Jurisprudência Selecionada

Doc. LEGJUR 177.9819.0048.4179

1 - TST AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017. 1. PRELIMINAR DE NULIDADE DO JULGADO - CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. CLT, ART. 896, § 1º-A, I. EXIGÊNCIA DE TRANSCRIÇÃO DOS FUNDAMENTOS EM QUE SE IDENTIFICA O PREQUESTIONAMENTO DA MATÉRIA OBJETO DE RECURSO DE REVISTA. ÓBICE ESTRITAMENTE PROCESSUAL . 2. DISPENSA COLETIVA. FATO/ATO DE CARÁTER COLETIVO, MASSIVO, COM REPERCUSSÕES EM SIGNIFICATIVA COMUNIDADE DE TRABALHADORES (683 EMPREGADOS). NECESSIDADE DA INTERVENÇÃO SINDICAL PRÉVIA. DECISÃO DO STF NO RE 999435, COM REPERCUSSÃO GERAL (TEMA 638), CONFIRMANDO, AINDA QUE EM PARTE, JURISPRUDÊNCIA ANTERIOR DA SDC/TST. DESCUMPRIMENTO PELA EMPRESA. FATO/ATO OCORRIDO NO PRIMEIRO SEMESTRE DE 2017, ANTES DA LEI DA REFORMA TRABALHISTA E DO CLT, art. 477-A A ordem constitucional e infraconstitucional democrática brasileira, desde a Constituição de 1988 e diplomas internacionais ratificados (Convenções OIT 11, 98, 135, 141 e 154, ilustrativamente), não permite o manejo meramente unilateral e potestativista das dispensas trabalhistas coletivas, por se tratar de ato/fato coletivo, inerente ao Direito Coletivo do Trabalho, e não Direito Individual, exigindo, por consequência, a participação do(s) respectivo(s) sindicato(s) profissional(is) obreiro(s). As citadas convenções da OIT, ratificadas pelo Brasil, contêm garantias democráticas à atuação sindical, que ressaltam a importância do ser coletivo obreiro no âmbito internacional, nacional e local, e devem ser observadas na aplicação do Direito do Trabalho, enquanto instrumento de elevação das condições de pactuação da força do trabalho no universo social, suplementando a ordem jurídica interna juslaboral. Apesar das diretrizes constitucionais e internacionais, a dispensa coletiva, até 2017, não contava com dispositivos legais regulamentadores . Em razão dessa omissão legislativa, a jurisprudência, duas décadas após a Constituição de 1988, começou a inferir do Texto Magno diferenciação de tratamento jurídico entre as dispensas individuais e as dispensas coletivas. Em julgamento de dissídio coletivo tratando de despedida maciça de empregados por grande empresa, em face de grave retração na atividade econômica ( lay off de mais de 4 mil trabalhadores), ocorrido em agosto de 2009, fixou a Seção de Dissídios Coletivos do TST, por maioria de votos, a premissa de que a negociação coletiva é imprescindível para a dispensa em massa de trabalhadores . Embora a premissa tenha sido fixada apenas para situações fático jurídicas futuras à data do julgamento - 10.08.2009 (não tendo sido acompanhada, conforme a decisão da maioria da SDC-TST, de outros consectários reflexos, como, ilustrativamente, ordem de reintegração, arbitramento de indenização compensatória, prorrogação temporal de prazos contratuais ou outras repercussões assemelhadas), teve o importante condão de fixar diferenciação jurídica efetiva entre dispensas meramente individuais e dispensas coletivas. Nesse quadro, enfatizou o contingenciamento constitucional dirigido às dispensas massivas, as quais deveriam se submeter à negociação coletiva trabalhista, apta a lhes atenuar os drásticos efeitos sociais e econômicos. No período seguinte ao julgamento de 18.8.2009, a jurisprudência da SDC do TST, ao enfrentar novos casos de dispensas coletivas, confirmou a importância do precedente judicial inferido, enfatizando ser a negociação coletiva sindical procedimento prévio imprescindível para os casos de dispensas massivas de trabalhadores. Esclareça-se, a esse respeito, que o Tribunal Pleno do TST, em julgamento ocorrido em 18.12.2017 (RO-10782-38.2015.5.03.000-Rel. Min. Maria Cristina Irigoyen Peduzzi), decidiu, por maioria, que a ação de dissídio coletivo de natureza jurídica não é adequada, por razões processuais, para brandir pleitos relacionados à dispensa em massa de