Legislação

Resolução CNJ 449, de 30/03/2022
(D.O. 01/04/2022)

Art. 2º

- Na interpretação e aplicação da Convenção da Haia de 1980, observar-se-ão as normas de direito internacional privado previstas na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, em especial no art. 7º, aplicando-se, conforme o caso, o direito privado do Estado de residência habitual da criança ou o Código Civil brasileiro.


  • Da residência habitual
Art. 3º

- Aplica-se a Convenção aos casos em que, no momento da transferência ou retenção, a criança mantinha residência habitual em Estado signatário.


  • Da guarda
Art. 4º

- Aplica-se a Convenção aos casos em que, no momento da transferência ou retenção, havia outra pessoa natural ou instituição com direito de guarda da criança de acordo com a legislação do Estado onde mantinha residência habitual antes da transferência ou retenção.

§ 1º - Considera-se guarda o direito de ter a criança sob seus cuidados e de decidir sobre o lugar de residência dela, na forma do art. 5º, [a], da Convenção. [[Decreto 3.413/2000, art. 2º.]]

§ 2º - Na dúvida sobre a atribuição e sobre a qualificação jurídica do direito de guarda, recomenda-se ao magistrado observar a lei do país de residência habitual da criança.

§ 3º - O direito de guarda pode ser atribuído diretamente pela legislação, por decisão judicial ou administrativa ou por contrato (art. 3º, 2º, da Convenção). [[Decreto 3.413/2000, art. 2º.]]


  • Da ilicitude da transferência ou retenção
Art. 5º

- Aplica-se a Convenção à transferência ou retenção ilícita da criança do Estado de sua residência habitual.

Parágrafo único - Considera-se ilícita a transferência ou retenção quando:

I - tenha havido violação a direito de guarda, e

II - esse direito estivesse sendo exercido de maneira efetiva, individual ou conjuntamente, no momento da transferência ou da retenção, ou devesse sê-lo caso tais acontecimentos não tivessem ocorrido.


  • Das partes, do interessado e do ministério público
Art. 6º

- A União será intimada, na pessoa de seu representante judicial, nos processos judiciais de retorno fundados na Convenção da Haia de 1980, em que não for autora, podendo assumir qualquer dos polos ou atuar como amicus curiae. [[CPC/2015, art. 138.]]


Art. 7º

- A pessoa em cuja companhia está a criança no território brasileiro será parte legítima para responder ao processo.


Art. 8º

- A pessoa natural ou a instituição que alega titularizar direito de guarda da criança de acordo com a legislação do Estado onde mantinha residência habitual antes da transferência ou retenção é considerada interessada nos processos judiciais em que a União for parte autora, podendo intervir como assistente.

§ 1º - A União manterá contato com a pessoa interessada, cientificando-a dos atos cuja participação é conveniente ou necessária.

§ 2º - Caso necessário, a União fornecerá ao juízo os meios de contato da pessoa interessada e solicitará sua notificação dos atos processuais.


Art. 9º

- O Ministério Público Federal será intimado de todos os termos do processo.


  • Do despacho inicial
Art. 10

- Recebida a petição inicial, o juiz federal tomará as seguintes providências:

I - analisará o pedido de tutela provisória, se for o caso;

II - determinará a citação da parte ré;

III - designará audiência de mediação, a se realizar no prazo de 30 (trinta) dias, sempre que entender viável; e

IV - determinará, desde logo, a produção das provas que forem requeridas ou possam ser determinadas de ofício, assegurando o direito da parte ré à participação nesta fase.

Parágrafo único - No mandado de citação, deverá constar:

I - a determinação de que o réu forneça, durante o cumprimento do ato, todos os seus meios de contato - telefone, e-mail, endereços alternativos - e comunique previamente ao juízo qualquer propósito de mudar de endereço ou de se ausentar de seu local de domicílio atual, até a conclusão do processo e enquanto a criança estiver sob seus cuidados; e

II - a informação de que o prazo para a contestação iniciará da data da juntada do mandado cumprido, na forma do art. 231, II, do Código de Processo Civil. [[CPC/2015, art. 231.]]


  • Da resposta
Art. 11

- O prazo para resposta será de 15 (quinze) dias, contados a partir da juntada do comprovante de citação.


Art. 12

- A contestação deverá se ater aos fundamentos que obstam o retorno da criança, nos termos da Convenção, notadamente:

I - a inexistência do direito de guarda sobre a criança, pela pessoa que supostamente a teria de acordo com a lei do Estado estrangeiro, no momento da transferência ou da retenção;

II - o não exercício efetivo do direito de guarda pela pessoa que supostamente a teria de acordo com a lei do Estado estrangeiro, no momento da transferência ou da retenção;

III - a preferência da criança com idade superior a doze anos por não retornar ao país de residência habitual;

IV - a existência de um risco grave de a criança, no seu retorno, ficar sujeita a perigos de ordem física ou psíquica, ou, de qualquer outro modo, ficar numa situação intolerável;

V - a integração da criança ao local de residência atual, se, na data do recebimento do pedido de cooperação jurídica pelo Estado brasileiro, decorreu um ano ou mais da data da transferência ou da retenção indevidas; e

VI - a verificação de que a restituição da criança violaria os princípios fundamentais da República brasileira quanto à matéria de proteção dos direitos humanos e das liberdades fundamentais.


  • Da mediação
Art. 13

- A audiência de mediação será realizada na forma da lei processual civil.

§ 1º - À pessoa interessada será assegurada a participação na audiência, podendo utilizar meios eletrônicos de comunicação a distância.

§ 2º - A mediação incentivará a participação de ambos os genitores nos direitos e deveres decorrentes do poder familiar.


