas e tarifas.

Há que se considerar que o Conselho Monetário Nacional é autoridade monetária, cuja responsabilidade é pela solvabilidade da moeda nacional, e a relação entre as instituições financeiros e seus consumidores é uma relação privada e de consumo (CDC, arts. 2º e 3º). Qualquer incursão do Conselho Monetário na esfera privada das relações entre as instituições financeiras e seus consumidores, no mínimo implica na usurpação de competência legislativa do Congresso Nacional, diga-se, esta competência legislativa do Congresso Nacional é inabdicável e indelegável.

Sobre a questão da incompetência do Conselho Monetário Nacional de normatizar as relações entre as instituições financeiras e os tomadores do serviço bancário, o Supremo Tribunal Federal já tem uma posição que parece portar uma certa definitividade sobre o tema: Eis a decisão:

2.591/STF (Sistema financeiro nacional. Banco. Instituição financeira. Conselho Monetário Nacional - CMN. Hermenêutica. Capacidade normativa atinente à constituição, funcionamento e fiscalização das instituições financeiras. Ilegalidade de resoluções que excedem essa matéria. Lei 4.595/1964, art. 4º, VIII. CF/88, art. 192. «O Conselho Monetário Nacional é titular de capacidade normativa - a chamada capacidade normativa de conjuntura - no exercício da qual lhe incumbe regular, além da constituição e fiscalização, o funcionamento das instituições financeiras, isto é, o desempenho de suas atividades no plano do sistema financeiro. Tudo o quanto exceda esse desempenho não pode ser objeto de regulação por ato normativo produzido pelo Conselho Monetário Nacional. A produção de atos normativos pelo Conselho Monetário Nacional, quando não respeitem ao funcionamento das instituições financeiras, é abusiva, consubstanciando afronta à legalidade.»).

Conclusão: Não pode o Conselho Monetário normatizar a relação entre as instituições financeiras e os tomadores dos seus serviços.

c) DA TARIFAS DE ABERTURA DE CRÉDITO - CTAC E TAXA DE EMISSÃO DE CARNÊ – TEC SEREM PREVISTAS EM CONTRATO DE ADESÃO.

O contrato e o seu instrumento são conceitos diversos, de um lado há um acordo de vontades e de outro um papel, que no caso foi impresso antecipadamente com cláusulas sem fim, diga-se, o papel aceita qualquer coisa. É por esta razão que os contratos firmados entre uma instituição financeira e o consumidor dos serviços desta instituição é de adesão e por obvio o fato de ter sido subscrito pelo consumidor não tem o dom de convalidar o que não é sério, não tem o condão de convalidar armadilhas, sobretudo linguísticas, sob a forma de cláusulas contratuais, não tem o condão de convalidar a falta de transparência, não tem o condão de convalidar a falta de informações, entre muitos outros aspectos. É por esta e muitas outras razões que existem o art. 6º e o art. 51 do CDC. É por isto que existe o art. 112 do CCB/2002 que diz «Art. 112 - Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.», ou seja, sempre prevalece a vontade sobre a forma.

Isto quer dizer que o não tem nenhum valor o fato das referidas tarifas terem sido previstas num instrumento de contrato e subscritas pelo consumidor neste instrumento de adesão, o qual chamamos de contrato de adesão, quando seria mais correto chamar de instrumento de adesão, pela ausência justamente do elemento volitivo que só existe num contrato. A princípio da autonomia privada é o dorso fundamental da atividade privada, dos negócios jurídicos, e principalmente nas relações de consumo, não é uma questão de limitá-la, reduzi-la, dar-lhe alguma forma alternativa, o que é necessário é tão somente se ela de fato existiu ou não, se existiu prevalece, se há dúvidas, não prevalece.

d) DA QUESTÃO DA LEGITIMIDADE DAS CLÁUSULAS

A validade destas tarifas está subordinada a sua legitimidade, neste sentido a discussão teria que ter tomado outro rumo, ou seja, se cobrança em separado destas tarifas tem o potencial de induzir em erro o consumidor ao fazê-lo optar por um serviço que ele imaginava ter uma relação custo-benefício mais favorável, e não teve?

e) DO VOTO VENCIDO DO MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO

O Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, vencido, na decisão, deu uma interpretação aos fatos mais consentânea com o que acontece no cotidiano da relação entre as instituições financeiras e os tomadores do seus serviços. Eis o que diz o ministro:


«... As taxas administrativas, assim, representaram um aumento de R$ 658,40 ao crédito disponibilizado, montante que representa quase o valor de uma das parcelas a que o devedor se obrigou mensalmente e sobre o qual incidiram todos os demais encargos.

Assim, a meu ver, a fragmentação desnecessária do preço a ser pago pelo consumidor, longe de contribuir para a transparência da relação contratual, acaba por lhe dificultar o acesso às informações de que necessita.

Ora, se a tarifa de abertura de crédito ou tarifa de cadastro (TAC) e a taxa de emissão de carnê (TEC) não ensejam benefício direto ao consumidor, não há outra razão para sua cobrança em separado que não a de mascarar uma taxa de juros mais elevada.

Note-se que as taxas administrativas em questão são cobradas indiscriminadamente em todas as operações de financiamento, não podendo o consumidor optar por contratá-las ou não, até mesmo porque, como já afirmado, elas não ensejam a prestação de serviço acessório do qual se poderia utilizar. ...» (Min. Paulo de Tarso Sanseverino).»

Doc. LEGJUR 130.7174.0000.4900

STJ Consumidor. Cambial. Cédula de crédito bancário com garantia de alienação fiduciária. Taxa de Abertura de Crédito - TAC. Taxa de Emissão de Carnê - TEC. Expressa previsão contratual. Cobrança. Legitimidade. Princípio da boa-fé objetiva. Considerações da Minª. Maria Isabel Gallotti sobre o tema. Precedentes do STJ. CDC, arts. 46, 51, IV e 52. Lei 4.595/1964, arts. 4º, VI, e 9º. CCB/2002, art. 422.

«... RATIFICAÇÃO DO VOTO. Tendo em vista o substancioso voto divergente do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, permito-me tecer as seguintes considerações. ... ()


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