trabalhadores. Tal decisão do TST Pleno, porém, ostenta efeitos e objetivos estritamente processuais, não entrando no mérito da jurisprudência firmada, em 2008, da SDC da Corte Superior Trabalhista. Contudo, do ponto de vista processual, fica claro que somente por intermédio de outras ações judiciais - tal como ação civil pública e/ou a ação civil coletiva -, é que se mostra adequado tratar, na Justiça do Trabalho, desse complexo e importante assunto, que envolve aspectos processuais e, principalmente, diversificados aspectos materiais (por exemplo, pedidos de invalidação da dispensa, de reintegração, de indenização, etc.). Assente-se, outrossim, que a imprescindibilidade da negociação coletiva prévia para a dispensa em massa de trabalhadores não constitui medida de intervenção na livre iniciativa, em prejuízo da gestão empresarial eficiente, mas sim, um meio de atenuar socialmente os fortes impactos da dispensa coletiva, com a adoção de medidas protetivas ao conjunto dos trabalhadores ou a uma parcela deles, viabilizando, assim, o atendimento das empresas à função social de que são detentoras, com a devida compatibilização prática dos referidos princípios constitucionais (arts. 1º, IV, 170, caput e, III, IV, VII e VIII, 193, caput, da CF/88). Aliás, na concorrência entre os princípios constitucionais da livre iniciativa e a função social da propriedade, detentores de mesma estatura normativa, deve-se aplicar o método da ponderação, considerando as circunstâncias concretas de cada caso. Acrescente-se que a negociação prévia à dispensa coletiva entre o empregador e as entidades sindicais deve observar o princípio da boa-fé objetiva, de forma a propiciar uma real influência das entidades sindicais na decisão empresarial, com fim de possibilitar, pelo diálogo entre as partes, a diminuição dos impactos sociais da dispensa massiva. Enfatize-se que, embora o dever de negociação prévia entre o empregador e a entidade sindical não signifique ser necessária uma decisão conjunta dos interlocutores quanto ao ato de dispensa, certo é que não se pode admitir a mera comunicação do procedimento de rescisão coletiva pelo empregador ao referido ente profissional. I mpõe-se destacar que o Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal, no recente julgamento do RE 999435 (DJe 15/09/2022), em sistema de Repercussão Geral (Tema 638) conferiu interpretação conforme ao CLT, art. 477-A ao fixar, por maioria, a seguinte tese acerca da dispensa em massa de trabalhadores : A intervenção sindical prévia é exigência procedimental imprescindível para a dispensa em massa de trabalhadores, que não se confunde com autorização prévia por parte da entidade sindical, ou celebração de convenção ou acordo coletivo . Da leitura do referido acórdão, o Pleno do STF deixou explícita a necessidade da participação prévia do sindicato, como requisito de validade das dispensas coletivas, devendo o diálogo entre os empregadores e os empregados representados pelo ente sindical observar imperiosamente o princípio da boa-fé objetiva. Conclui-se, portanto, da tese fixada pela Suprema Corte, na sistemática de repercussão geral, que, embora a dispensa coletiva não se submeta à autorização prévia da entidade sindical obreira, nem tenha de passar por obrigatória celebração de CCT ou ACT, torna-se imprescindível a existência de um diálogo coletivo prévio, leal e efetivo entre o empregador e a entidade sindical, como requisito imperativo para a validade da dispensa em massa de trabalhadores. Assim, trazida a demanda à apreciação do Poder Judiciário, cabe-lhe examiná-la unicamente sob o prisma da validade do ato, ou seja, se a dispensa em massa foi precedida de intervenção sindical, mediante a existência de efetiva negociação entre os referidos atores sociais, observados os princípios da boa-fé objetiva, da lealdade e da confiança. Nesse caso, demonstrada em Juízo a ausência do requisito de validade da