  • Da organização e de saneamento
Art. 14

- Não obtida a mediação, o juiz realizará, ato contínuo, a organização e o saneamento do processo, decidindo todas as questões previstas no art. 357 do Código de Processo Civil, e designará audiência de instrução e julgamento em prazo não superior a 30 (trinta) dias. [[CPC/2015, art. 357.]]

§ 1º - As partes requererão a produção de provas na petição inicial e na contestação, respectivamente, e arrolarão as testemunhas até a organização e saneamento.

§ 2º - As testemunhas que não se encontrarem no Brasil serão apresentadas pela parte requerente independentemente de intimação, facultada a utilização de videoconferência.

§ 3º - É inadmissível a prova sobre a adaptação da criança ao Brasil, se transcorrido menos de um ano entre a data da subtração ou retenção ilícita e o recebimento do pedido de cooperação jurídica internacional pela Autoridade Central brasileira, ou o início do processo judicial no caso de a demanda ser ajuizada pela pessoa deixada no Estado da residência habitual da criança, devidamente representada por advogado.

§ 4º - Admitida a produção de prova pericial, o juiz nomeará perito e estabelecerá calendário para sua realização, devendo o resultado ser impreterivelmente apresentado até a data da audiência de instrução e julgamento.

§ 5º - O juiz poderá deixar de conhecer da alegação sobre grave risco contida no art. 13, [d], se a prova for de difícil ou demorada obtenção e a matéria puder ser tratada pelas autoridades do país de residência habitual da criança. [[Decreto 3.413/2000, art. 2º.]]

§ 6º - Excepcionalmente, o prazo para a realização da audiência de instrução e julgamento poderá ser prorrogado por até 30 (trinta) dias, a pedido das partes, ou no interesse da produção de provas indispensáveis.


  • Da audiência de instrução e julgamento
Art. 15

- Salvo motivo de força maior, não haverá adiamento da audiência de instrução e julgamento.

§ 1º - A audiência será concluída na mesma data, salvo absoluta impossibilidade.

§ 2º - A audiência suspensa será retomada na primeira oportunidade.


Art. 16

- Oferecida a defesa prevista na alínea [c] do art. 13 da Convenção da Haia de 1980, o juiz ouvirá a criança e averiguará se a manifestação é livre da influência indevida da pessoa responsável pelo sequestro ou retenção ou terceiros. [[Decreto 3.413/2000, art. 2º.]]


  • Das traduções
Art. 17

- Poderão ser utilizados quaisquer recursos para a compreensão de documentos em língua estrangeira, inclusive tradutores automáticos, se o documento for produzido por pessoa que goza do benefício da assistência judiciária gratuita ou a versão juramentada puder atrasar a tramitação processual.


  • Da tutela provisória
Art. 18

- O deferimento da tutela provisória observará a legislação processual civil.

§ 1º - Em caso de risco de novo sequestro ou retenção indevidos, o juiz considerará a adoção de medidas restritivas da liberdade de viajar da pessoa em cuja companhia está a criança e da própria, como retenção de passaporte e alerta às autoridades de fronteira.

§ 2º - Havendo elementos para crer que a criança está em situação de risco, o juiz considerará medidas de proteção, em especial o acolhimento institucional ou familiar.

§ 3º - O juiz considerará a imediata devolução da criança, em especial se houver evidência de que a pessoa que está em companhia da criança não tem direito semelhante ao qualificado como guarda, ainda que compartilhada, pelo direito brasileiro (CCB/2002, art. 1.583, § 1º), mesmo que detenha direito semelhante ao qualificado como poder familiar pelo direito brasileiro (CCB/2002, art. 1.630).


  • Dos recursos
Art. 19

- Os recursos em processos previstos nesta Resolução serão julgados em até duas sessões ordinárias, contadas da data da conclusão ao relator.


  • Da execução da ordem de retorno
Art. 20

- O juiz federal poderá solicitar o auxílio da Advocacia da União e da Autoridade Central brasileira para a realização, no âmbito de suas atribuições, dos procedimentos concernentes à execução da decisão judicial que ordenar o retorno da criança, certificando-se do seu bem-estar e da sua segurança no território nacional.

Parágrafo único - O juiz federal poderá, igualmente, solicitar o apoio de profissionais da área da psicologia e da assistência social, além do acompanhamento da Polícia Federal, se necessário.


  • Das ações de guarda na jurisdição brasileira
Art. 21

- Nos termos do art. 17 da Convenção da Haia de 1980, a decisão proferida pelo juiz federal com determinação de retorno da criança deverá ser cumprida ainda que haja decisão relativa ao direito de guarda proferida em ação judicial perante a Justiça Estadual brasileira. [[Decreto 3.413/2000, art. 17.]]


Art. 22

- Ao tomar conhecimento da pendência de processo relativo à guarda de criança em curso na Justiça Estadual, o juiz federal comunicará ao juiz de direito a tramitação do pedido de restituição, formulado nos termos do art. 16 da Convenção da Haia de 1980. [[Decreto 3.413/2000, art. 2º.]]

Parágrafo único - Constatada a tramitação de processo relativo à guarda de criança na Justiça Estadual, nas hipóteses previstas nesta Resolução, ficará ele sobrestado até o pronunciamento da Justiça Federal sobre o retorno ou não da criança.


  • Das custas, despesas e honorários
Art. 23

- Os procedimentos decorrentes do cumprimento da Convenção seguirão as regras gerais do Código de Processo Civil (CPC/2015) quanto à isenção de custas, honorários, taxas, distribuição do ônus da prova e também quanto à assistência jurídica gratuita, quando requerida por uma parte.


Art. 24

- Ao processo judicial para assegurar o direito de visita, na forma do art. 21 da Convenção da Haia de 1980, aplica-se, no que couber, esta Resolução. [[Decreto 3.413/2000, art. 2º.]]