dispensa coletiva fixado pelo STF no Tema 638 da Tabela de Repercussão Geral, seja pela falta de intervenção sindical, seja pelo comportamento do empregador em desconformidade com o princípio da boa-fé objetiva, cabe ao Estado, no exercício de sua função jurisdicional, impor as medidas necessárias à reparação do direito violado, que garantam aos empregados dispensados um resultado equivalente, ainda que não coincidente, àquele que obteriam como consequência da realização prévia pelo empregador de um diálogo leal, probo e efetivo com o sindicato dos trabalhadores, sob pena de tornar estéril a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal. Portanto, verificando-se, no caso concreto, que a empresa empregadora, ao efetivar a dispensa massiva, não adotou o procedimento prévio obrigatório de dialogar em boa-fé objetiva com o sindicato dos trabalhadores, conforme o entendimento do Pleno do STF fixado na tese do Tema 638 da tabela de Repercussão Geral, reputa-se irregular a atuação empresarial . Fixadas tais premissas, resta definir a consequência da conduta irregular do empregador. Certo que, diante da ausência de norma jurídica, regulamento empresarial ou instrumento normativo que garanta para os trabalhadores envolvidos em dispensa coletiva algum tipo de estabilidade que autorize a reintegração no emprego ou sanção compensatória específica para reparação do direito violado, tem-se que o reconhecimento judicial da nulidade da dispensa coletiva por inexistência de intervenção sindical efetiva, com a consequente reintegração dos empregados dispensados, importaria em incabível transferência diretiva e intervenção estatal na gestão empresarial - repercussão não acolhida pelo STF na tese do Tema 638 da Repercussão Geral. Logo, diante do descumprimento pelo empregador de requisito de validade da dispensa coletiva perpetrada e da impossibilidade de se declarar a nulidade da dispensa e a reintegração dos empregados dispensados ou condenar o empregador ao pagamento de indenização específica por ausência de previsão em diploma normativo, cabe ao Juiz, valendo-se dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, fixar uma reparação compensatória que, diante das peculiaridades do caso concreto, atenda aos interesses das partes, de modo a minimizar os impactos da dispensa massiva no âmbito social, econômico, familiar e comunitário, sem, todavia, gerar onerosidade excessiva ao empregador . A propósito, o Direito Processual Civil, ao regulamentar as ações que tenham por objeto obrigações de fazer, autoriza ao Julgador, observadas as particularidades do caso concreto, que: (i) na hipótese de impossibilidade de se alcançar a tutela específica pretendida, imponha ao Réu outras medidas que garantam ao Autor um resultado prático equivalente ao bem pretendido, embora a ele não coincidente ; (ii) no caso de inviabilidade de adimplemento da prestação na forma específica, determine ao Réu a sua conversão em pecúnia (CPC/2015, art. 497 e CPC art. 536). Pontue-se, outrossim, que referidas providências não importam em afronta aos arts. 141 e 492, caput, do CPC. Na hipótese dos autos, observa-se, das premissas fáticas consignadas pelo TRT (incontroversas à luz da Súmula 126/TST), que as dispensas dos 683 trabalhadores da Requerida foram efetivadas sem a existência de diálogo prévio com o sindicato obreiro, em inobservância aos princípios da boa-fé objetiva, da lealdade e da confiança, nos termos definidos pelo STF no julgamento do RE 999435, em sistema de Repercussão Geral (Tema 638). Conclui-se, portanto, dos fundamentos erigidos pelo TRT, considerando o entendimento firmado pelo STF no julgamento do RE 999435, ser efetivamente inválida a dispensa coletiva procedida pela Requerida, em razão da ausência de intervenção sindical prévia, em desrespeito ao princípio da boa-fé objetiva . Agravo de instrumento desprovido.

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